Filme do Dia: Para Não Falar de Todas Essas Mulheres (1964), Ingmar Bergman

Para Não Falar de Todas Essas Mulheres (För att inte tala om alla dessa kvinnor, Suécia, 1964). Direção: Ingmar Bergman. Rot. Original: Ingmar Bergman & Erland Josephson. Fotografia: Sven Nykvist. Música: Erik Nordgren. Montagem: Ulla Ryghe. Com: Jarl Kulle,  Bibi Andersson,  Harriet Andersson, Lars-Owe Carlberg, Eva Dahlbeck, Allan Edwall, Gertrud Fridh, Georg Funkquist,  Barbro Hiort af Ornäs,    Karin Kavli,  Mona Malm, Carl Billquist.
       Crítico musical, Cornelius (Kulle) pretende escrever uma biografia do mundialmente reconhecido violoncelista Felix, após uma bem sucedida biografia de Stravinsky, desde que ele toque uma composição de sua autoria. Enreda-se, no entanto, no verdadeiro harém pessoal do compositor, formado por sua esposa Adelaide (Dahlbeck), a mulher que o descobriu e o manteve no início, Madame Tussaud (Kavli), a jovem e cheia de energia sexual Abelhinha (Bibi Andersson), Traviata (Fridh), Beatrice (Ornäs), Isolde (Hariett Andersson), a faxineira e Cecilia (Malm). Após se impacientar com a dificuldade de se encontrar face a face com o Mestre, Cornelius segue a indicação do mordomo Tristan (Funjquist) de se vestir de mulher e assim tentar se aproximar de Felix, embora descubra que caiu numa infame armadilha ou ainda provoque incidentalmente uma explosão de fogos de artifício que consegue inclusive chamar a atenção do mestre, que acena distante da varanda. Indignado com todas as humilhações sofridas, principalmente a de ter sido flagrado em trajes femininos, Cornelius se encoraja e sobe até o aposento em que Felix se diverte com Abelhinha. Afirma que simplesmente desistiu de escrever uma biografia sobre ele e que ele, por mais virtuoso que seja, será brevemente esquecido pela posteridade. Suando frio, o Mestre concede em tocar sua peça, o que provoca o desprezo de seu produtor (Edwall), que pede demissão. Porém no esperado momento de sua apresentação, no salão de sua casa, com a presença  unicamente da imprensa estrangeira, suas mulheres, seu staff e Cornelius, morre subitamente. Cornelius inicia a leitura da biografia, sendo interrompido pela grande polêmica que provoca em suas mulheres. Com a chegada de um novo e belo promissor músico (Billquist), no entanto, que já passara pelos braços de Abelhinha e pela aprovação da mecenas Tussaud, a situação volta ao normal.
         Essa farsa se encontra bem distante tanto dos dramas de reminiscência sobre o desaparecimento do amor e da verdadeira vida que caracterizou o trabalho do cineasta na década de 50 quanto de sua aproximação de temas mais metafísicos e progressivamente sombrios a partir da década seguinte, já prenunciados em sua trilogia sobre a perda da fé no final dos anos 50, parecendo de certa forma um corpo estranho - como O Ovo da Serpente (1978) - dentro da  obra do cineasta, grandemente orgânica. Embora aqui, se não formalmente, pelo menos em termos de conteúdo se encontrem algumas preocupações já trabalhadas em outros filmes como O Rosto (1958), que também investiga as relações entre o artista e a sociedade, sendo que aqui  é satirizado o enfraquecimento do artista genial em sua torre de marfim frente à posteridade, única rival que consegue dobrá-lo em suas exigências, o que nem as mulheres - ele apenas as utiliza como um objeto de satisfação a mais - ou o sucesso haviam conseguido. Indissociável do caráter farsesco se encontra o aspecto teatral do filme, seja no que diz respeito ao plano inaugural de mais de um minuto de duração com câmera fixa, seja ainda a interpretação exagerada dos atores ou os intertítulos, utilizados principalmente para a delimitação do tempo da narrativa. Primeiro filme em cores (por sinal, em tons surreais que lembram os que Fellini trabalhará contemporaneamente em Julieta dos Espíritos, em um de seus primeiros trabalhos da longa parceria com Nykvist). Entre os destaques a sequência em que o encontro sexual de Cornelius e Abelhinha é representado através de uma dança (filmada em p&b como algumas outras cenas do filme), carregado da ironia que dita o tom do filme, chegando as raias do burlesco em momentos, como o da sequência dos fogos de artifício. Percebe-se também o tom galhofeiro que é adotado frente a convenção da continuidade, com Cornelius seguidamente aparecendo com indumentárias diferentes, se dirigindo a piscina com paletó branco e lá chegando com um bege, entrando na piscina de calção e saindo de paletó. Svenskfilmindustri. 80 minutos.   

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Filme do Dia: Quem é a Bruxa? (1949), Friz Freleng

Filme do Dia: Der Traum des Bildhauers (1907), Johann Schwarzer

A Thousand Days for Mokhtar