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Serenata, Cecília Meireles

Permita que eu feche os meus olhos, pois é muito longe e tão tarde! Pensei que era apenas demora, e cantando pus-me a esperar-te. Permita que agora emudeça: que me conforme em ser sozinha. Há uma doce luz no silencio, e a dor é de origem divina. Permita que eu volte o meu rosto para um céu maior que este mundo, e aprenda a ser dócil no sonho como as estrelas no seu rumo

Reinvenção, Cecília Meireles

A vida só é possível reinventada. Anda o sol pelas campinas e passeia a mão dourada pelas águas, pelas folhas… Ah! tudo bolhas que vem de fundas piscinas de ilusionismo… — mais nada. Mas a vida, a vida, a vida,  a vida só é possível reinventada. Vem a lua, vem, retira as algemas dos meus braços. Projeto-me por espaços cheios da tua Figura. Tudo mentira! Mentira da lua, na noite escura. Não te encontro, não te alcanço… Só — no tempo equilibrada,  desprendo-me do balanço que além do tempo me leva. Só — na treva,  fico: recebida e dada. Porque a vida, a vida, a vida,  a vida só é possível  reinventada.

Inscrição na areia, Cecília Meireles

O meu amor  não tem importância nenhuma.  Não tem o peso nem   de uma rosa de espuma!   Desfolha-se por quem?  Para quem se perfuma?  O meu amor  não tem importância nenhuma.

Despedida, Cecília Meireles

Por mim, e por vós, e por mais aquilo  que está onde as outras coisas nunca estão,  deixo o mar bravo e o céu tranqüilo:  quero solidão.  Meu caminho é sem marcos nem paisagens.  E como o conheces? - me perguntarão.  - Por não ter palavras, por não ter imagens.  Nenhum inimigo e nenhum irmão.  Que procuras? Tudo. Que desejas? - Nada.  Viajo sozinha com o meu coração.  Não ando perdida, mas desencontrada.  Levo o meu rumo na minha mão.  A memória voou da minha fronte.  Voou meu amor, minha imaginação...  Talvez eu morra antes do horizonte.  Memória, amor e o resto onde estarão?  Deixo aqui meu corpo, entre o sol e a terra.  (Beijo-te, corpo meu, todo desilusão!  Estandarte triste de uma estranha guerra...)  Quero solidão.

Timidez, Cecília Meireles

Basta-me um pequeno gesto, feito de longe e de leve, para que venhas comigo e eu para sempre te leve... - mas só esse eu não farei. Uma palavra caída das montanhas dos instantes desmancha todos os mares e une as terras distantes... - palavras que não direi. Para que tu me adivinhes, entre os ventos taciturnos, apago meus pensamentos, ponho vestidos noturnos, - que amargamente inventei. E, enquanto não me descobres, os mundos vão nevegando nos ares certos do tempo até não se sabe quando... - e um dia me acabarei. Cecília Meireles