Filme do Dia: Inocência Desprotegida (1968), Dusan Makavejev


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Inocência Desprotegida (Nevinost bez Zastite, Iuguslávia, 1968). Direção: Dusan Makavejev. Rot. Original: Dusan Makavejev & Bruno Vucicevic. Fotografia: Stevan Miskovic & Branko Perak. Música: Vojislav Kotic. Montagem: Ivanka Vukasovic.

Esse documentário, realizado pelo iconoclasta Makavejev, no período mais fértil e criativo de sua carreira, consegue ser mais interessando que o mais famoso W.R. – Mistérios do Organismo (1971). Ao abordar uma produção que é tida como o primeiro filme sonoro da Iuguslávia, de mesmo nome, realizado em um país ocupado pelos alemães, em 1942, Makavejev consegue efetuar uma colagem em que convivem imagens do filme original (um melodrama tão amador que mais parece uma sátira produzida pelo próprio Makavejev a princípio), imagens originais (filmadas pela própria produção com parte do elenco – inclusive o já idoso Dragoljub Aleksic, celebridade nacional como acrobata que dirigiu o filme e foi seu protagonista, mostrando todos os seus talento na tela) e imagens de uma Iugoslávia ocupada. Ainda que em mais de um momento Makavejev contraponha imagens documentais de uma Belgrado arrasada que se chocam com o trivial, escapista e ingênuo filme de Aleksic, ele não pretende demonizar o mesmo, antes pelo contrário. Aleksic surge tão simpático e cativantemente ingênuo quanto na produção original e Makavejev (fazendo um paralelo consigo próprio que, tendo vivenciado inúmeros problemas com o governo iugoslavo, acabará por se refugiar em Paris após W.R.) não deixa de enfatizar os problemas que ele terá depois com as autoridades comunistas para demonstrar que não teve nenhum envolvimento com o governo de ocupação durante o qual sua produção foi realizada. Talvez a manutenção do título original guardará esse segundo sentido, sendo a “inocência desprotegida” agora menos a da órfã protagonista do primeiro filme que a do próprio realizador-acrobata,  que verá seu prestígio reduzido as cinzas após sua associação com os alemães e, por extensão, implicitamente, o próprio Makavejev, em significativas representações de artistas em tempos sombrios.  Num de suas melhores momentos, através do falso raccord sonoro do som de um motor de avião do filme original se tem acesso, através de um virtuoso plano-seqüência, ao porão da casa de Dragoljub, onde ele encena algo semelhante à cena do filme vista pouco antes. Talvez o mais fundamental para o seu sucesso seja o modo irônico, porém nunca cínico, que Makavejev explora sem qualquer didatismo as conexões entre memória pessoal, imagem cinematográfica e a história da Iugoslávia. Enquanto documentário que igualmente se apossa do título do filme ao qual faz referência, aproxima-se menos da tentativa de reconstituição tal e qual do original, como É Tudo Verdade (1983), que de uma tentativa auto-reflexiva e complexa em que os agenciamentos da memória e da história serão fundamentais para traçarem um paralelo entre dois momentos históricos distintos como em Cabra Marcado para Morrer (1984). Paralelo esse que aqui, mais ainda que no filme de Coutinho, é regido por uma forte dose de distanciamento emocional. De modo semelhante ao que fará posteriormente em W.R., o filme também inicia através de um modo que lembra um documentário convencional, com as entrevistas dos participantes da produção anterior, para logo depois desconstruir qualquer expectativa maior nesse sentido.  Destaque para a canção-tema, que faz menção aos feitos heroicos de Dragoljub, provavelmente tema do filme original por si só uma pérola de ironia, do modo como foi ressignificada por Makavejev. Prêmio FIPRESCI e Urso de Prata no Festival de  Berlim. Avala Film.  75 minutos. 

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