The Film Handbook#171: Ingmar Bergman

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Ingmar Bergman
Nascimento: 14/07/1918, Uppsala, Suécia
Morte: 30/07/2007, Farö, Gotlands Iän, Suécia
Carreira: 1945-1982

O status de Ernst Ingmar Bergman como mestre do cinema deriva menos de seus filmes individuais que da totalidade de um estilo distintivo e preocupações constantes. Poucos diretores conseguiram repetidamente dar voz a tal visão profundamente pessoal do sofrimento e solidão humanas.

Filho de um pastor luterano, Bergman se tornou primeiro reconhecido enquanto diretor de teatro, meio no qual nunca cessou de trabalhar. Após escrever o impressionantemente cruel Tortura do Desejo/Hets de Alf Sjöberg, em 1945 realizaria sua própria estreia em longa-metragem com Crise/Kris. Seus primeiros filmes foram investigações taciturnas e quase realistas das relações entre homens e mulheres, frequentemente prejudicadas por um contraste demasiado simplista de juventude inocente e corrupção adulta. Não obstante, pela época que realizou Monika e o Desejo/Sommaren med Monika >1 e Noites de Circo/Gycklarnas Afton>2 (ambos estudos agridoces de breves e condenados romances juvenis), o segundo fazendo uso de um miserável circo mambembe para simbolizar a capacidade humana para a crueldade, má fé e humilhação, sua inventividade fértil, pessimismo sombrio e sensível direção de atores estavam já bem estabelecidas.

Seu primeiro sucesso internacional foi Sorrisos de uma Noite de Amor/Sommarnattens Leende>3. Este elegante e sofisticado drama de costumes sobre diversificadas intrigas amorosas em uma festa prolongada fin-de-siécle revelou o cômico senso de ironia de Bergman, mas O Sétimo Selo/Det Sjunde Inseglet>4 foi mais tipicamente sombrio. Uma alegoria medieval no qual um cavaleiro returna das Cruzadas para enfrentar a Morte em um jogo simbólico de xadrez, o filme evoca um mundo  de sofrimentos assolado pela peste e do qual Deus é certamente ausente. Menos controverso e bem mais amável foi Morangos Silvestres/Smultronstället>5. Aqui, um velho professor, comoventemente interpretado pelo veterano diretor Victor Sjöström viaja através do país para receber um prêmio, visitando os fantasmas de sua juventude, e reconhece tardiamente a esterilidade árida e solidão de sua existência. Nem toda a obra de Bergman, no entanto, é desgraça e melancolia; em O Rosto/Ansiktet>6, por exemplo, humor macabro e horror gótico criam um retrato emocionante e engenhoso do artista enquanto charlatão.

O estilo maduro de Bergman surgiu em uma trilogia sobre a fé que indaga se Deus pode existir se o sofrimento e a maldade são inevitáveis recorrências na vida humana. Em Através de um Espelho/Sason i en Spegel, a loucura de uma jovem mulher a leva a acreditar na imagem de Deus enquanto uma obscena aranha; em Luz de Inverno/Nattvardsgästerna>7 um pastor em dúvida, diante da doença da amante e da ameaça da Bomba, passar a achar o ritual de suas orações crescentemente sem sentido; em O Silêncio/Tystnaden>8, duas irmãs abandonadas em uma cidade estrangeira, destroçada pela guerra, rendem-se, respectivamente, a uma desesperada promiscuidade e a morte solitária.

No início dos anos 60,o estilo visual e narrativo de Bergman se torna ainda mais austero ao focar em almas atormentadas buscando orientação e conforto de um céu vazio, encaminhando-se para a penetrante incursão em extremos primeiros planos no enigmático Persona>9. Uma obra-prima modernista, o filme iniciaria uma trilogia da introspecção sobre as torres de marfins construídas pelos artistas para se defenderem do horror da existência. Trata-se da primeira obra de Bergman completamente inovadora, reconhecendo-se a si própria enquanto artifício através de inserções regulares de imagens não narrativas, tais como projetores em pane, filmes se rompendo, recortes de filmes mudos. Persona descreve uma relação vampiresca entre uma falante enfermeira e uma atriz que se recusa a falar após a traumática compreensão da futilidade da criação em um mundo sem amor, envolvido em guerra. Psicologia, filosofia e comentário social são mesclados com brilhante efeito em uma interrogação complexa e lúcida tanto da ilusão fílmica quanto da vida moderna.
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Bibi Andersson e Liv Ulmann presas em um relacionamento tenso e vampiresco em Persona de Bergman

Após se encaminhar para os problemas da dúvida artística e sofrimento em A Hora do Lobo/Vergtimmen e Vergonha/Skammen, Bergman uma vez mais focou nos simples relacionamentos humanos em A Paixão de Ana/En Passion, A Hora do Amor/The Touch e, mais frutiferamente, Gritos e Sussurros/Viskningar och Rop>10. Ambientado em uma mansão no campo, grandemente silenciosa com exceção do tique-taquear dos relógios, o filme examina o efeito de uma lenta e dolorosa morte de uma mulher sobre suas duas irmãs. Passado e presente, fantasia e realidade são interconectados sem distinção para traçar, com clareza anti-sentimental, o modo como os seres humanos inevitavelmente protegem a si próprios contra a certeza de sua própria mortalidade.

