Filme do Dia: O Hotel de um Milhão de Dólares (2000), Wim Wenders

 


O Hotel de Um Milhão de Dólares (The Million Dollar Hotel, EUA/Alemanha, 2000). Direção:  Wim Wenders. Rot. Original: Bono & Nicholas Klein. Fotografia: Phedon Papamichael. Música: Bono, Brian Eno, Jon Hassell, Daniel Lanois & Hal Willner. Montagem: Tatiana S. Riegel. Dir. de Arte: Robbie Freed & Bella Serrell. Cenografia: Tiffany Payne. Figurinos: Nancy Steiner. Com: Jeremy Davies, Mel Gibson, Milla Jovovich, Jimmy Smits, Amanda Plummer, Gloria Stuart, Donal Logue, Harris Yulin, Tim Roth, Julian Sands.          

 Skinner (Gibson) é um policial do FBI contratado pelo milionário Stanley Goldkiss (Yulin), pai do rapaz Izzy (Roth), morto recentemente, quando caiu do teto de um hotel-espelunca do centro de Los Angeles. Skinner procura se aproximar de Tom Tom (Davies), o desequilibrado melhor amigo de Izzy e, através dele, ver se consegue penetrar na sandice coletiva dos tipos do hotel que incluem: um homem que pensa ser o índio Geronimo (Smits); Eloise, uma garota introspectiva por quem Tom Tom é apaixonado; uma velha senhora que lembra os dias de glória do hotel, na época de J.Edgar Hoover, Jessica (Stuart) e Charley Best (Logue), que acredita ser John Lennon. O grupo se une para divulgar os trabalhos de arte plástica que Izzy produzia, mesmo sabendo que o autor real dos mesmos era Geronimo, aproveitando o espaço reservado pela mídia ao caso. A noite de gala que irá divulgar as obras de Izzy conta com a presença da imprensa e do pai do mesmo, porém o golpe de sorte que o grupo pretendia é prejudicado com a notícia de que os quadros com breu escondem obras roubadas. A declaração gravada por Tom Tom de que fora o assassino, bolada conjuntamente pelo grupo, como forma de liberar Geronimo da prisão, vai ao ar e ele procura se esconder da polícia com Eloise, revelando no quarto de hotel que ele fora realmente o assassino, já que não suportara o fato de Izzy ter violentado Eloise. Antes de ser capturado, no entanto, Tom Tom, ou simplesmente Tom, como prefere ser chamado nos últimos dias, suicida-se pulando do mesmo teto do hotel. Skinner, que acabara confessando se identificar com o universo excêntrico e derrotado dos  membros do hotel, presta seu tributo ao suicida, indo ao local que ainda guarda marcas de seu sangue, no mesmo momento que Eloise lá se encontra.    

     Mesmo que longe de seus melhores filmes, essa irregular sátira do estilo noir, com um personagem que antecipa as duas últimas semanas de sua vida sobre a perspectiva de alguém morto (tal e qual o clássico noir Crepúsculo dos Deuses ou o mais recente Beleza Americana), possui alguns momentos de brilho. Para além dos momentos isolados de beleza plástica como os que Tom Tom se encontra numa banheira e não muito distante de sua cabeça percebe-se o tráfego fluindo muitos metros abaixo ou uma virtuosa seqüência de diálogo em plano/contra-plano entre esse e Eloise ou da boa direção de atores (que consegue, inclusive, apreender sinais de talento na inexpressiva Jovovich), o melhor do filme são as reflexões irônicas expressas nos diálogos ou na narração in off/over. Há certo momento Tom Tom, por exemplo, afirma que Skinner pode ser mais afiado no mundo da racionalidade, mas ninguém pode trafegar como ele no labirintos entre razão e desrazão ou ainda a irônica elegia que faz da vida já depois de morto. Gibson faz uma paródia de muitos dos tipos que viveu no cinema e Wenders não deixa de focar aviões, à guisa de uma mínima identificação com os primeiros filmes – embora a lógica de trabalhar personagens como ilustração de idéias, muitas das quais confusas, acaba soando tão artificiosa quanto a de filmes como Até o Fim do Mundo e, talvez, a maior fraqueza do filme. Entre as muitas metáforas que podem ser extraídas do que há de explícito na narrativa se encontra a da deterioração dos ideais utópicos dos anos 60 (representados pela turba evocativa da contracultura que são hóspedes do hotel) nos dias de globalização, sem o apoio da previdência ou dinheiro para pagar um plano de saúde privado. Davies está excelente. Bono, além de ter canções na trilha, idealizado a história e aparecido como figurante é o co-produtor do filme, que recebeu o Prêmio do Júri no Festival de Berlim. Icon Entertainment International/Kintop Pictures/Road Movies Filmproduktion. 122 minutos.


Postado originalmente em 31/10/2014

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Filme do Dia: Der Traum des Bildhauers (1907), Johann Schwarzer

Filme do Dia: Quem é a Bruxa? (1949), Friz Freleng

Filme do Dia: El Despojo (1960), Antonio Reynoso