Filme do Dia: Meteorango Kid, O Herói Intergalático (1969), André Luiz Oliveira



Meteorango Kid, O Herói Intergalático (Brasil, 1969). Direção e Rot. Original: André Luiz Oliveira. Fotografia: Vito Diniz. Montagem: Márcio Cury e André Luiz Oliveira. Cenografia: José Wagner e Edson Grande. Com: Antônio Luiz Martins, Carlos Bastos, Milton Gaúcho, Antônio Vianna, Nilda Spencer, Ana Lúcia Oliveira, João Di Sordi, Sônia Dias, José Wagner, Manuel Costa Júnior.
        No dia de seu aniversário, Lula (Martins), jovem estudante universitário que pretende fazer cinema lê revistas em quadrinhos em meio a pancadaria dos colegas, pensa em assistir um filme de Tarzan, fuma maconha com os amigos, transforma-se em super-herói à hora do almoço para enfrentar a caretice dos pais, vai ao enterro de um amigo homossexual que se suicidou e ao voltar para casa encontra, para seu desespero, a casa repleta de convidados.
       Desde os alucinados planos iniciais que mesclam Janis Joplin e deambulação pelas ruas de Salvador à noite (aliás Joplin alimentou outros bons momentos de deambulação e cinema de vanguarda, como experiências em super-8 tais como Rio de Janeiro – Brasil), logo se percebe que o intuito do realizador não é centrar seu foco no enredo em si próprio. Grandemente sensível à sua realidade contemporânea (repressão política+contracultura+tropicalismo+corrida espacial+rock) tanto em termos diegéticos quanto em sua própria forma, o filme se intoxica dessa miscelânea que pretende representar o imaginário de seu protagonista, resultando numa realização extremamente criativa e pulsante, onde o cinema não deixa de ser referenciado a todo momento: seja quando o herói empurra a câmera ao acordar, quando fuma maconha com seus amigos ao som do tema de Strauss utilizado em 2001 – Uma Odisséia no Espaço ou nos hilariantes esquetes que fazem menção a Nosferatu e os filmes de Tarzan. Seu eixo de influência principal, no entanto, parece ser: 1) o  tom amoral anti-burguês buñuelesco (no sentido tanto de sua contrafação da vigilância aos bons costumes, como no ataque aos pais, no escracho diante do amigo morto ou no ataque à velha senhora que chora pelo parente morto quanto, mais especificamente, na referência à orgia de Cristo de A Idade do Ouro ou na bolinação de uma mulher no ônibus por parte do herói, muitas vezes em chave igualmente onírica); 2) a auto-evidenciada “estética do lixo” de O Bandido da Luz Vermelha (citado com seu bordão: “quando a gente não pode a gente avacalha e se esculhamba”). A certo momento, um sósia de Jimi Hendrix é morto (uma tentativa de antropofagizar instantaneamente o culto ao guitarrista em sua matriz sganzerliana?). Faz excelente uso da câmera lenta somado ao processo de reversão do filme (logo no início, o cristo-protagonista volta à cruz em um movimento semelhante aos utilizados por Richard Lester em Os Reis do Iê-Iê-Iê) e da câmera rápida (como no momento em que o vampiresco maníaco sexual se aproxima de suas vítimas). Mesmo que em retrospecto algumas situações possam parecer demasiado ingênuas em sua tentativa de demonstrarem rebeldia (como a do herói limpando o nariz no ônibus diante de duas moças e a dedicatória do filme ao cabelo do realizador),o resultado final é soberbamente original. Na trilha sonora a mescla de Hendrix, Beethoven, Carmen Miranda e Caetano Veloso, inclusive com várias inserções de seu famoso discurso no Festival da Canção da TV Record.  Desse momento privilegiado de uma produção tão marcada pelo especificamente visual, saíram outras obras ricas como os filmes de Sganzerla, Bressane e Bang Bang, de Tonacci. ALO Produções Cinematográficas. 85 minutos.


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