Filme do Dia: Mary Poppins (1964), Robert Stevenson
Mary Poppins (EUA,
1964). Direção: Robert Stevenson. Rot. Adaptado: Bill Walsh & Don DaGradi,
a partir dos livros Mary Poppins, de
P.L. Travers. Fotografia: Edward Colman. Música: Irwin Kostal. Montagem: Cotton
Warburton. Dir. de arte: Carroll Clark & William H. Tunkte. Cenografia: Hal
Gausman & Emile Kuri. Figurinos: Tony Walton. Com: Julie Andrews, Dick Van
Dyke, David Tomlinson, Karen Dotrice, Matthew Garber, Glynis Johns, Hermione
Baddeley, Reta Shaw, Elsa Lanchester, Reginald Owen, Jane Darwell, Ed Wynn.
Na Inglaterra da virada do século, na família Banks, mais uma babá pede as contas
por conta das travessuras dos garotos Jane (Dotrice) e Michael (Garber). Seu
pai, o pouco afetuoso e calculado banqueiro George (Tomlinson) culpa a mãe, a
sufragista Winnifred (Johns) por não ter se disposto com afinco na escolha e
promete ele mesmo cuidar do caso, pondo um anúncio no Times. Porém uma ventania dispersa todas as inumeráveis candidatas
e leva a carta escrita pelas crianças e rasgada por George para as mãos da
mágica e misteriosa Mary Poppins (Andrews), que chega voando como as outras se
foram. Poppins e o seu flerte Bert (Dyke), limpador de chaminés, levam as
crianças para um mundo de fantasia e encantamento. Influenciado por Poppins,
Michael se recusa a doar os dois pence ao dono do banco que George trabalha, provocando uma fuga de
capitais e a subsequente demissão de George. Esse, ao invés de ficar furioso,
adota o estilo de levar a vida de Poppins, tornando-se amigo e doce com todos,
inclusive suas crianças, recuperando também seu emprego. Quando observa que
tudo vai bem e que os ventos voltam a soprar, Mary Poppins parte da forma em
que chegou.
Esse que foi um dos musicais mais lembrados – e de melhor
bilheteria – da década, e que lançaria Andrews ao estrelato (reassegurado por A Noviça Rebelde, do ano seguinte),
sendo também sua estreia no cinema, investe mais no canto que na dança e parece
mais incongruente em sua junção algo atrapalhada entre o universo de fantasia
evocativo de O Mágico de Oz e uma
atualização que incorpora modestamente algo da dança moderna e de evocação
social mais próximo do então recente (e de longe mais bem sucedido) Amor, Sublime Amor, sobretudo na
sequência em que os limpadores de chaminé dançam nos céus, ou melhor, nos tetos
de Londres, a mais bem efetivada em termos de dança. Das canções, mais
insalubres que a profissão de Bert (vivido por um Dyke que sobreviveria a uma
distante “sequencia” dessa produção, O
Retorno de Mary Poppins, de 2018, ao ponto de nela atuar) pouco se pode
esperar. Para o público adulto, o que de fato conta são as suas piscadelas em
relação a situação feminina (a determinado momento, por exemplo, a Poppins de
Andrews afirma incisiva que não há nada a explicar para seu patrão; noutro a
feminista vanguardista Winnifred apresenta sua dupla faceta de mulher de ideais
independentes, sem deixar de ser a submissa e dócil esposa na frente do marido)
e, de uma forma mais convencionalmente codificada pela própria literatura
anterior ao momento em que se passa a história, ao materialismo, sob um viés
evocativo de Dickens, ou de um pastiche desse ao estilo Disney, demonstrando
que, como nos longas-metragens de animação a partir de então, atualizações
estavam sendo feitas em relação ao modelo da fantasia clássica, sem perder, em
última instância, a bússola da lógica
dos sentimentos a guiar as motivações dos personagens. Apesar disso, de sua
longevidade algo cansativa, de uma sexualidade muito pouco afirmada na relação
entre Mary e Bert, o filme consegue evitar soluções sentimentais convencionais
ao final, relativamente abrupto e sem despedidas chorosas (talvez como as
ironias subliminares o pouco que ficou do original de P.L. Travers, ao qual ela
tanto se bateu com Disney, situação apropriada anedoticamente igualmente pelo
cinema no fraco Walt nos Bastidores de Mary
Poppins, de 2013). E, como bônus, ainda existem momentos de interação entre
ação ao vivo e animação, os mais notáveis desde que Gene Kelly dançara com o
rato Jerry em Marujos do Amor, de
1945, por mais que tampouco soem grandemente orgânicos, mesmo com o charme da
sequencia em que pinguins-garçons atendem ao casal e as crianças, e que somente
teria outro marco com o cultuado Uma Cilada para Roger Rabbit (1988). Os atores mirins são longe de parcialmente
expressivos, sendo que Garber, que não seguiu carreira no cinema por muito
além, morreria aos 21 anos. Já Andrews consegue uma muito bem conseguida
máscara facial algo enigmática e
determinada a não ceder a sentimentalidade fácil, inclusive no próprio
final. Já o mesmo não pode ser dito de
seu contraparte, Van Dyke, que também faz uma ponta – com mais sucesso –
enquanto o ancião Sr. Dawes, com dificuldades com os degraus. Walt Disney Prod.
para Buena Vista Dist. Co. 139 minutos.
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