Filme do Dia: Shirins Hochzeit (1976), Helma Sanders-Brahms


Shirins Hochzeit - Cineplex Marburg
Shirins Hochzeit (Alemanha Ocidental, 1976). Direção e Rot. Original: Helma Sanders-Brahms. Fotografia: Thomas Mauch. Música: Omer S. Livanelli. Montagem: Margot Lohlein. Dir. de arte: Manfred Luetz. Com: Ayten Erten, Jürgen Prochnow, Aras Ören, Aliki Georgouli, Janis Kiriakidis, Peter Franke, Hans Peter Hallwachs, Ortrud Beginnen.
Shirin (Erten) é completamente dedicada ao noivo Mahmud (Ören), que se tornou um trabalhador emigrado na Alemanha. Ela tem um casamento arranjado com outro homem, mas acaba fugindo e improvisadamente indo morar na Alemanha. Inicialmente trabalhando em uma fábrica e morando numa pensão para mulheres, Shirin é demitida quando a produção entra em queda. Ela vai morar com a família grega que lhe deu suporte e arranja um emprego como faxineira. Vem a ser estuprada pelo dono de um dos apartamentos onde faz faxina. Com a família grega tendo voltado ao país de origem, Shirin se vê sem emprego ou apoio e se prostitui para o cafetão Ainda (Prochnow), com mais duas outras mulheres. Ela serve a um grupo de homens em uma pensão masculina. Um deles é ninguém menos que o próprio Mahmud, que mal a reconhece. Testemunhando um assassinato e cansada de tanto sofrimento, Shirin decide retornar à Turquia, quando ela própria é assassinada por um dos cafetões que a contratara.
Aproximando-se da experiência de uma gastarbeiter, emigrante em emprego (sic) temporário a partir de sua própria visão e não a partir de como é observado (a) pelos alemães (como é o caso de filmes de Fassbinder como O Machão  ou O Medo Devora a Alma), esse filme de Sanders-Brahms, faz uso de foto fixa, ao início, agregada a uma leitura quase documental do universo que apresenta, filtrado sobretudo pelo olhar de sua protagonista assim como de uma constante voz over (que, a exemplo do filme mais célebre da realizadora, Alemanha, Mãe Pálida, é também efetuado por ela própria) tornado menos recorrente com o avançar da trama. Sanders-Brahms evidencia a rápida passagem de sonho a pesadelo de sua protagonista, cuja visão de alguns dos encantos da Alemanha, como uma catedral gótica, não será mais que entrevisto a partir da janela de um trem e – principalmente – cujo movimento no sentido de se aproximar da beleza feminina e da cultura ocidental, a partir do momento em que não apenas se desfaz do véu muçulmano como torna louras suas madeixas, seguindo uma modelo que observa numa revista, acaba lhe trazendo menos sucesso que antecipando sua própria decadência, estupro, prostituição e morte. É marcado o recorte feminista da realizadora, pois a exploração sofrida por Shirin também possui um forte viés de gênero, sendo que a insensibilidade e brutalidade masculina, que vai do descobrir o seu véu no trabalho ao próprio estupro e que teria sua personificação feminina na faxineira da pousada onde Shirin vai morar, é abrandada, a partir do momento em que a faxineira, condoída com a demissão em massa do grupo das companheiras de Shirin, e dessa própria, aproxima-se do grupo e por um momento se despe da postura autoritária, que logo voltará a encarnar, desfeito o encontro. Também é através da solidariedade de outras mulheres, da desconhecida que paga sua passagem no ônibus quando foge da Turquia à mãe da família grega que a acarinha nos momentos de sofrimento, que ela consegue algum alento. Como em seu filme mais conhecido, a postura demasiado vitimizada de sua protagonista, algo que Fassbinder soube equilibrar melhor ao transformar suas vítimas em também algozes, pode criar um processo de identificação mais fácil com suas personagens e, para além dele, com as situações sociais e/ou históricas mais amplas vivenciadas por eles, como também provocar certo “didatismo” que, somado a um enfrquecimento da postura documental inicial e maior enbrenhamento em situações mais próximas das encontradas em filmes, inclusive não autorais, que abordam temáticas semelhantes, perder algo de seu ímpeto inicial. Aliás, por mais que elementos recorrentes possam ser observados em outras produções da realizadora, como é o caso de se observar uma trajetória feminina em que a perda da dignidade ocorre a partir, sobretudo, de uma sociedade norteada por valores masculinos dominantes, incluindo tanto aqui como em seu filme de 1980, o estupro, deve-se igualmente observar o quanto eles também são  encenados a partir  dos momentos distintos em que a produção associada ao Novo Cinema Alemão se encontra. Ou seja, aqui, com todas as limitações impostas pelo orçamento apertado e inclusive com fotografia em p&b, que também trazem consigo algo que torna essa produção deveras digna de interesse e em Alemanha, Mãe Pálida,  contando já com valores de produção bem mais típicos desse momento – algo que pode ser percebido, igualmente em produções de outros realizadores vinculados ao movimento como Fassbinder, Herzog, Schlöndorff ou Wenders. WDR. 120 minutos.

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