Dicionário Histórico de Cinema Sul-Americano#101: Román Chalbaud
CHALBAUD, ROMÁN (Venezuela, 1931*). Talvez o mais respeitado e admirado de todos os realizadores venezuelanos, Román Chalbaud foi também o mais prolífico e bem sucedido durante os anos do boom do final dos anos 70 e 80. Nasceu em Mérida e moveu-se com sua familia para Caracas, em 1937. Desenvolveu seu amor pelo teatro em sua mais precoce idade e após estudar sob a orientação de Alberto de Paz y Mateos, um líder de um grupo de teatro experimental venezuelano, em 1947 e 1948, escreveria sua primeira peça em 1951, Los Adolescentes. Durante os anos 50 foi também ator e começou a dirigir em 1953, com outra de suas peças, Muros Horizontales.
Inspirado pelo cinema mexicano dos anos 40, Chalbaud realizou seu primeiro longa em 1959, adaptado de sua própria peça de sucesso, escrita em 1955, Caín Adolescente. Chalbaud foi capaz de dirigir somente mais um filme, Cuentos para Mayores (1963), antes que as oportunidades para a realização em cinema desaparecessem na Venezuela, e ele retornasse ao teatro e a televisão (aonde começou, em 1953) legitimados. Mas estes dois longas estabeleceram-no como diretor de uma obra séria e realista. Caín Adolescente expunha a pobreza e a miséria das favelas de Caracas, enquanto Cuentos para Mayores foi um filme composto de três esquetes, contendo "La Historia del Homem Bravo", também ambientado em uma favela de Caracas; "Los Ángeles del Ritmo" sobre um grupo de músicos delinquentes; e "La Falsa Oficina del Supernumerario", no qual um atendente engana as pessoas as fazendo acreditar que ele é membro do congresso venezuelano. Todas as três partes de Cuentos para Mayores são focados na realidade social de Caracas, mas variam em estilo e tratamento, com o segundo sendo mais estilizado que o primeiro, e o terceiro ganhando entonação cômica.
Em 1967 Chalbaud foi nomeado presidente do Instituto Latinoamericano de Teatro (ILT), uma organização criada pela UNESCO, e no mesmo ano foi co-fundador do grupo teatral "El Nuevo Grupo". Nos idos dos anos 70 dirigiu várias séries para a TV venezuelana e, em 1974, finalmente realizou seu terceiro longa, La Quema de Judas. Em 1975, com as receitas do petróleo possibilitando o estado financiar a produção de cinema nacional, Chalbaud completou Sagrado y Obsceno, com seu amigo José Ignacio Cabrujas, que escreveu o roteiro (baseado em uma peça de Chalbaud) e atuou no papel principal. Após dirigir outra série para a TV, Chalbaud embarcou em um de seus mais bem sucedidos projetos para o cinema, El Pez que Fuma (1977), baseado em uma peça sua, de 1968. Co-escrita novamente com Cabrujas, , Chalbaud elencou dois de seus atores favoritos, Hilda Vera e Miguel Ángel Landa, que haviam aparecido juntos em dois filmes prévios, como "La Garza", uma cantora e madame do bordel El Pez que Fuma, e Dimas, seu amante, respectivamente. Um jovem, Jairo (Orlando Urdanetta), que trabalha no bordel, torna-se amante de La Garza e se torna amigo de Dimas, de quem finalmente usurpa o posto e entrega-o à polícia. O filme tem seu clímax dramático quando Dimas acidentalmente mata La Garza, seguido por seu funeral barroco e sinistro. Engenhosamente, Chalbaud distancia o público da ação potencialmente excitante em El Pez, nunca apresentando os encontros eróticos e focando mais na luta pelo poder que desenvolve, encorajando a platéia à relacioná-la com a história política contemporânea venezuelana. Jairo também fornece cocaína para um traficante de drogas estadunidense, aludindo ao envolvimento norte-americano negativo nas questões sul-americanas. Ainda que seja baseado em uma peça, El Pez que Fuma é decididamente cinematográfico, com a morte de La Garza sendo extendida através da câmera lenta, observada de diferentes ângulos de câmera, e com a trilha de um tango, "Sus Ojos se Cerraron".
Nos dois anos seguintes, ainda que a produção cinematográfica venezuelana tenha decaído ligeiramente, Chabauld dirigiu mais três longas: Carmen, la que Contaba 16 Años (1978), baseado no romance de Prosper Mérimée, e com Landa como um policial; El Rebaño de los Ángeles (**) (1979), estrelado por Hilda Vera; e Bodas de Papel, escrito por Cabrujas. De 1983 a 1990, Chabauld dirigiu ainda outros sete filmes, incluindo La Gata Borracha (1983), a trágica história de um homem respeitável (Landa), desviado de seu rumo por uma prostituta; Cangrejo II (1984), um autêntico filme de ação criminal (também estrelado por Landa); Ratón de Ferretería (1985), sobre o universo das telenovelas; e Cuchillos de Fuego (1990), um crime/melodrama/saga familiar/road movie, novamente estrelado por Landa. Talvez Chalbaud nunca recupere totalmente seus intentos sérios e de conscientização social de seus filmes dos anos 60, mas sua obra dos anos 70 e 80, soube combinar entretenimento e crítica social através de uma sombria visão da natureza humana, frequentemente envolvendo assassinatos por vingança.
Chalbaud foi preso pela ditadura, em 1957, por suas visões políticas, e manteve seu espírito comunitário ao assumir cargos administrativos: tornou-se presidente da Asociación Nacional de Autores Cinematográficos, em 1978, e de 1992 a 1993 foi o diretor-geral da Fundación Cinemateca Nacional. Foi menos prolífico no meio do cinema, entre 1990 e 2004 (somente dirigiu um filme), mas continuou a trabalhar na televisão regularmente, e seus três longas mais recentes marcam um retorno aos propósitos políticos. El Caracazo (2005) aborda um olhar ficcional sobre o 27 de fevereiro de 1989, quando centenas de manifestantes foram assassinados pelas forças de segurança venezuelanas; Zamorra: Tierra y Hombres Libres (2009), é ambientado na segunda metade do século XIX e segue os esforços do personagem-título para efetuar a reforma agrária; e Días de Poder reflete sobre as lutas políticas dos anos 60 através de pai e filho, representando visões opostas.
Texto: Rist, Peter H. Historical Dictionary of South American Film. Plymouth: Rowman&Litlefield, 2014, pp. 132-4.
(*) N. do E: Falecido em 2023
(**) N. do E: no original grafado erroneamente El Redaño de los Ángeles.
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