O Dicionário Biográfico de Cinema#273: George Clooney



George Clooney, Lexington, Kentucky, 1961 

2002: Confessions of a Dangerous Mind [Confissões de uma Mente Perigosa]. 2005: episódios de Unscripted (TV); Good Night, and Good Luck [Boa Noite e Boa Sorte]. 2008: Leatherheads [O Amor Não Tem Regras]. 2011: The Ides of March [Tudo pelo Poder]. 2014: The Monuments Men [Caçadores de Obras-Primas]. 

  Ficou claro, quando ele chegou aos 50, que George Clooney era o mais amplamente querido ator nos filmes americanos - e fica claro que ele sabe e não está preparado a disputá-lo. Cary Grant (podemos adicioná-lo?) tinha 50 em 1954 (por volta do momento de  To Catch a Thief [Ladrão de Casaca]) e somente há dez anos, ou próximo disso, da aposentadoria. Naturalmente, os dois homens não são idênticos. Clooney merece ser levado a sério como diretor, ainda que seu filme mais interessante, Confissões de uma Mente Perigosa, começe a parecer que faz muito tempo. E Grant não se colocava como poste de tenda para os amigos, ajudando a produzir filmes como Fail Safe [Código de Ataque], Far from Heaven [Longe do Paraíso], Syriana [Syriana - A Indústria do Petróleo], Michael Clayton, The Informant [O Desinformante!], e The Men Who Stare at Goats [Os Homens Que Encaravam Cabras (dentre outros). É mais pertinente perguntar se a agitação de suas outras atividades tem ajudado a lançar um pouco de confusão sobre o que Clooney realmente faz - sua atuação? E há, naturalmente, ele no ringue com Grant, oferecendo-se para fazer comédia cavalheiresca e drama urbano não apenas com a mesma facilidade, mas com uma flexibilidade moral que às vezes torna difícil distinguir um do outro. George Clooney é atraente, inteligente, leve (no sentido de não ser levado pela emoção e manter um julgamento frio), provocantemente romântico, e solidamente não um garoto (no modo que Depp e Cruise ainda são rapazes). Clooney é um homem. Possui ironia verdadeira. E é feliz de ser fotografado e ainda mais feliz de dar um passo atrás, rumo a sutileza ou a confusão que pode indagar e dizer: "quem sou eu agora?" Em suma, ele possui bastante material que o levaria a ser o mais interessante e equívoco ator de nosso tempo. 

Tudo exceto os papéis? E tudo exceto a ansiedade inata que não pode verdadeiramente confiar em sua própria imagem? Portanto, é importante ressaltar que Clooney se comporta como se fosse "George Clooney" - suave, contido, imaculado, seu próprio amigo - enquanto Cary Grant nunca em sua vida se persuadiu de que havia se tornado "Cary Grant". O que falta a Clooney é o desconforto, a insatisfação consigo, que poderia permitir os píncaros do drama ou da comédia em qualquer relacionamento. O fato de estar satisfeito consigo mesmo antecipa a nossa resposta e retira a ponta da decisão de nós. Mas é também sua rede de segurança e é o sinal de que ainda não está totalmente disposto a se tornar vulnerável. 

Naturalmente, o estilo de câmera de Clooney não é casual como parece. É o resultado de trabalho bastante árduo, enraizado na compreensão de que um pouco menos vai mais adiante, e estabelecido nas horas de tela, na única forma possível em sua mente - nas séries de TV. Portanto, antes de ir ao cinema, Clooney teve seu tempo em E/R (1984/85), The Facts of Life (1985/87), Baby Talk (1991), Roseanne (1988-91); Bodies of Evidence (1992/93), Sisters (1993/94), e mesmo um episódio de Friends (1995). Isto foi mais que suficiente para estabelece-lo. O astuto falante de voz suave, de olhos cintilantes, que geralmente levava a melhor sobre todos. Mas, no processo, ele havia se acostumado ao ambiente de baixo risco, com pouca luz, de estar "ligado" como última alternativa a estar "destligado". Anos depois, há um sedimento em Clooney, como sono em seus olhos, um nível de alerta abaixo da média, que não conhece nada além de estar na TV. 

Vinte anos ou próximo disso, Clooney traduziu esta imagem em filmes, e de maneira mais reveladora, transformou isso em uma característica de programas de entrevistas e eventos de celebridades, nos quais consegue manter a calma e o senso de humor, enquanto parecia ser a mais conectada das estrelas de Hollywood (sua posição política é vaga), o amigo e possibilitador de carreiras como Matt Damon e Steven Soderbergh. Ainda que enquanto ator, Clooney possua acesso a um lado sombrio - como testemunham Syriana e Michael Clayton - ele não realizou nada próximo de um fracasso ou tragédia. Mal pareceu perturbado, quanto mais disperdiçado. E o maior obstáculo para isso pode ser senso de superioridade e seu instinto que, nestes dias, você pode estar a frente de um bocado de filmes indiferentes se você nunca se comprometer. (Ninguém se importa se Danny Ocean fez o "grande trabalho", porque ele não possui nenhum auto-respeito. Ele está vendo um filme que conhece de coração). Então, por que um ator não deveria se manter fora do alcance dos humores e destinos mais sombrios?

