Filme do Dia: Os Maridos (1970), John Cassavetes
Os Maridos (Husbands, EUA,
1970). Direção e Rot. Original John Cassavetes. Fotografia Victor J. Kemper.
Montagem John Cassavetes. Com Ben Gazzara, Peter Falk, John Cassavetes, Jenny
Runacre, Jenne Lee Wright, John Kullers, Meta Shaw Stevens, Leola Harlow,
Dolores Delmar, Lorraine MacMartin.
Após os
funerais de um quarto amigo, os três amigos remanescentes, Harry (Gazzara),
Archie (Falk) e Gus (Cassavetes) passam uma noite de bebedeira e extroversão,
com momentos de conflito, tensão e enjoo. No dia seguinte, alguns deles tentam
trabalhar, mas Harry, que vai a casa buscar seu passaporte e agride mulher
(Stevens) e sogra (MacMartin), decide fazer uma viagem a Londres. Os dois
amigos concordam. Lá, vão a um cassino e levam para o hotel, três mulheres. A
que formara par com Archie, oriental, sai na chuva sem pronunciar uma palavra
em inglês. Mary (Runacre), tem um breve envolvimento afetivo com Gus, e quando
retornam Harry está com um grupo de várias mulheres.
Um dos
quatro amigos das fotos de um possível álbum, no qual o quarteto surge fazendo
palhaçadas em uma reunião com suas respectivas famílias não mais existe. E as
fotos dos momentos de diversão observadas nos créditos são sucedidas pelo
enterro do mesmo. Há uma obsessão em se retratar a duração de alguns momentos
de convivência humana mais que propriamente qualquer tipo de arco dramático,
ainda que seja para quase obscurece-lo progressivamente (como em O Eclipse ou Dias de Fogo). Assim, a rigor, não
importaria tanto que houvesse modificação na cronologia de muitas das situações
apresentadas. E não importa muito para
Cassavetes que aqui tais situações se refiram a uma espécie de final de semana
prolongado em que é necessário de várias formas se exorcizar a morte desse
amigo, que os abala sobretudo ao se visualizarem como homens de já certa idade
em relação aos sonhos juvenis – aqui apenas esboçados em uma ou outra fala,
como quando um deles afirma que desejava ser atleta – e com vidas nas quais já
perderam algo. E numa sociedade extremamente opressora com relação aos
sentimentos individuais, demasiado calculista e metódica, a morte pode ser esse
elemento que impulsiona essa explosão desordenada de subjetividades,
ocasionalmente agressivas. Uma das formas de intensificar essa decalcagem de
momentos de interação é a honesta abdicação de qualquer trilha musical que não
seja a de sons ambientes ou das próprias vozes dos atores. Há uma cena, ao
menos visualmente, evocativa de Faces, que envolve Cassavetes e a garota
que leva ao hotel (vivida com brio por Jenny Runacre), embora aqui a sequencia
esteja longe de envolver uma cena dramática. E há a misoginia dos personagens –
a determinado momento, a Mary de Runacre afirma o quanto detesta os risinhos
compartilhados de colegiais do trio e consegue manter Gus afastado dos outros
dois, enquanto se encontram juntos – também parece impregnar o próprio narrador
(que estrutura a narrativa), dada a felicidade com que as mulheres sucumbem ao
trio americano, o que deixa Harry auto-confiante ao ponto de afirmar que se não
fosse o grupo que estava lá no seu quarto, seria outro. E, ainda no plano
ficcional, a forma muito mais enfática com que interrompem as mulheres na cena
de cantoria que os homens incentivam. O
álcool é a senha para o acesso ao muito da subjetividade estropiada pela
rotina. E de forma bem mais honesta e verossímil que o sobrevalorizado Druk,
de meio século após. E há o bálsamo da libertação quanto ao psicologismo e ao
julgamento moral do que descreve em seus filmes. Os filhos de Cassavetes, Nick
e Xan surgem numa ponta ao final, vivendo a si próprios. A versão oficial
consta de 154 minutos. Faces Music para Columbia Pictures. 125 minutos.
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