Filme do Dia: Paris Vu Par... (1965), Jean Douchet, Jean Rouch, Jean-Daniel Pollet, Eric Rohmer, Jean-Luc Godard & Claude Chabrol

Paris Vu Par... (França, 1965). Direção e Rot.Original: Jean Douchet, com colaboração de Georges Keller nos diálogos (Saint German- des-Prés), Jean Rouch (Gare du Nord), Jean-Daniel Pollet (Rue Saint-Denis), Eric Rohmer (Place de L´Etoile), Jean-Luc Godard (Montparnasse-Levallois), Claude Chabrol (La Muette). Fotografia: Nestor Almendros (Saint German- des-Prés, Place de L´Etoile), Étienne Becker (Gare du Nord, Place de L´Etoile), Alain Levent (Rue Saint-Denis), Albert Maysles (Montparnasse-Levallois), Jean Rabier. Montagem: Jacquie Reynal & Dominique Villain (Gare du Nord). Dir. de arte: Eliane Bonneau (La Muette) & André Perraud (Saint German-des-Prés). Com: Jean-Pierre Andréani, Jean-François Chappey, Barbara Wilkin (Saint German-des-Prés), Stéphane Audran, Claude Chabrol, Giles Chusseau, Dany Saril (La Muette), Nadine Ballot, Barbet Schroeder, Gilles Quéant (Gare du Nord), Serge Davri, Phillippe Hiquilly, Joanna Shimkus (Montparnasse-Levallois), Marcel Gallon, Jean-Michel Rouzière (Place de L´Etoile), Micheline Dax, Claude Melqui (Rue Saint-Denis).
Saint-Germain des Pres. Uma garota americana, Katherine (Wilkin) se interessa por um rapaz que conhecera na noite parisiense Raymond (Andréani), que afirma ser o filho de um embaixador mexicano apenas para descobrir que ele se faz passar por Jean (Chappey), o real dono do apartamento em que Katherine passara a noite anterior.  Gare du Nord. Odile (Ballot) é uma garota cansada de seu relacionamento com Jean-Pierre (Schroeder) que conhece na rua justamente o perfil de homem que ela acabara de descrever para Jean-Pierre. O estranho (Quéant) que havia decidido morrer e só não o fez por encontrá-la joga-se da ponte quando ela não o aceita. Place de L´Etoile. Jean-Marc (Rouzière), um vendedor de loja, acredita ter matado acidentalmente um homem (Gallon) que esbarrou ao acaso na rua.   Rue Saint-Denis. Uma prostituta (Dax) se encontra com um homem da província, Leon (Melqui). Ela diz que está com fome e os dois jantam. No momento em que se encontram na cama e ela lê um jornal a energia falta. Montparnasse-Levallois. Uma garota, Monica (Shimkus) acreditar ter enviado cartas trocadas para dois homens que possuem algum interesse, Roger (Hiquilly) e Ivan (Davri) e é repudiada por ambos. La Muette. Numa família burguesa, o garoto (Chusseau) todo dia surpreende o pai (Chabrol) com a empregada doméstica (Saril). Cansado da hipocrisia familiar ele decide por vezes usar tampões de ouvido quando chega em casa. Em uma discussão com o marido, a  mãe cai da escada, quando esse parte para o trabalho.
Esse filme de sketches, típico do momento em que foi produzido (os italianos ainda o produziam com bem maior freqüência) e, ao mesmo tempo, antecipador das coletâneas de curtas tendo como motivação algumas das grandes metrópoles do mundo de décadas após, é um bom compósito das inovações estilísticas e de conteúdo trazidas pela Nouvelle Vague. Os entrecruzamentos entre casais ou possíveis triângulos amorosos, uma das pedras de toque da produção cinematográfica clássica, são aqui retrabalhados em boa parte dos episódios (Gare du Nord, Montparnasse-Lavallois, Saint-German-des-Prés) através de uma estética distanciada que parece sugerir uma influêcia de elementos mais afins aos estudos estruturalistas sobre a narrativa então nascentes e suas primeiras expressões no campo do cinema (O Ano Passado em Marienbad) produzidas pouco antes. Já no que diz respeito ao plano do conteúdo é interessante se observar sobre os avanços efetivados no campo da intimidade, seja na crônica do cotidiano (presente sobretudo em Rohmer) ou da sexualidade, inclusive apresentando uma faceta voltada para o imaginário feminino, também trabalhada pioneiramente pelo cinema francês em filmes como Os Amantes (1958), de Malle ou Hiroxima, meu Amor (1959), de Resnais. Aqui, tal dimensão fica particularmente por conta do episódio de Douchet, no qual é o desejo feminino que ganha destaque – sendo inclusive a única cena de nudez do filme nesse episódio e masculina – ainda que também seja vislumbrada em Rouch e, sob o signo diverso, mesmo também contando com protagonista feminina, em Godard, cuja visão na época por sinal era considera misógina. Enquanto certos curtas talvez se afastem um pouco do que habitualmente ficou considerado do padrão da obra de seus realizadores, tais como os de Rohmer e Rouch, ainda nesses permanecem fortes contatos com a mesma (o episódio do último, por exemplo, possui como protagonista uma personagem chamada Odile, nome de um dos “personagens” de seu documentário Crônica de um Verão, e a Gare du Nord que lhe dá o título é justamente o local onde ocorre o momento mais dramático de Odile no filme anterior). Antes de se deter nos personagens de sua narrativa ficcional, Rouch traça um relativamente longo prólogo documental sobre o bairro que dá título ao seu segmento. Já Chabrol parece se deter de forma quase auto-caricata na sua descrição habitualmente irônica do universo burguês ao escalar a si próprio e sua esposa para encarnarem os pais de família sob a perspectiva de uma criança e fazendo uso de algumas artimanhas da época, como um plano sonoro “subjetivo”, no momento em que o garoto faz uso dos tampões de ouvido. Rohmer prefere se deter sobre um universo pequeno-burguês em que fragmentos de conversas escutadas no transporte público ganham destaque. O episódio de Pollet (como os demais também vinculado em algum momento ao movimento porém, como Douchet, mais conhecido como crítico) chama a atenção para a sua montagem seca, em que a presença constante da figura paterna em um retrato, é uma das chaves para se compreender o comportamento acanhado de seu personagem principal. Destaque para a bela trilha musical do episódio de Godard. Uma tentativa semelhante foi efetivada com Paris, Eu te Amo (2006), ainda que com curtas de bem menor duração, compondo 19 segmentos.  Les Films du Cyprès/Les Films du Losange. 95 minutos.


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