Filme do Dia: Deus é Brasileiro (2003), Cacá Diegues
Deus é Brasileiro
(Brasil, 2003). Direção: Cacá Diegues. Rot. Adaptado: João Ubaldo Ribeiro, João
Emanuel Carneiro & Renata de Almeida Magalhães, baseado em contos de Ubaldo
Ribeiro. Fotografia: Affonso Beato. Música: Chico Neves, Hermano Viana &
Sérgio Mekler. Montagem: Sérgio Mekler. Dir. de arte: Fernando Zagallo, Edu
Ramos & Vera Hambúrguer. Com: Antônio Fagundes, Wagner Moura, Paula Duarte,
Stepan Nercessian, Hugo Carvana, Bruce Gomlewsky, Castrinho, Chico de Assis,
Susana Werner, Toni Garrido.
Num dia de pesca fraca e fugindo da
cobrança de Baudelaire (Nercessian), o simplório malandro Taoca (Moura) encontra
Deus (Fagundes), que o leva para uma pequena odisséia em busca de um homem que
pretende transformar em santo, para que possa descansar durante um tempo.
Junta-se ao grupo a jovem Madá (Duarte). Viajando, primeiro de ônibus, depois
caminhando, eles são testemunhas de um casamento e com os dons de Salvador,
como Taoca passa a chamar o Inominável, procuram o candidato a santo em favelas
dos manguezais do Recife, angariam dinheiro com números de magia que fazem com
que Madá flutue e ele retire uma palmeira da cartola. Madá é dispensada por
Deus ao buscar indícios da mãe morta. Após finalmente encontrarem o homem que
Deus pretende transformar em santo, junto aos índios, nem as poderosas
demonstrações divinas, como a passagem acelerada do tempo, conseguem motivar o
incréu, que permanece ateu. Retirando-se decepcionado com Taoca, eles reencontram
Madá que vai com uma caravana de prostitutas para um minério, sob o comando de
Baudelaire. Eles roubam o veículo e são surpreendidos, em uma canoa, por
Baudelaire que atira contra eles. Aparentemente mortalmente ferida, Madá escapa graças a sua medalha, enquanto
Deus os abandona ao seu amor.
Essa bela fábula que, partindo de
contos diversos de Ubaldo Ribeiro, mescla elementos populares e influências
bíblicas com humor engenhoso, ao mesmo tempo que apresenta boa parte do Brasil
contemporâneo, da miséria dos indígenas às músicas que são sucesso nos rádios,
é um retorno a forma de um dos mais celebrados cineastas do Cinema Novo, após
diversas produções destituídas de brilho. Curiosamente, justamente quando volta
a tematizar o Brasil, tema que orientou alguns de seus mais significativos
trabalhos como Bye Bye Brasil e Os Herdeiros. Seu tratamento visual
com fotografia exuberante e efeitos especiais torna-se particularmente feliz ao
expressar uma dimensão de encantamento presente na narrativa, sem cair nos
clichês do realismo fantástico tipo exportação. Comovente em vários momentos e
com uma graça semelhante à própria arte popular, que influenciou sua origem
literária, afasta-se do hermético e aproxima-se, nesse quesito, de outra
adaptação literária recente de igual apelo popular, O Auto da Compadecida.
Há um certo momento, Diegues brinca com a relação entre o diegético e o
extra-diegético – Taoca pede para que Deus baixe a trilha sonora de uma
seqüência – de forma semelhante a que Godard fizera em O Demônio das Onze
Horas.Aliás, na trilha sonora, Diegues volta a utilizar-se de Villa-Lobos,
igualmente presente na trilha e nos momentos finais de Os Herdeiros.Filmado
nos estados de Alagoas, Pernambuco, Tocantins e Rio de Janeiro. Rio Vermelho Filmes/Globo Filmes/Columbia
Tri Star Filmes do Brasil/Luz Mágica Produções/Teleimage. 110 minutos.
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