Filme do Dia: O Destino (1997), Youssef Chahine


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O Destino (Al Massir, Egito/França, 1997). Direção: Youssef Chahine. Rot. Original: Youssef Chahine & Khaled Youssef. Fotografia: Mohsen Nasr. Música: Yehia El Mougy & Kamal El Tawil. Montagem: Rashida Abdel Salam. Dir. de arte: Hamed Hemdan. Figurinos: Nahed Nasrallah. Com: Nour El-Sherif, Laila Eloui, Mahmoud Emida, Safia El Emari, Khaled El Nabaoui, Abdalla Mahmoud, Mohamed Mounir, Magdi Idris, Ahmed Fouad Selim.
              No século XII, em Córdoba, o filósofo Averroes (El-Sherif), conhecido por pregar uma leitura aberta do livro máximo islâmico, o Corão, passa ser boicotado pelo Califa Al-Mansour (Hemida), que pretende manipular mais facilmente as massas para o conflito contra os espanhóis, com sua leitura cega e literal do mesmo. Porém, o Califa se decepciona com as atitudes dos próprios filhos, a quem nunca deu muita atenção. Enquanto Abdalla (Salama) só pensa em dançar e se divertir, tornando-se posteriormente um fanático religioso, o outro se torna um discípulo fiel de Averroes, fazendo parte de uma cruzada para preservar os livros do mestre no Egito, quando esses são banidos de Córdoba. O acirramento do radicalismo provoca a morte de Nasser (Nabaoui), por parte dos companheiros de seita de Abdalla. Mesmo tendo sido o pivô do crime, Abdalla não é rejeitado pelo irmão e pela viúva de Nasser. Enquanto Averroès parte de Córdoba, o Califa Al-Mansour consegue contornar a falta de espírito belicoso do Xeique Riad (Selim) e, reconciliado com os filhos, preparar a população para o ataque. Averroès comemora, de modo irônico, o reconhecimento de que seus livros foram salvos.
              Embora superficialmente possa ser apreciado como um filme histórico no sentido clássico da tradição cinematográfica do gênero, aqui menos interessa uma produção majestosa e cenários grandiosos que uma reflexão sobre o obscurantismo político-religioso em sua batalha contra um pensamento que rejeita os dogmatismos e faz da reflexão a ponte mais confiável para uma vida mais digna. Nesse sentido, o filme apresenta uma comovente ode à filosofia e à arte – através da música e dança – como diferentes formas de resistência à lógica totalitária. Em uma bela seqüência demonstra que a música torna vacilante o antes sectário Abdalla, atormentado perante o próprio desejo de voltar a dançar, prática condenada pelos fundamentalistas. Enquanto soberano, o Califa, mesmo possuindo alguma simpatia por Averroès expressa seu absolutismo de forma explícita quando enfrenta o irmão, defensor do filósofo, afirmando ser ele próprio a Andaluzia e não admitindo qualquer competição, mesmo que no plano das idéias. Porém, o filme demonstra, com certo otimismo humanista um tanto quanto ausente do cinema contemporâneo, que não é tão fácil sufocar o pensamento. Além da bela epígrafe final, que afirma que o pensamento possui asas e ninguém pode segurar seu vôo, a equiparação entre a morte na fogueira de um homem que ousara traduzir Averroès, no século XVIII, no prólogo e os livros sendo queimados ao final soam como uma prova desse otimismo, que observa a persistência das idéias, apesar de todos os obstáculos, numa celebração da vida diante, inclusive, da própria morte. A narrativa cede espaço para alguns belos e extravagantes números musicais, prática comum no cinema árabe, demonstrando um raro tino do cineasta de mesclar análise política (sua intenção latente de refletir sobre a própria presença do obscurantismo e da intolerância no mundo contemporâneo), filosófica (a oposição entre racionalismo e fundamentalismo) e drama popular. No plano estético o domínio de uma iluminação apurada e do posicionamento da câmera reforçam o impacto dessa mescla entre fantasia poética e abordagem histórica. Prêmio Especial do Júri no Festival de Cannes. France 2 Cinéma/MISR International/Ognon Pictures. 135 minutos.


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