Filme do Dia: Adeus, Mr. Chips (1969), Herbert Ross

 


Adeus, Mr. Chips (Goodbye, Mr. Chips, EUA, 1969). Direção Herbert Ross. Rot. Adaptado Terence Rattingan, a partir do romance de James Hilton. Fotografia Oswald Morris. Música John Williams. Montagem: Ralph Kemplen. Dir. de arte Ken Adam & Maurice Fowler. Figurinos Julie Harris. Com Peter O’Toole, Petula Clark, Michael Redgrave, George Baker, Siân Phillips, Michael Bryant, Jack Hedley, Jenny Runacre, Clinton Greyn.

Chips (O’Toole) é um professor odiado por seus alunos, por ser turrão e excessivamente exigente e metódico. Numa viagem à Grécia conhece uma estrela do espetáculo musical que havia assistido tempos antes, Katherine (Clark), que inicialmente se torna um motivo de constrangimento diante da sisuda comunidade escolar britânica.

Desde antes de propriamente iniciar sua narrativa ficcional somos convidados à pompa e gravidade de um espetáculo de pretensões, dando-se ao luxo de quatro minutos de ouverture em tela azul e interrupção, como somente a grandiloquência de peças similares (nesse aspecto, apenas) como ...E O Vento Levou, produzido exatamente três décadas antes, assim como a primeira versão do romance de Hilton chegaria às telas, existindo uma versão de 2002, o que demonstra a perenidade de interesse sobre o mesmo. Ou, muito mais apropriadamente, as majestosas produções de David Lean, mais próximas temporalmente, e de quem compartilha astros como O’Toole e técnicos como Morris. E, claro, há um enorme desejo de ser uma produção britânica, como se pode observar no elenco, e em alguns nomes capitais dos que se encontravam por trás das câmeras, como Terence Rattingan ou, uma vez mais, Morris, embora com capital e diretor norte-americanos. E, pior que as pretensões de seguir um cinema algo mofado já a época de produzido, é o fato de ser mais um musical que tentou a difícil sorte de sucesso de dois exemplares raros do gênero na primeira metade da década (Mary Poppins e A Noviça Rebelde), dentre tantos (Oliver!, A Garota Genial, Alô, Dolly!, O Fabuloso Dr. Dolittle, A Estrela, Camelot). E as canções e sua representação parecem verdadeiramente dignas do tédio que o professor provoca em seus alunos. E que o filme deve ter provocado em seus espectadores que de forma aproximada haviam tido muito mais interessantes filmes a lidarem com a temática escolar (Se...) e também do uso da canção pelo cinema (Sem Destino). Se a batalha de travesseiros foi uma intencionada alusão ao clássico Zero em Conduta, de Vigo (mais bem representado pelo filme de Lindsay Anderson), e é bem provável que o tenha sido, a evocação da nudez juvenil que acompanha de relance boa parte dos filmes de internato, é um bom critério para se mensurar o quão distante são o universo dessas duas produções, e respectivas visões de mundo. As aborrecidas canções são “praticadas” em meio da ação, embora algumas vezes sejamos poupados delas quando se acreditava com certeza que seríamos acometidos por mais uma. É o caso do momento em que um desolado Chips, logo após ficar a sós, e ruminando ainda a má nova de que não se tornará o reitor como esperava, olha para o ambiente solene e vazio onde ocorrem os eventos que reúnem a coletividade escolar. Infelizmente, também ocorre o oposto, como quando Katherine se vê a sós na escada de casa, enquanto o marido foi pegar uma bebida para brindar sua continuidade na instituição. Em dois únicos momentos, e particularmente em um deles,  o número musical é de fato um número, envolvendo performance diante do público e uma evocação ao vaudeville belle époque – e como isso faz a diferença. Chips, numa cena,  parece encarnar o espírito que Humphrey Jennings cantou em seu clássico curta documental Listen to Britain, de resistência ao nazi-fascismo que ataca o país com bombardeios aéreos, mantendo a moral e a vida cotidiana como resistência. Quando comparado a outra produção temporalmente próxima lidando com um protagonista professor, Ao Mestre, com Carinho, a transformação daquele se dá com a turma a partir de uma ação do professor e aqui essa transformação que conquista as turmas se dá através do professor, após ter descoberto o amor. E quando se faz o mesmo em relação ao contemporâneo A Primavera de uma Solteirona, ambientado em período próximo, observa-se uma dessacralização da figura do mestre (da mestra, no caso) e a utilização de ambientes menos sentimentais e que, no caso de Se..., trazem uma postura mais afim com o espírito estudantil de 68. Aqui, pelo contrário, mesmo Chips em seu discurso de despedida assinalando que o mundo será outro com o final da Segunda Guerra, os sobrenomes ouvidos ao final se repetem por gerações, reforçando um senso de continuidade no elitizado ambiente escolar descrito.  E o mesmo pode ser dito da contínua adequação de Katherine ao mundo de Chips, abandonando sua vida profissional e o ruidoso círculo de amigos que possuía pela vida de dona de casa e de completa devoção ao esposo. Filme de estreia de Ross. Já o tema de um professor  igualmente ingênuo, tímido e sem grande experiência mundana que encontra uma corista, será trabalhada como sua derrocada profissional e pessoal no clássico alemão O Anjo Azul. O zoom, que vivia seus dias de auge, é utilizado com frequência e a relativamente discreta caracterização da velhice de Chips, soa mais razoável mais de meio século após que muitas produções que abusaram das próteses décadas depois.  APJAC Prod./MGM para MGM. 155 minutos.

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