Filme do Dia: Zero em Conduta (1933), Jean Vigo


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Zero em Conduta (Zéro de Conduite, França, 1933) Direção, roteiro e montagem: Jean Vigo. Música: Maurice Jaubert. Com: Louis Lefévre, Gilbert Pluchon, Gérard  de Bédarieux, Constantin Goldenstein-Kehler, Jean Dasté, Robert Le Flon, Delphin, Du Verron.
Colin (Pluchon), Caussat (Lefévre) e Bruel (Goldstein-Kehler) voltam de trem às aulas no internato em que estudam. Enquanto se divertem, inventando várias brincadeiras, subitamente o companheiro de cabine cai morto no chão. Quando chegam a estação e relatam o fato, ele aparece e se apresenta como sendo o novo professor da escola, Huguet (Dasté). Ainda na estação, surge um novo aluno, Tabard (Bédarieux), a quem sua mãe pede desculpas por se encontrar adoentado e que só irá para a escola no dia seguinte. Dormitório dos alunos. Silêncio completo. No centro do dormitório, um cubículo, com uma tenda armada onde dorme o supervisor conhecido pelos jovens como Dry-Fart (Le Flon). Logo, no entanto, ruídos imitando animais ressoam e Dry-Fart chama um dos alunos para repreendê-lo, mas quem vai é o trio Caussart-Bruel-Colin. Quando Dry-Fart toma conhecimento do engodo, exige que eles fiquem de pé até as 11 horas pela brincadeira. No meio do castigo Colin reclama de uma súbita dor de barriga e, mesmo sem a permissão de Dry-Fart - que provavelmente dorme - vai ao banheiro, enquanto Caussat e Bruel são dispensados para à cama. Após as tentativas frustradas de Dry-Fart de acordá-los na manhã seguinte, quando o supervisor-chefe - conhecido pelos garotos como Gas-Snout - realiza a vistoria da manhã, todos os garotos instantaneamente ficam em pé sobre suas camas. Ao fechar a porta, reabre-a e como percebe que eles haviam voltado a deitar, castiga o trio. Como já sabem que se encontrarão de castigo no domingo, o trio começa a planejar as peripécias que realizarão, durante o intervalo da aula, no pátio. Quando um dos supervisores se aproxima, Huguet acoberta a ação dos rapazes. Enquanto isso, crianças se divertem troçando com as outras que se encontram no banheiro. Dry-Fart surpreende, na aula de Huguet, a anarquia generalizada: crianças fumando, plantando bananeira e o próprio Huguet é surpreendido por Dry-Fart, no momento em que desenha-o, se apoiando sobre sua própria cabeça. O diretor (Delphin), sujeitinho bizarro com sua baixa estatura, barba longa, cartola e fraque, adverte para Gas-Snout sobre a perigosa amizade que se criou entre Bruel e Tabard e a postura de Huguet. Enquanto isso, ocorre uma excursão comandada por Huguet, que imita Chaplin, para a diversão das crianças, e provoca o assédio coletivo - e a correria - de uma jovem e bela mulher - que finda com a chuva. À entrada do colégio, o Diretor e Gas Snout observam a chegada primeiro de Huguet e só depois dos alunos - com a dupla Tabard e Bruel chegando sozinhos no final. O diretor chama Tabard para lhe advertir sobre os perigos da amizade em tal idade, perdendo completamente a razão no final. Quando retorna a sala de aula, Tabard senta-se afastado de Bruel, apesar desse chamá-lo para sentar ao seu lado. No refeitório, a demonstração de raiva contra o eterno feijão no almoço provoca uma revolta contra a cozinheira (Mme.Emilie), com comida voando para todas as direções, além de um Colin inconsolável - a cozinheira é sua mãe. Quando consideram sob a inclusão ou não de Tabard em seu planos, Caussat adverte Colin que este é um efeminado. Na aula de química, Tabard refuta o gesto de simpatia do professor de química (Larive). Uma verdadeira comissão, contando com professores, Gas Snout, Dry Fart e o Diretor vai até a sala, onde o Diretor afirma que graças a amizade que o une ao pai de Tabard, este se encontra perdoado, tendo como réplica seu habitual: “vá à merda”. Início de uma revolta no dormitório à noite, comandada por Tabard, que termina com uma guerra de travesseiros. Manhã seguinte. A continuação da revolta do dia anterior. Dry-Fart é amarrado em sua cama, que é posta na vertical. No topo do telhado, Colin, Tabard, Caussat e Bruel começam a jogar toda sorte de quinquilharias sobre o prefeito e ilustres visitantes que lá se encontram, sendo saudados por Huguet. Caminhando e cantando telhado acima, eles parecem se dirigir ao céu.