Tendo lidado, em grande medida, com as ansiedades resultantes de relacionamentos fracassados em duas séries televisivas (Cenas de um Casamento/Scener ur Ett Äktenskap e Face a Face/Anskite mot Anskite), a carreira de Bergman finalmente vacilou. Uma batalha com o governo sueco sobre impostos o levou temporariamente ao exílio e O Ovo da Serpente/The Serpent's Egg, realizado em Munique, foi uma controvertida história sobre as raízes do Nazismo, enquanto que a insípida análise do relacionamento emocionalmente carregado entre mãe e filha em Sonata de Outono/Höstsonatten, talvez tenha sido notável somente pela presença de Ingrid Bergman. Porém um suntuoso drama de uma saga familiar, Fanny & Alexander>11 foi visto por muitos como um retorno à forma: tanto autobiográfico quanto engenhosa auto-crítica que explicitamente retrabalha temas e cenas de sua obra anterior foi, apesar de sua ocasional longevidade, um apropriado final para uma carreira notável e prolífica no cinema. Ele se aposentaria como realizador em 1982.

Tanto temática quanto estilisticamente, o corpo da obra de Bergman é incomumente coerente, em parte devido ao seu recorrente uso de Gunnar Fischer e Sven Nikvist, dois excelentes diretores de fotografia e uma família de atores muito unida dentre os quais Bibi Andersson, Liv Ulmann, Ingrid Thulin, Harriet Andersson, Max Von Sydow e Gunnar Björnstrand são os mais memoráveis. De fato, não fosse pelo intenso poder e naturalismo extraído de seus intérpretes, as narrativas angustiadamente pessoais de dúvida, sofrimento e solidão de Bergman poderiam nunca ter conquistado um público internacional tão amplo. Por fim, ainda que ele possa ser criticado por um pessimismo ocasionalmente frio e destituído de humor, tanto sua seriedade intelectual quanto sua descompromissada devoção ao cinema enquanto uma forma de arte séria são inegáveis.

Cronologia

Bergman é parte de uma tradição escandinava que remonta, através de Sjöberg e Dreyer, assim como Sjöström e Mauritz Stiller; a influência do Expressionismo e dos filmes de horror , para não dizer de Mozart, Strindberg e Ibsen, também pode ser discernida. Ele tem encorajado poucos verdadeiros imitadores, apesar de diretores tão variados quanto Woody Allen, Truffaut e Tarkovski terem expresso sua admiração. 

Destaques
1. Monika e o Desejo, Suécia, 1952 c/Harriet Andersson, Lars Ekborg, John Harryson

2. Noites de Circo, Suécia, 1953 c/Harriet Andersson, Anders Ek, Hasse Ekman

3. Sorrisos de uma Noite de Amor, Suécia, 1955 c/Eva Dahlbeck, Ulla Jacobssson, Jarl Kulle

4. O Sétimo Selo, Suécia, 1957 c/Max Von Sidow, Gunnar Björnstrand, Bengt Ekerot

5. Morangos Silvestres, Suécia, 1957 c/Victor Sjöström, Bibi Andersson, Ingrid Thulin

6. O Rosto, Suécia, 1958 c/Max Von Sidow, Ingrid Thulin, Gunnar Björnstrand

7. Luz de Inverno, Suécia, 1963 c/Gunnar Björnstrand, Ingrid Thulin, Max Von Sydow

8. O Silêncio, Suécia, 1963 c/Ingrid Thulin, Gunnel Lindblom, Jörgen Lindström

9. Persona, Suécia, 1966 c/Bibi Andersson, Liv Ulmann

10. Gritos e Sussurros, Suécia, 1972, c/Liv Ulmann, Ingrid Thulin, Harriet Andersson

11. Fanny & Alexander, Suécia, 1982 c/Bertil Guve, Ewa Fröhling, Erland Josephson

Texto: Andrew, Geoff. The Film Handbook. Londres: Longman, 1989, pp. 22-4.

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