O Dicionário Biográfico de Cinema#114: Dusan Makavejev
Dusan Makavejev, n. Belgrado, Iugoslávia, 1932*
1966: Covek Nije Tijka [O Homem Não é um Pássaro] (1966). 1967: Ljubavni Slucaj, Tragedlja Sluzbenice P.T.T. [Um Caso de Amor ou O Drama de uma Empregada da Companhia Telefônica]. 1968: Nevinost bez Zastite [Inocência Desprotegida]. 1971: W.R. - Misterije Organizma [W.R. - Os Mistérios do Organismo]. 1974: Sweet Movie; Wet Dreams. 1981: Montenegro. 1985: The Coca-Cola Kid. 1988: Manifesto [Manifesto por uma Noite de Amor]. 1993: Gorilla Bathes at Noon. 1994: Rupa u Dusi [A Hole in the Soul] (d). 1996: um episódio de Danske Piger Viser Alt [Danish Girls Shows Everything].
Parte do impacto de W.R. reside na forma como Makavejev foi capaz de comparar as experiências americana e da Europa Oriental sem soar fantasioso. E é fácil relacionar Makavejev a Godard ou Norman Mailer, com base em sua técnica associativa de salto do particular humano para o padrão social e político, e que também observa o comportamento político como uma resposta às frustrações psicológicas e sexuais. Mas a dimensão empreendedora do cinema ensaista de Makavejev também me lembra algo de Chris Marker, parcialmente porque trabalha com a mesma vivacidade e não com perseguição da obsessividade desses ditadores românticos, Godard e Mailer.
Ver um filme de Makavejev é o mais próximo do estimulante processo de como o cinema emergiu. As "histórias" de seus filmes são puxadas de um lado para o outro até a flexibilidade da própria forma tornar-se o centro das atenções. As cenas de W.R. de copulação em segundo plano são tão causais quanto líricas, experimentos para alterarem nossas fortes preocupações sobre tal espetáculo. Somente um cientista muito terno poderia ter filmado a cena do pênis moldado em gesso com tão pouca lascívia emocional e tanta curiosidade humana.
A implicação persistente da obra de Makavejev é que o homem é uma espécie ainda selvagem e ansiosa, muito pronto a utilizar suas energias instintivas em causas enganosas como a adoração a um herói, berrar slogans, e o apoio repressor do autoritarismo. A relação entre desespero sexual e grosseira complacência política - nos países capitalistas, assim como comunistas - é muito evidenciada. Mas W.R. também contrasta os dois heróis e suas cortes: Stálin e Wilhelm Reich. Parece concluir que somente o herói proscrito é confiável, somente o profeta solitário é o poeta do corpo, e a aceitação popular é a mais séria ameaça de desvitalização.
Isso porque Makavejev ofende muitos compromissos doutrinários. Política, seu filme revela, é um padrão de comportamento que pode ser jogado de várias formas e maneiras. O divertimento que se dá a par de tal realização - mais que a raiva ou a tristeza - é sua grande virtude enquanto artista. Apesar do arsenal eriçado de seu estilo e a violência de seus contrastes, o olhar é sempre uniforme e tolerante.
Makavejev foi um graduado em psicologia na Universidade de Belgrado, que foi estudar cinema. Fez filmes experimentais e uma série de documentários antes de começar nos longas ficcionais. No entanto, este termo é inadequado como uma descrição da forma que ele trabalha. Empregada de uma Companhia Telefônica é uma história de amor, mas também a descrição de como a sociedade reduz o amor a uma patologia sexual. Enquanto Inocência Desprotegida é uma reflexão sobre o cinema clássico iuguslavo através das várias personalidades do homem que o estrela. Em ambos os casos, como em W.R., Makavejev rejeita o anedótico e insiste na significação do processo que produz o anedótico.
Tem se provado difícil para Makavejev fazer filmes - e ele demonstrou descompromisso com materiais, formatos de histórias, que não os seus. Na verdade, desconfio que compreenda qualquer forma de proceder que não seja de sua própria mente perigosa e fértil. Em Montenegro, Susan Anspach interpreta uma esposa que encontrou liberação sexual, na companhia de alguns trabalhadores iuguslavos; em Coca-Cola Kid, Eric Roberts vive um vendedor enviado à Austrália que encontra, dentre outras coisas, a imagem erótica consumada de Greta Scacchi; e Manifesto por uma Noite de Amor é uma comédia louca ambientada nos Balcãs. Gorilla Bathes at Noon é um vibrante retorno à forma, sobre um oficial russo abandonado em Berlim, após a retirada soviética. E é artisticamente ingênuo, surreal, e emprega imagens de arquivo do épico russo de 1949, A Queda de Berlim. E é típico de Makavejev que sua visão de Berlim, da história, e dos refugiados abandonados seja tão refrescante e inesperada. Em sua cena climática - a desmontagem de uma enorme estátua de concreto de Lênin - Makavejev é tão bom quanto sempre, avesso à tirania, no entanto capaz de ver a beleza no concreto e ser respeitoso a Lênin.
Texto: Thomson, David. The New Biographical Dictionary of Film. N. York: Knopf, 2014, pp. 1670-2.
N. do E: *falecido em 2019.
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