Filme do Dia: Elizabeth (1998), Shekhar Kapur
Elizabeth (Elizabeth, Reino
Unido, 1998). Direção: Shekhar Kapur. Rot. Original: Michael Hirst. Fotografia: Remi Adefarasin. Música: David Hirschfelder. Montagem: Jill
Bilcock. Dir. de arte: John Myhre & Lucy Richardson. Cenografia: Peter Howitt.
Figurinos: Alexandra Byrne. Com: Cate Blanchett, Geoffrey Rush, Joseph Fiennes, Richard Attenborough, Christopher Eccleston, Jamie Foreman, Edward Hardwicke, James Frain, Emily Mortimer, Kelly MacDonald, Kathy Burke, Fanny Ardant,
Vincent Cassel, Daniel
Craig, John Gielgud, Jean-Pierre Léaud.
A princesa Elizabeth (Blanchett), passa a ser o centro das atenções da corte
inglesa do século XVII sob a eminente morte da irmã, a atual rainha Mary Tudor
(Burke). Porém sua ascensão ao trono representa uma séria querela
diplomática-política, já que ela é protestante, e a maioria da Inglaterra,
segue a rainha de orientação católica. Presa, ela teme a morte, embora as
palavras de despedida do seu amado Robert (Fiennes) lhe encorajem, no sentido
de que não deve esquecer suas origens e se deixar humilhar, como filha de
Henrique VIII e Ana Bolena. Mas o encontro com a irmã se não lhe resulta em
sentença de morte, também não tem como resultado o oposto, sua coroação de
livre e espontâneo desejo da rainha moribunda. Com a morte da rainha,
Elizabeth, insegura e tímida, vê-se como uma das pessoas mais poderosas da face
da terra de um momento para outro. Sem saber o que decidir sobre revidar ou não
a eminente invasão das tropas francesas baseadas na Escócia, sob o comando de
Marie de Guise (Ardant), ela escuta seus conselheiros. A maioria se prova a
favor, inclusive seu conselheiro-mor, Sir William Cecil (Attenbourough) e o
influente e autoritário Duque de Norfolk (Eccleston), embora o astuto Sir
Francis Walsingham (Rush), mantenha-se contrário. Ela cede e o resultado é
desastroso. No dia da coroação, no entanto, ela se impõe, retrucando todo que
lhe opõem, e fazendo aprovar tudo que deseja, inclusive a unificação da igreja
sob a égide protestante e sua própria continuidade como rainha, por uma
diferença de 5 votos - sendo que os ferinos bispos católicos se encontravam
devidamente aprisionados nesse momento, por ordens de Sir Walsingham. Quando
sabe dos resultados, o Papa (Guielgud), amaldiçoa Elizabeth e posteriormente
prega a morte dela. Os rumores sobre quem será o pretendente que Elizabeth escolherá
para tornar-se rei ganham dimensões de
estratégica importância política. As apostas se dividem entre a França e a
Espanha, embora no coração da rainha só exista espaço para o seu anterior bem
amado e com quem vive uma aberta relação, lorde Robert. Ela vai pessoalmente a
frente de batalha e se indigna com o morticínio de crianças, comandada pelos
bispos católicos. Pressionada para casar-se com o Duque de Anjou (Cassel), para
que seja selada uma aliança com a França que dê fim ao morticínio, Elizabeth,
anti-militarista, aceita conhecê-lo, provocando a revolta de Robert. Porém nos
dias e noites que o acolhe em sua corte, consegue sobreviver a um atentado e dá
provas de que seu interesse mesmo é no atual amante, desclassificando qualquer
intenção de casar-se com Anjou, ao surpreendê-lo em meio a uma bacanal,
travestido de mulher. Aparentemente tramando contra sua própria rainha, Sir
Walsingham sucumbe ao canto de sereia de Marie de Guise, que, sabedora
de sua influência e inteligência, indaga
sedutoramente se ele pretende manter relações mais próximas com a Espanha ou a
França, e ele a mata em seu leito. Elizabeth, no entanto, rompe publicamente com
Lord Robert, afirmando que pretende governar sozinha, sem a necessidade da
presença masculina. Lord Robert, humilhado e sob a influência cada vez maior do
representante espanhol Alvaro de la Quadra (Frain), sugere que Elizabeth
case-se com o monarca espanhol apenas formalmente, para que seus reinos sejam
unidos, embora cada um continue a viver em seu país. Ela descarta a sugestão,
ao mesmo tempo que segue os conselhos de Walsingham de provocar uma verdadeira
caça às bruxas na corte, no intuito de assegurar sua estabilidade. Uma onda de
assassinatos e prisões contra seus opositores culmina com a aposentadoria
forçada de Sir William Cecil e a prisão e morte de seu maior rival, o Duque de
Norfolk. Sem rivais à altura e completamente investida da autoridade e poder de
representar a Inglaterra, Elizabeth se desliga de qualquer outro sentido na
vida que não seja o de ser a rainha de seu povo, não mais reatando a relação
com Lord Robert - a quem salvará do morticínio, embora faça questão de
reconhecer que foi o perigo que conviveu mais próximo de si - ou qualquer outro homem que seja.
Segue todas as fórmulas das grandes produções de época,
com elenco estelar, esmerada direção de arte, fotografia e figurinos, uma trama
histórica com toques de intrigas palacianas e carnificina shakesperiana - como
em Rainha Margot - e uma trilha
sonora dramática e pomposa. Além de esmeradamente acadêmico, o filme
logicamente também pretende se ajustar ao seu tempo, apresentando uma Elizabeth
proto-tipicamente moderna e independente, que se identifica - e,
consequentemente, cria um forte elo de identificação com o espectador - com
tudo o que hoje consideramos de bom senso, como o anti-militarismo e a
autonomia feminina. Aliás a identificação com Elizabeth como a iluminada não
necessita de grande esforço quando pensamos em suas caricatas contrapartes,
seja a imunda, feia e burra irmã que
governava anteriormente, a falta de escrúpulos da Igreja Católica na figura do
Papa ou a ridícula prepotência de Anjou.
Enquanto na forma o único momento em que se pretende fazer o mesmo, ou
seja, ajustar o filme a seu tempo, não vai além de uma patética seqüência em
que uma ansiosa Elizabeth procura decorar sem sucesso seu discurso como futura
rainha e cada tentativa representa um take e um corte abrupto, como nos mais
banais videoclipes, making-offs e
entrevistas televisivas. Também deixa nas entrelinhas - nem tanto entrelinhas
assim, já que o filme nada tem de propriamente sutil - a possibilidade de se
pensar o poder como um prazer que, quando sorvido e assumido em toda sua
extensão, não deixa o menor espaço para qualquer outra dimensão humana,
inclusive a da própria sexualidade. Ou, por outra perspectiva, sobre um cariz de viés feminista, que uma mulher ousada, de personalidade forte e independente não necessariamente precisa de uma presença masculina a seu lado para obter segurança ou reconhecimento público. Working Title Films/ Channel Four
Films/ PolyGram Filmed Entertainment.
121 minutos.
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