Dicionário Histórico de Cinema Sul-Americano#115: Ricardo Aronovich
ARONOVICH, Ricardo. (Argentina, 1930). Provavelmente o maior diretor de fotografia nascido na Argentina de todos os tempos, Ricardo Aronovich também foi um dos mais prolíficos, tendo filmado 90 filmes em 52 anos (de 1959 a 2010), quase dois por ano, em média. Nascido em Buenos Aires, Aronovich foi introduzido às artes da pintura e da fotografia por seu pai, que o enviou para estudar no Instituto de Design em Chicago. De volta à Argentina, aprendeu a arte e a técnica da cinematografia com Simón Feldman. Começou a trabalhar como diretor de fotografia em curtas-metragens do Nuevo Cine, dirigidos por Fernando Birri e Juan Berend em 1959, e no mesmo ano dividiu os créditos de fotografia em um longa-metragem dirigido por Feldman, El negoción. Em 1961, Aronovich filmou um dos filmes-chave do "novo" cinema argentino, Tres veces Ana (Três Vezes Ana), dirigido por David José Kohon. Timothy Barnard argumenta que Kohon encontrou em Aronovich seu colaborador ideal para filmar as três histórias em diferentes estilos apropriados a seus temas, desde o realismo áspero de La tierra (A Terra) até a aura onírica de Las nubes (As Nuvens) (1996, p. 38).
Em 1962, Aronovich filmou para Manuel Antín (Los venerables todos) e Rudolfo Kuhn (Los jóvenes viejos). Por mais significativo que tenha sido o trabalho inicial de Aronovich na Argentina, suas contribuições para o Cinema Novo brasileiro podem ter sido ainda maiores. Sua primeira tarefa como diretor de fotografia foi com Anselmo Duarte em Vereda de Salvação (1964), pelo qual recebeu seu primeiro prêmio, o Troféu Candango no Festival de Brasília do Cinema Brasileiro em 1965. Em seguida, realizou um brilhante trabalho de câmera na mão para Ruy Guerra no grande filme Os Fuzis (1964). Após um breve retorno à Argentina, Aronovich fez sua segunda grande contribuição ao cinema brasileiro como diretor de fotografia em São Paulo, Sociedade Anônima (1965), dirigido por Luís Sérgio Person. Este filme é considerado um dos mais importantes filmes urbanos de sua época, centrando-se em Carlos, um funcionário da fábrica da Volkswagen em São Paulo, e introduzindo a classe média urbana brasileira como tema. Também se destacou pelo trabalho fluido de câmera de Aronovich, que, nas palavras de um crítico, era “desimpedido, versátil, repleto de energia, capturando com maestria multidões, linhas de montagem, maratonas de rua, pequenos apartamentos, resorts de praia, festas, rostos, corpos, carros.” De volta à Argentina em 1966, filmou alguns curtas-metragens (documentários e animações) e, em 1967, trabalhou pela primeira vez com Hugo Santiago como diretor de fotografia em um curta dramático baseado em um conto de Jorge Luis Borges, Los contrabandistas. No final da década, Aronovich voltou a trabalhar com Ruy Guerra em Ternos Caçadores (1969), e filmou outro curta baseado em Borges para Santiago, além do primeiro longa-metragem do diretor, o magistral Invasión (1969), e colaborou com produtores europeus pela primeira vez em Benito Cereno (Itália/França/Brasil, 1969), com Guerra no papel principal.
Ao longo dos anos 1970, Aronovich, radicado na França, trabalhou como diretor de fotografia para diversos cineastas de renome, incluindo Louis Malle em Le souffle au cœur (Sopro no Coração, França/Itália/Alemanha Ocidental, 1971); Marguerite Duras em Jaune le soleil (França, 1972); Philippe de Broca em Chère Louise (Louise - Uma Mulher Sem Medo de Amar, França, 1972); Andrzej Żuławski em L’important c’est d’aimer (O Importante é Amar, França/Itália/Alemanha Ocidental, 1975); Jeanne Moreau em Lumière (França/Itália, 1976); Alain Resnais em Providence (França/Suíça, 1977); e Constantin Costa-Gavras em Clair de femme (Um Homem, Uma Mulher, Uma Noite, França/Itália/Alemanha Ocidental, 1979). Resnais elogiou o trabalho de Aronovich em Providence por suas qualidades majestosas e de “realismo mágico”. De fato, a combinação no filme entre memória, imaginação, passado, presente e futuro desafiou o diretor de fotografia a trabalhar com luz e sombra de maneira inovadora. Aronovich continuou colaborando com seu compatriota argentino Hugo Santiago em seus seis filmes seguintes (até 1986), incluindo dois rodados na França. Pela grande quantidade de coproduções internacionais em sua filmografia, pode-se supor que ele até mesmo tenha incentivado a realização dessas colaborações, especialmente com cineastas sul-americanos. Ele trabalhou como diretor de fotografia nos filmes Sérail (França, 1976), do argentino Eduardo de Gregorio, e El recurso del método (O Recurso do Método, França/México/Cuba, 1978), do chileno Miguel Littín.
Aronovich foi, mais notoriamente, diretor de fotografia de Costa-Gavras novamente no filme hollywoodiano Missing (Desaparecido: Um Grande Mistério, Estados Unidos, 1982), um drama realista e anti-Pinochet. Durante os anos 1980, trabalhou em dois filmes do diretor italiano Ettore Scola: Le bal (O Baile, Itália/França/Argélia, 1983) e La famiglia (A Família, Itália/França, 1987), que talvez tenham se adequado ainda mais à sua estética voltada para filmes de época. Chegou a colaborar com diretores africanos e asiáticos, como Med Hondo e Dai Sijie, respectivamente. No entanto, após filmar um trabalho tipicamente "realista mágico" para a diretora venezuelana Fina Torres, Mécaniques célestes/Mecánicas celestes (França/Bélgica/Espanha, 1995), Aronovich provavelmente encontrou seu colaborador ideal em Raúl Ruiz, em 1999. Ele foi o diretor de fotografia da adaptação de Proust feita por Ruiz, Le temps retrouvé (O Tempo Redescoberto, 1999), e depois trabalhou no retrato estilizado Klimt (2006). Também assinou a fotografia de um dos últimos filmes de Ruiz, A Closed Book (Intenções Ocultas, 2009).
Embora nunca tenha sido indicado ao Oscar, Aronovich foi duas vezes nomeado ao prêmio César de Melhor Fotografia da Academia de Cinema da França: em 1978 por Providence e em 1984 por O Baile.Ao longo dos anos, ele ocasionalmente trabalhou em projetos argentinos, e sua fotografia em El Impostor, dirigido por Alejandro Maci, lhe rendeu o prêmio de Melhor Fotografia no Festival Internacional do Novo Cinema Latino-Americano de 1997 (Havana, Cuba). Aronovich é membro das associações de diretores de fotografia da França (AFC), Argentina (ADF) e Brasil (ABC). Em 2009, tornou-se apenas o segundo homenageado com o Imago Tribute to European Cinematographers. O prêmio veio no formato de um Spectra Meter ajustado para a abertura 5.6, configuração que ele sempre defendeu como sendo a ideal. Por isso, ele é conhecido como “Mr. 5.6.”
Texto: Rist, Peter H. Historical Dictionary of South American Film. Plymouth: Rowman & Littlefield, 2014, pp. 56-58.
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