Por que ele não poderia ser - nada mais nada menos - que um homem vivendo em fingimento? Ele cometeria suicídio antes que o trabalho se concretize. Pode não atrair Clooney, mas sugere que sua melhor qualidade, sua descontração preguiçosa, é um alerta para que não se envolva demais. 

Para sua carreira de cinema, escolheu se iniciar com Return of the Killer Tomatoes! [A Volta dos Tomates Assassinos] (88, John De Belo); From Dusk Till Dawn [Um Drink no Inferno] (96, Robert Rodriguez); e One Fine Day [Um Dia Especial] (96, Michael Hoffman), no qual foi empregado de sua co-estrela e produtora, Michelle Pfeiffer. Isso nos lembra quão rapidamente assumiu o controle de seu negócio. Foi Batman em Batman & Robin (97, Joel Schumacher), um filme que parecia pertencer a vários outros antes de se tornar dele - ele nunca lutou para controlar um filme; The Peacemaker[O Pacificador] (97, Mimi Leder), que ninguém parece lembrar. E então iniciando uma química verdadeira com Jennifer Lopez em Out of Sight [Irresistível Paixão] (98, Soderbergh).

Depois disto, esteve em The Thin Red Line [Além da Linha Vermelha] (98, Terrence Malick); Three Kings [Três Reis] (99, David O. Russell); Fail Safe [Código de Ataque] (00. Stephen Frears); apresentando efetivo humor em O Brother, Where Art Thou? [E Aí, Meu Irmão, Cade Você?] (00, Irmãos Coen); uma espécie de pescador de poltrona em The Perfect Storm [Mar em Fúria] (00. Wolfgang Petersen*) - ele não costuma se esforçar com frequencia; Spy Kids [Pequenos Espiões] (01, Rodriguez); e então Ocean's Eleven [Onze Homens e um Segredo (01, Soderbergh), onde o verdadeiro sentido do título é a idade mental para o qual é destinado; com um pequeno papel em Welcome to Collinwood [Tudo Por Um Segredo] (02, Anthony e Joe Russo).

Foi Chris Kelvin numa nova versão de Solaris (02, Soderbergh), um projeto que parecia distante das preferências de Clooney. Fez  uma ponta em Spy Kids 3-D [Pequenos Espiões 3: Game Over] (03, Rodriguez). Esteve divertido em Intolerable Cruelty [O Amor Custa Caro] (03, Irmãos Coen); Ocean's Twelve [Doze Homens e Outro Segredo] (04, Soderbergh); Fred Friendly em seu próprio Boa Noite e Boa Sorte]; de longe no seu melhor em Syriana (05, Stephen Gaghan), com uma abordagem desleixada, ligeiramente acima do peso, que lhe rendeu um Oscar de coadjvuante. Todos no mar em The Good German [O Segredo de Berlim] (06, Soderbergh); Ocean's Thirteen [Treze Homens e um Novo Segredo] (07, Soderbergh). Como Michael Clayton (07, Tony Gilroy), onde parecia acreditar que as pretensões obscuras equivaliam a uma seriedade mortal. Em seu próprio O Amor Não Tem Regras, seu último filme digno de nota; divertido em Queime Depois de Ler (08, Irmãos Coen), mas até um determinado ponto; e então, finalmente, com algum sentido a emergir em Up in the Air [Amor Sem Escalas], como um homem que foge de qualquer decisão a tomar; muito grosseiro ao fazer a voz para Fantastic Mr. Fox [O Fantástico Sr. Fox] (09, Wes Anderson); Os Homens Que Encaravam Cabras (09, Grant Heslov). 

Ele tem anos de futuros projetos alinhados, mas o que realmente precisa é de alguma ajuda ou provocação que não seja chamada Soderbergh. Tudo isso nos faz lembrar que Alfred Hitchcock e Howard Hawks testavam seus atores principais de maneira muito mais abrangente que os diretores proeminentes de hoje. Amor Sem Escalas é sua obra mais promisora (e frágil). Pode estar seguindo um caminho muito frutífero. Mas ele poderia nos dar um piscar de olhos e um aceno a ser "ele mesmo" para sempre. 

Tudo pelo Poder foi dolorosamente cuidadoso e correto em seu cinismo - e também ingênuo. O ator flutuou: The American [Um Homem Misterioso] (10, Anton Corbijn), soa como um exercício. The Descendants [Os Descendentes] (11, Alexander Payne) foi de longe mais interessante, e Clooney foi indicado para atuação, assim como melhor filme. Acredito que ele possui menos do que aparenta, o que lhe deixa com dificuldades na vida sem a adequada convicção ou crueza. Esteve no espaço com Sandra Bullock em Gravity [Gravidade] (13, Alfonso Cuarón), a qualidade que encontra mais elusiva. 

Texto: Thomson, David. The New Biographical Dictionary of Film. N. York: Alfred A. Knopf, 2014, pp. 490-94.


(*) N. do E: o sobrenome do realizador está grafado incorretamente no original, Peterson.  

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