Filme do Dia: House of Death (1932), Vasili Fyodorov



 House of Death (Myortvyy Dom, União Soviética, 1932). Direção: Vasili Fyodorov. Rot. Adaptado: Vasili Fyodorov & Viktor Shklovski, a partir do romance de Dotoievski. Fotografia: Vasili Pronin. Música: Vasili Kryukov. Dir. de arte: Vladimir Yegorov. Com: Nikolai Khmelyov, Nikolai Podgorni, Nikolai Vitovtov, Nikolai Radin, Vladimir Belokurov, Vladimir Uralskiy, Vasili Kovrigin, Viktor Shklovski.

    Quando de uma conferência que já um célebre Dostoievski (Khmelyov) efetua em um tributo a Pushkin, o autor se sente mal e reminiscências de sua experiência passado enquanto revolucionário assomam. E também o resultado delas, que foi a condenação à morte e a comutação da pena quando já se encontrava no cadafalso. E o envio a uma prisão na Sibéria, de péssimas condições de higiene e conforto, onde os prisioneiros se deslocam para trabalhos forçados. 

    Se a representação de um Dostoievski sempre demasiado reflexivo e nunca realizando qualquer atividade trivial pode parecer demasiado pomposa até certo momento do filme (depois ele, inclusive, será observado praticamente nu, como vários outros prisioneiros, incomodado com o banho coletivo, numa apresentação da intimidade de laivos naturalistas não tão incomuns no cinema contemporâneo, como presente  no alemão Tragédia da Mina, e ainda mais “invasiva”) nada há a censurar na interpretação que lhe empresta Khmelyov, que oferece até tiques discretos em momentos de grande tensão e menos ainda na proposta do realizador, quando se sabia que o escritor entrara em desgraça junto ao cânone cultural soviético, só sendo reabilitado posteriormente. Longe da peça trivial de propaganda, o filme apresenta o autor em seus dilemas – sua fé cristã, por exemplo, nunca é tratada com mofa, parecendo, pelo contrário, ser uma fonte importante na sua resiliência às situações adversas, como a que acorda em meio a multidão de corpos amontoados no dormitório da prisão. O tratamento  da cena é quase uma tradução visual bíblica do inferno na terra, sem a necessidade de demônios que não os provocados pelo próprio homem.  Mesmo que soe esquemática sua “tomada de consciência” a partir de um momento que observa um velho sendo torturado por uma relativamente vasta milícia, o filme traz soluções visuais bastante razoáveis, como a da abortada execução coletiva – cuja leitura do pregão público que a inicia, apresenta um soldado gago que apenas atenua a sensação de tensão expectativa. Sua narrativa cíclica aqui não representa apenas uma opção formal, mas igualmente uma representação dos fantasmas que afligem o atormentado pensador, ressaltados ainda mais pelo retorno ao tema marcial da banda em que se ressalta os pífaros e as pesadas colunas de um poder inflexível do Estado degradado e autoritário. Não é, cumpre frisar o cineasta, uma mera fantasmagoria subjetiva, pois retorna igualmente no discurso explícito de um porta-voz do mesmo, a afirmar que Dostoievski não consegue se desenredar desse mundo que, de certo modo, detesta. Mehzrabpomfilm. 81 minutos.


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