Diretoras de Cinema#15: Anja Breien

 


BREIEN, Anja (1940). Noruega. "Uma diretora mulher é automaticamente pensada como dominadora (...) dominação e poder tradicionalmente proporcionam ao homem sensualidade, mas destituem a mulher dela", Anja Breien falou em uma entrevista (Hoaas, p. 334). O comentário de Breien expõe o senso comum que desencoraja as mulheres de tomarem posições de poder. O melhor "velho mito" (como posto por Breien) é tão difundido em Hollywood, como em outros países, talvez uma atitude que desafie fronteiras, com a exceção, talvez, da União Soviética. Os filmes da diretora norueguesa Anja Breien são cerebrais, e mesmo difíceis. Mas Breien se interessa pela ideia de almejar o mínimo denominador comum. Decididamente política, reconhece que é frequentemente "perigoso dar sentido a qualquer coisa" (Hoaas, p. 389) no atual clima político. 

Anja Breien estudou em uma escola de cinema francesa (IDHEC) e passou a realizar curtas no final dos anos 60. Jostedalsrypa (1967) é um filme centrado em uma mulher, baseado em uma lenda medieval sobre as experiências de uma jovem durante uma praga. Em 1969, Breien dirigiu 17. Mai-en Film om Ritualer, um curta que ganhou o prêmio do Festival de Oberhausen. 17. Mai satiriza a celebração das férias nacionais norueguesas. Voldtekt (1971) versa sobre um suspeito de estupro que é erroneamente acusado e preso pelas autoridades. Artisticamente interessante da perspectiva masculina, sendo bem recebido no Festival de Cannes. Muren Rundt Fengslet (1972) é uma acusação ao sistema penal norueguês. 

Brein trabalhou para a televisão por um breve período, dirigindo um documentário sobre alcoolismo (Herbergisterne, 1973) e outro sobre a artista Arne Bendik Sjur (Mine Soskend Godda, 1972). Os filmes pessoais de Breien começam com Hustruer (Wives, 1975), inspirado no Husbands (Maridos, 1970), de John Cassavetes. Wives foi um sucesso internacional e lançou a carreira de Breien como realizadora de longas metragens. Wives é cinematograficamente vanguardista no que despreza das representações canônicas hollywoodianas das experiências que são artificialmente restritas em um processo de filmagem. Breien utiliza a câmera para observar as vidas de três mulheres que tentam escapar de suas existências mundanas como donas de casas, e passam diversos dias juntas, explorando seus verdadeiros sentimentos. A formação documental de Breien se torna visível no modo revigorante que enquadra e monta a história. As mulheres discutem temas como a ambivalência em relação as restrições de gênero, sexualidade e feminilidade enquanto o filme se desenrola em uma investigação feminista do sentido da vida cotidiana. Breien encoraja seu elenco a colaborar e improvisar, o que talvez explique a silenciosa mistura de humor brilhantemente sutil, raiva e ironia. 

Forfolgensen (The Witch Hunt, 1981) é talvez um dos filmes mais conhecidos de Breien. O filme é um drama sobre uma mulher do século XVII que assusta as pessoas, com sua assertividade sem rodeios, e é perseguida por sua sexualidade evidente. É uma história de exílio, incompreensão e mitos enraizados no medo. O temor do poder das bruxas não é diferente do temor de mulheres realizadoras e Breien esboça habilmente sobre esta temática paralela entre vida e arte. Gorham Kinden caraceteriza Witch Hunt como "uma acusação relativamente direta de uma estrutura patriarcal tradicional da sociedade norueguesa." (p. 37). A personagem central, uma mulher forte e sensual, é a ameça a ordem porque ela incomoda o poder hierárquico. O filme de Breien incita à comparação com uma série de filmes dirigidos por mulheres, incluindo Camila, de Maria Luisa Bemberg. Ambos os filmes são esgotantes, e mesmo difíceis de assistir, quando uma protagonista mulher é tratada injusta e brutalmente por um grupo de líderes comunitários cruéis e hipócritas.

