Filme do Dia: O Pequeno Dieter Precisa Voar (1997), Werner Herzog

 


O Pequeno Dieter Precisa Voar (Little Dieter Needs to Fly, França/Alemanha/Reino Unido, 1997). Direção e Rot. Original: Werner Herzog.

Documentário em que Herzog revive, através das palavras do aviador da marinha americana Dieter Dengler, nascido na Alemanha, todos os sofrimentos que vivenciou no Laos, na época em que era prisioneiro de guerra em meados da dos anos 60. Apaixonado por aviões, Dengler teve seu avião abatido e passou então por uma infindável sessão de agruras, torturas e sofrimentos que somente cessou quando foi encontrado por um militar americano. Herzog assimila Dengler a sua galeria de personagens “marginais” também presente em sua produção ficcional, e assim pode ser lida a sua menção à “alguém que foi negado pela morte” como faz referência a passagem bíblica que serve como epígrafe ao filme e também outros momentos de sua narração off. Por vezes sua narrativa é interrompida por imagens que juntamente com a trilha musical que inclui temas de Wagner, Bach e algumas árias, além de uma fotografia que procura fugir de qualquer padrão recorrente, pretendem provocar um certo estranhamento e referência ao próprio “estilo” do cineasta. Herzog estrutura a “enredo” sobretudo a partir de imagens filmadas no próprio local onde Dengler sofreu atrocidades, em imagens de arquivo que o apresentam discursando sobre os eventos, imagens de arquivo da própria guerra, uma foto de Dengler cadavérico quando de sua captura e um encontro com o homem que o percebeu em meio à floresta e salvou sua vida.  Embora Herzog seja bem sucedido em sua opção de evitar qualquer julgamento moral sobre o retratado – por exemplo, não existe qualquer tentativa de efetivar uma análise histórica do conflito, ainda que à guisa de uma breve contextualização ou de questionar sua paixão pela aviação e sua vinculação ou não ao belicismo que provocou um terror não somente a ele e seus companheiros – torna-se mais problemática a referida reconstituição da população do Laos. É certamente pouco provável  que a reconstituição utilizando atuais moradores dos locais onde Dangler vivenciou seu drama não tenha partido do cineasta, tornando completamente secundária qualquer menção à cultura do país que não seja pela visão extremamente limitada e etnocêntrica de Dengler e reproduzindo involuntariamente alguns dos cacoetes sobre populações primitivas e suas representações por euro-americanos. Nesse sentido, os habitantes atuais da floresta em que o protagonista viveu seu drama não passam de, por vezes constrangidos, extras. E, ainda mais problemático,  é o sempre presente  risco de exploração voyeurística dos dramas, reforçada tanto pela narração off de Herzog em mais de um momento quanto pela própria fala de Dangler, que faz menção a impossibilidade de expressão real do sofrimento vivenciado em determinados momentos. Aproxima-se, por esse viés, de alguns dos personagens românticos mais notórios de Herzog, tais como Kaspar Hauser. Algo, no sentido de uma exploração “dramática” se dá igualmente quando filma o reencontro entre Dengler e o oficial americano em uma ceia de Ação de Graças com Jesus, Alegria dos Homens, na banda sonora. Nesse momento, o tom místico com que pretende construir a inusitada jornada de seu personagem, acaba se aproximando perigosamente da pura manipulação emocional. Werner Herzog Filmproduktion/ZDF/ZDF Enterprises/BBC/arte/Media Ventures. 80 minutos.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Filme do Dia: Der Traum des Bildhauers (1907), Johann Schwarzer

Filme do Dia: El Despojo (1960), Antonio Reynoso

Filme do Dia: Quem é a Bruxa? (1949), Friz Freleng