Filme-chave para a cinematografia francesa e mundial, é um exemplo típico de modernismo avant la screen, tanto em termos de forma, quanto de conteúdo. Seja na utilização virtuosa do speed e slow motion (na belíssima seqüência da batalha de travesseiros em que a poética composição que une o verdadeiro balé gestual dos corpos dos garotos em luta e as penas escorrendo, destaca-se o inusitado e acrobático pulo de um garoto em câmera lenta, que deixa descoberto seu pênis); câmera baixa; movimentos virtuosos da câmera - com destaque especial para a cena em que todo o alto escalão da escola vai advertir Tabard e a câmera passeia sem se deter pela sala; e, principalmente, utilização da citação - a Chaplin - recurso literário praticamente desconhecido pelo cinema até então e experimentações com o som - gravações utilizadas de trás para diante que intervêm juntamente com a alteração do movimento, que criam o clima onírico do final da batalha dos travesseiros. Mescla de momentos de realismo - a preocupação com a vistoria do superior-chefe - com pura magia (a seqüência delirante da revolta dos travesseiros e da “crucificação” de Dry-Fart; as brincadeiras de Bruel e Caussat no trem; a brusca irrupção do inesperado, seja Huguet que cai “morto” ou a caricatura que este fizera de Gas-Snout, que ganha vida através de animação; a súbita dor de barriga de Colin; as cores fantásticas que redimensionam o que seria o discurso realista do Diretor para Tabard, como que sendo filtrado pela subjetividade do último). Moderno também em sua rara apresentação positiva da amizade entre o mesmo sexo - evocado como chacota ou simplesmente banido dos filmes da época, como na adaptação a partir da peça de Lilian Hellman de A Revolta do Colégio (1936) de Wyler, onde o amor lésbico ambientado em um internato feminino transforma-se em um tradicional triângulo amoroso. Também positivo na sua rejeição a hierarquia e aos conselhos dos adultos (leia-se superiores): no mesmo instante em que o Diretor adverte sobre o perigo de amizades como a de Tabard e Bruel, a montagem alternada apresenta os dois novamente juntos; por outro lado é implacável com o enrijecimento e a limitação das práticas do mundo dos adultos. Também ao sexo, e ao corpo em geral, é permitido uma associação mais positiva e menos sublimada com o prazer - a apresentação do pênis do jovem no momento de catarse hedonista e anti-repressiva. O Caráter anárquico e inovador do filme - sempre cúmplice do libertarismo dos garotos que contam com um único aliado adulto, Huguet - dividiu as opiniões quando de seu lançamento, porém seu tom libertário não só antecipa em várias décadas o espírito de maio-68, como encontra guarida nos cineastas da Nouvelle Vague - em especial, o Truffaut de Os Incompreendidos (1958) e Jules e Jim (1961) - e ingleses como Richard LesterOs Reis do Iê-Iê-Iê (1964), Tony Richardson – A Solidão de uma Corrida sem Fim (1962) e Lindsay Anderson, que refilma-o como Se...(1968). Argui-Film. 44 minutos.


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