Filme do Dia: Bamako (2006), Abderrahmane Sissako
Bamako (Mali/EUA/França,
2006). Direção e Rot. Original: Abderrahmane Sissako. Fotografia: Jacques
Besse. Montagem: Nadia Ben Rachid & Pauline Casalis. Dir. de arte:
Mahamadou. Figurinos: Maji-da Abdi. Com: Aïssa Maïga, Tiécoura Traoré, Maimouna
Hélène Diarra, Habib Dembélé, Djénéba Koner, Hamadoun Kassogué, Mamadou
Kanouté, William Bourdon, Gabriel Magma Konate.
Melé (Maïga) é uma
cantora da noite. Seu marido, Chaka (Traoré), encontra-se desempregado e
suspeito de furto em uma indústria na qual trabalhou. No terreno da residência
que o casal divide com outras famílias, inclusive um senhor em estado grave de
enfermidade, desenrola-se um julgamento em que a sociedade civil se posiciona
contrária ao Banco Mundial e ao Fundo Monetário Internacional, a quem acusam de
principais responsáveis pela miséria atual vivenciada no país.
Sissako, um dos poucos
realizadores de carreira continuada no cinema africano, tal como Sembene, busca
uma forma apropriada a cada projeto seu. Do lirismo excêntrico do curta de
início de carreira Outubro ao
realismo de Timbuktu. Aqui audaciosamente aposta numa chave em que o drama
mais convencional e peculiar vivenciado pelo jovem casal e sua filha é, ao
mesmo tempo, uma ilustração do que se encontra em discussão no tribunal
improvisado e igualmente obscurecido pelo mesmo, tornando-se improvável o
envolvimento emocional mesmo quando Melé chora ao cantar próximo do final. Sem
dúvida, o maior feito do filme é representar seu tribunal, em um ajuste de
contas cuja motivação maior é a dignidade e o sofrimento de um povo, distante
do espaço impessoal das cortes, em meio ao cotidiano das pessoas, que
escutam-no muitas vezes sem esboçar qualquer reação ou que simplesmente o
ignoram e continuam a vivenciar seu cotidiano – sendo o exemplo mais óbvio disso
a própria Melé, a cotidianamente pedir para que amarrem o laço de seu vestido
antes de sair. Se no terreno impessoal do épico, representado pelas falas do
julgamento, o filme consegue alguns momentos tocantes, como quando um homem
interrompe o próprio, com seu canto de desabafo em bambara, o filme falha ao
não ser igualmente criativo seja quando aborda o drama familiar – as cenas
cotidianas ao redor e os fragmentos de situações e personagens do qual pouco
sabemos sendo mais provocadores – ou quando até mesmo enfatiza o eurocentrismo
em um faroeste de tv (com o próprio diretor, o ativista e ator norte-americano,
produtor-executivo dessa produção Danny Glover e o realizador Elia Suleiman
como atores) que evoca sagazmente o consumo de um entretenimento que os faz rir
de seu próprio martírio e opressão, mas que não consegue minimamente parecer
crível; talvez nem mesmo dentro da lógica do escanteamento ou negociação
criativa com o real que o julgamento provoca. Enquanto expressão épica dos
conflitos de um povo, inclusive com perspectiva histórica bem mais abrangente, Ceddo é de longe mas interessante. E,
no plano dramático mais convencional, com um momento em que uma personagem
transforma um comício político populista em tribuna moral, Guelwaar idem. Archipel 33/Chinguitty Films/Mali Images/Arte France
Cinéma para Les Films du Losange. 115 minutos.
Comentários
Postar um comentário