Tanto Camila quanto Witch Hunt finalizam com a punição corporal brutal do corpo feminino. Camila é morta por um pelotão de fuzilamento. Eli Laupstad, em Witch Hunt é colocada no aparelho de tortura, torturada e, por fim, decapitada. Nenhum dos dois filmes titubeia em sua representação da opressão masculina, que frequentemente age sob o disfarce da sanção religiosa. Witch Hunt está situado no passado, como Camila, e ambas as produções encorajam a espectadora feminina que o sexismo dificilmente finda com o passado violento. Deste modo, Witch Hunt e Camila questionam a noção de uma visão romantizada da história que se move rumo ao empoderamento do indivíduo. Ambos os filmes provam que a eterna vigilância é o preço que se paga pela liberdade.

O uso de Breien de técnicas cinematográficas expressionistas é destacado em Witch Hunt. Na tradição de Ingmar Bergman, Brein retrata uma paisagem severa como o pano de fundo psicológico de angústia e depravação. O uso de sobreposições, sequencias oníricas, e um senso oblíquo de tempo e espaço é típico de um cinema norueguês elaborado. A habilidade de Breien, a oscilar entre as perspectivas objetiva e subjtiva é distinto. Ela cria uma mescla de realismo, primeira pessoa, trabalho de câmera de perspectiva onisciente, que simultaneamente desencoraja e convida o espectador a se identificar. Por conta de sua abordagem incomum dos materiais, o cinema de Anja Breien não se enquadra facilmente ao cânone da vanguarda modernista. Como a obra de Chantal Akerman, ele é difícil e pessoal. Anja Breien, juntamente com Vibeke Lokkeberg e Laila Mikelsen, constituem a Nova Onda de realizadoras norueguesas. Não temem à crítica, e não temem explorar novas veredas de expressão feminista. No entanto, dada a relativa intransigência do cinema de Ingmar Bergman, cujos filmes profundamente pessoais criaram sensação internacional nos anos 50, a emergência de um grupo de francas, e inequivocamente ativistas, realizadoras na Noruega não é surpreendente. Os filmes de Breien deveriam circular mais no Ocidente, e uma retrospectiva completa de sua obra é certamente indicada. 

FILMOGRAFIA SELECIONADA

Jostedalsrypa (1967)

17. Mai-en Film om Ritualer (1969) 

Ansikter (1969)

Voldekt (1971)

Mine Soskend Goddad (1972)

Muren Rundt Fengslet (1972)

Arne Bendik Sjur (1973)

Herbergistern (1973)

Gamle (1975)

Hustruer (Wives) (1975)

Den Allvarsamma Leken (Games of Love and Loneliness) (1977)

Arven (Next of Kin) (1979)

Forfolgelsen (The Witch Hunt) (1981)

Papirfuglen (Paper Bird) (1984)

Hustruer Ti Ar Etter (Wives - Ten Years After) (1985)

BIBLIOGRAFIA SELECIONADA

de Lauretis, Teresa. Alice Doesn't: Feminism, Semiotics, Cinema. Bloomington: Indiana University Press, 1984. 

 Doane, Mary Ann. The Desire to Desire. Bloomington: Indiana University Press, 1987.

 Hoaas, Solrun. "Anja Breien." Cinema Papers 39 (1982): 320-91.

 Kaplan, E. Ann. Women and Film: Both Sides of the Camera. New York: Methuen, 1983.

 Kindem, Gotham A. "Norway's New Generation of Women Directors: Anja Breien, Vibeke Lokkeberg and Laila Mikkelson." Journal of Film and Video 39.4 (fall 1987): 28-42. 

 Lovell, Terry. Pictures of Reality. London: BFI, 1980. 

 Mellen, Joan. Women and Their Sexuality in the New Film. New York: Horizon, 1973. 

Fonte: Foster, Gwendolyn Audrey. Women Film Directors. Westport/Londres: Grenwood Press, 1995. pp. 53-56.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Filme do Dia: Der Traum des Bildhauers (1907), Johann Schwarzer

Filme do Dia: Quem é a Bruxa? (1949), Friz Freleng

A Thousand Days for Mokhtar