The Film Handbook #6: Ken Loach

Sandy Ratcliff como uma garota na iminência de um colapso mental, na acusação por Ken Loach das pressões da Vida em Família.


Nascimento: 17/06/1936/Nuneaton, Inglaterra.
Carreira: 1967-

Ainda que firmemente entrincheirado na tradição realista britânica, os filmes de Kenneth Loach transcendem às limitações comuns a tais métodos através de uma combinação rica entre política, poesia e pathos. Infelizmente seu rigoroso naturalismo e suas simpatias pela esquerda tem sido confinadas mais recentemente ao seu trabalho para a televisão, ainda que suas imagens sejam igualmente autênticas tanto nas telas grandes quanto pequenas.

Desenvolvendo um interesse pelo teatro quando estudava direito, Loach se tornou um diretor de televisão, aonde o poder e acuidade de seus retratos da classe trabalhadora britânica contemporânea em peças tais como Up the Junction, Cathy Come Home e In Two Minds o destacaram como um excitante novo talento. Em 1967, com o colaborador e produtor de longa data Tony Garnett, ele realizou sua estreia no longa-metragem com A Lágrima Secreta (Poor Cow), no qual o adultério de uma jovem esposa com o melhor amigo de seu marido criminoso suscitou uma algo esquemática evocação da pobreza e banalidade da experiência da vida operária. Kes>1, entretanto, foi radicalmente mais tocante. Seu retrato naturalista de um jovem delinquente, cujos sentimentos por um pequeno falcão que encontra e treina são simbólicos de uma tentativa condenada de  escapar das oportunidades frustrantes e limitadas oferecidas por aqueles que findam a escolaridade básica no norte industrial. Os diálogos (apresentados em dialeto) e a profunda autenticidade das interpretações emprestaram ao filme uma ar de documentário, porém o uso do pássaro como uma metáfora poética para a liberdade e dignidade e ao mesmo tempo uma análise lúcida das pressões a se conformar exercidas pelo mundo adulto, transcendem o realismo objetivo e levam o filme ao reino do comovente e moderado melodrama político.

Igualmente devastador em seu balanço emocional, e profundo na compreensão das demandas destrutivas por obediência necessárias para a preservação da estabilidade e complacência familiares, Vida em Família (Family Life)>2, foi um dramático exemplo das então controversas teorias de R.D. Laing sobre as origens sociais da esquizofrenia. Desde então, pela maior parte dos anos 70, Loach trabalhou sobretudo para a televisão, sendo Days of  Hope (a saga de uma família do início da I Guerra Mundial até a Greve Geral de 1926), em quatro partes, o destaque. Em 1979 ele retornou aos longas com Black Jack, filme sobre crianças na Inglaterra pré-industrial, enquanto o filme de televisão O Vigia (The Gamekeeper) foi uma análise soberba e profundamente irônica da relação de seu herói com sua família e seu cachorro, a sua própria terra, os larápios que são seus amigos e seus empregadores, aristocratas do campo. Não menos perspicaz foi Looks and Smiles>3, narrativa notavelmente verossímil de um romance adolescente arruinado pela frustração e desespero que acompanham o desemprego da Inglaterra de Thatcher. A simpatia de Loach por suas jovens vítimas da classe trabalhadora foi lancinante como habitual, enquanto as interpretações destituídas de sentimentalismo evidenciam a integridade de sua abordagem. Igualmente equilibrado, mas ainda mais simples, Fatherland o apresentou ampliando seus horizontes com uma narrativa sombria e cética das diferenças e similaridades entre o Ocidente e o Oriente tal como vivenciadas por uma cantora de prostesto alemã oriental no exílio; enquanto a tese que o capitalismo ocidental é tão opressor quanto o dogmatismo comunista foi bem manipulada, seu gradual interesse pelo território do filme de ação envolvendo conspiração, ainda que ambicioso, proporcionou a queda preocupante do drama entre  as amenas convenções de gênero e o estilo realista habitual de Loach.

O mais politicamente engajado dos realizadores britânicos, Loach também é valorizado por sua imaginativa exploração da tênue linha que separa a ficção do documentário. Roteiros cuidadosamente forjados  e  filmagens de locações impactantes proporcionam uma astuta e autêntica análise da sociedade mais ampla, enquanto seu excelente tratamento dos atores emprestam aos filmes uma frequente  e profundamente comovente dimensão humana.

Genealogia
Loach é talvez o mais notável sucessor do Free Cinema britânico dos anos 50 e 60 (Karel Reisz, Tony Richardson, Anderson). Embora existam semelhanças com as obras de Bill Douglas e mesmo Terence Davies, comparações com os ainda mais politicamente direcionados Barney Platt-Mills e Maurice Hatton também são frutíferas.

Destaques
1. Kes, Reino Unido, 1969, c/David Bradley, Colin Welland, Lynne Perrie

2. Vida em Família, Reino Unido, 1971 c/Sandy Ratcliff, Bill Dean, Grace Cave

3. Looks and Smiles, Reino Unido, 1981 c/Grahan Green, Carolyn Nicholson, Phil Askham

Texto: Andrew, Geoff. The Film Handbook. Londres: Longman, 1989, pp. 172-3.

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