Filme do Dia: Vampiros de Almas (1956), Don Siegel

 


Vampiros de Almas (Invasion of the Body Snatchers, EUA, 1956). Direção: Don Siegel. Rot. Adaptado: Daniel Mainwaring, a partir da série publicada na revista Collier’s. Fotografia: Elwswroth Fredericks. Música: Carmen Dragon. Montagem: Robert S. Eisen. Dir. de arte: Ted Haworth. Cenografia: Joseph Kish. Com: Kevin McCarthy, Dana Wynter, Larry Gates, King Donovan, Carolyn Jones, Jean Willes, Ralph Dunke, Virginia Christine.

Em Santa Mira, Califórnia, casos que são associados como de histeria coletiva começam a surgir.  O Dr. Miles (McCarthy) se encontra grandemente atento ao fenômeno, assim como sua namorada, Becky (Wynter). Quando o casal Jack (Donovan) e Theodora (Jones) lhes apresenta uma estranha forma que surgiu em sua casa, que mais parece uma reprodução inumana de Jack, Miles percebe que algo de fato está acontecendo de muito estranho. Ele encontrará uma reprodução da própria Becky, no porão da casa dela. Logo perceberão que a multiplicação de tais seres ganhou proporções epidêmicas, e que mesmo Jack e Theodora já foram substituídos por seus equivalentes vegetais. Fugindo desesperadamente, o casal se torna crescentemente cansado e enquanto Miles vai investigar sobre a música que escutara, e perceberá que se trata de uma fazenda em que centenas de vagens são depositadas em caminhões, Becky fraqueja e dorme, também se tornando mais uma e alertando para o grupo onde ele se encontra. Miles consegue carona e conta sua história para as autoridades de Los Angeles, que acreditam ele se encontrar em estado de surto.

Cada plano nessa ficção-científica parece tocado pela sensibilidade de alguém que demonstrava seu vigor em ir além do que se esperava em produções do tipo. Seu apuro visual,  deixa-o a anos-luz, por exemplo, dos filmes de um Jack Arnold, mesmo contando com um elenco limitado e um roteiro talvez não muito distante disso. Iniciando in media res e passando então a um desnecessário flashback, evocativo das estratégias do noir, sendo narrado por seu alucinado protagonista. Ao abrir mão de efeitos especiais ou monstros bizarros e fazer intenso uso atmosférico das próprias ruas de Los Angeles à noite (ainda que o filme se faça passar numa pequena cidade, visivelmente faz uso de locações em uma cidade grande) poderia ser considerado como antecipador de estratégias similares utilizadas por Godard em seu Alphaville. Aliás o cineasta francês deve também ter se interessado pelos belos planos do casal descendo escadas, observados de costas e contra à luz.  Se é verdade que a leitura canônica de filmes como esse o percebem como alegoria do perigo da uniformidade de uma ditadura no estilo da dos países socialistas, em pleno auge da Guerra Fria, tampouco poderia deixar de servir para uma América a cada dia mais gentrificada e vivenciando a paranoia mccharthista.  A completamente assimétrica lida dos heróis contra o mundo, aqui curiosamente observada no ambiente de uma pequena cidade, tornar-se-ia um dos clichês duradouros do gênero, ressurgindo forte em filmes posteriores como A Última Esperança da Terra. Em alguns momentos existem deslizes, como o entusiasmo que o líder à perseguição ao casal apresenta, embora pretensamente os seres de origem vegetal e extraterrestre sejam destituídos de sentimentos – mais um elemento que seria apropriado por Godard – algo que, aliás, é explicitado numa bela cena, em que o chefe de polícia apresenta as vantagens de não possuir emoções. Seu final procura negociar uma esperança de ser feliz, com as autoridades agora convencidas da fala de Miles, embora o próprio Miles tenha perdido todos os seus contatos, inclusive -e mais perversamente – sua própria companheira, também transformada em vegetal na fuga desesperada. E, se tivesse sido poroduzido em outro momento, talvez pudesse deixar em ambiguidade sobre a veracidade ou não do relato de Miles, e portanto de tudo o que assistimos. Uma licença poética ao gênero pode ser perfeitamente concedida que ninguém para além do ambiente da ficcional Santa Mira perceba o que anda ocorrendo por lá. McCarthy que soava em falso em uma produção demasiado séria como A Morte do Caixeiro Viajante (1951), aqui se encontra perfeitamente adequado. Enquanto Dana Wynter parece um modelo de beleza clássica da época ou uma modesta evocação de sua contemporânea Elizabeth Taylor. Um dos poucos exemplos de produção que voltaria a ser filmada por dois cineastas de também relativo destaque, Philip Kaufman (em 1978) e Abel Ferrara (em 1992). Sam Peckinpah, que se tornaria discípulo de Siegel, surge numa ponta creditada. Walter Wanger Prod. para Allied Artists Pictures.  80 minutos.

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