O Dicionário Biográfico de Cinema#246: Karel Reisz

 


Karel Reisz (1926-2002), n. Ostrava, Tchecoslováquia

1958: We Are the Lambeth Boys (d). 1960: Saturday Night and Sunday Morning [Tudo Começou num Sábado]. 1964: Night Must Fall [A Noite Tudo Encobre]. 1966: Morgan: A Suitable Case for Treatment [Deliciosas Loucuras de Amor]. 1968: Isadora. 1974: The Gambler [O Jogador]. 1978: Who'll Stop the Rain [Soldados da Morte]. 1981: The French Lieutenant's Woman [A Mulher do Tenente Francês]. 1985: Sweet Dreams [Um Sonho, uma Lenda]. 1990: Everybody Wins [O Crime Que o Mundo Esqueceu]. 2000: Act Without Words 1 (c) (TV).

Se alguma vez se pensou haver um caminho para uma produção cinematográfica na Grã-Bretanha, Reisz foi o seu trajeto. Tendo chegado à Inglaterra pouco antes da guerra, serviu em um esquadrão tcheco da RAF e depois estudou química em Cambridge. Foi membro do grupo Sequence, uma primeira tentativa crítica inglesa de buscar seriedade moral no cinema; em 1953 publicou The Tecnique of Film Editing, um curiosamente não entusiasmado, e mesmo útil, livro; em pouco tempo era o programador do National Film Theatre, e por volta de meados dos anos 50 era uma figura de proa do movimento Free Cinema. É difícil se decidir hoje o que este movimento representava. O intuito de apresentar e celebrar a vida cotidiana era um que a TV já devorava com avidez. O realismo, em 1956, era um modo arcaico e, no entanto, por uns poucos anos, tornou-se uma prova de seriedade política e social. Aderir ao movimento "nervoso"* e a Campanha pelo Desarmamento Nuclear, constituía alguns dos mais irrelevantes avanços que a Inglaterra sofreu.

Dos três diretores envolvidos no movimento, Lindsay Anderson foi o mais talentoso, Tony Richardson o mais dispensável e Karel Reisz o mais incerto. Dirigiu, com Richardson, Momma Don´t Allow (55) e produziu Every Day Except Christmas (57) de Anderson, e realizou We Are the Lambeth Boys, possivelmente uma das mais datadas "inovações" em todo o cinema. Pareceu impressionado pela obscura glória de Vanessa Redgrave em Deliciosas Loucuras do Amor, onde ela deveria ser uma pessoa trivial, ao lado da iminante autossuficiência disfarçada de idiotia patética de David Mercer/David Warner/Morgan. Isadora é um desajeitado fracasso, cronologicamente confuso, prejudicado por uma atriz desengonçada interpretando uma mobilização natural e incerta sobre como lidar com seriedade com a sincera vulgaridade de sua heroína. Seus outros filmes são lamentavelmente ideológicos: Tudo Começou num Sábado poderia passar por paródia hoje; A Noite Tudo Encobre ajudou a retroceder a carreira de Albert Finney por diversos anos.

Foi ao menos empreendedor de Reisz ter se mudado para a América. Em O Jogador  nem capturou nem domesticou o existencialismo pretensioso, mas autêntico, do roteiro de James Toback, e findou com um filme estranhamente inerte. Soldados da Morte provou ser seu filme mais interessante, razoavelmente verdadeiro com o romance de Robert Stone, e cavando excelentes interpretações de Nick Nolte e Tuesday Weld. Soldados da Morte foi um fracasso à sua época, mas sobreviveu muito bem, e possui um olhar incomumente verídico para vidas compremetidas e perigo iminente. 

De volta à Inglaterra, Reisz não pôde conciliar a estranheza de A Mulher do Tenente Francês (uma obra dividida entre ser refinada ou louca) e não pôde tirar bom partido da parte moderna e espelhada da história. Surpreendente então, inassístivel hoje. Um Sonho, uma Lenda, foi um decente filme de baixo orçamento, conectado a Jessica Lange. O Crime Que o Mundo Esqueceu, no entanto, necessita de paciência (ou restrições) para seu público bastante esparso, caso seja visto de uma única vez. O filme possui credenciais - roteiro de Arthur Miller; Nick Nolte tentando ignorar o caos; Debra Winger ansiando trocar de identidade como troca de roupa.

E é tão falado que pode ter uma sobrevida numa sessão da meia-noite em um tempo vindouro.

Texto: Thomson, David. The New Biographical Dictionary of Film. N. York: Alfred A. Knopf, 2014, pp. 2200-01. 



(*) N. do T.: referência intraduzível aos então chamados angry young men, na literatura, teatro e cinema de origem trabalhadora ou, mais frequentemente, de classe média e trazendo narrativas envolvendo algum mal estar em relação à sociedade de classes britânica. 

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