Filme do Dia: Gênio Indomável (1997), Gus Van Sant

 


Gênio Indomável (Good Will Hunting, EUA, 1997) Direção: Gus Van Sant. Rot.Original: Ben Affleck&Matt Damon. Fotografia: Jean-Yves Escoffier. Música: Danny Elfman. Montagem: Pietro Scalia. Com: Matt Damon, Robin Williams, Stellan Skarsgaard, Ben Affleck, Minnie Driver, Casey Affleck, Cole Hauser.  

   Will Hunting (Damon), faxineiro de uma universidade de Boston, que vive em Southie, bairro pobre da cidade, no meio de seu serviço resolve anonimamente uma complexa equação que o professor Gerard Lambeau (Skarsgaard) havia lançado como desafio para os alunos tentarem resolver até o final do semestre. Enquanto participa das comemorações de vinte e cinco anos sua formatura, Lambeau é surpreendido por seus alunos, que querem saber quem conseguiu resolver a equação. Todos ficam sem saber, até Lambeau surpreender Hunting resolvendo um segundo desafio que ele propôs aos alunos. Hunting foge e abandona o emprego. Em uma das saídas com seu melhor amigo Chuckie (Ben Affleck), vai a um pub frequentado por universitários de Harvard, onde conhece a jovem Skyla (Drive), que se interessa por ele. Porém,  juntamente com Chuckie, e os outros dois membros do grupo, também sem maiores perspectivas de futuro, Morgan (Casey Affleck) e Billy (Hauser), envolve-se em uma briga em que é condenado. O professor Lambeau, que chegara na hora de sua brilhante defesa - que o juiz só não relevou por Hunting já ser reincidente – compromete-se  em acompanhar Hunting, com a promessa de que ele o irá ajudar em suas pesquisas e que terá que ser acompanhado por psicólogo. Após várias tentativas, que vão das correntes mais ortodoxas (em que Hunting descobre traços homossexuais encobertos para a ira do psicanalista) até o hipnotismo (em que finge se encontrar em transe, mas faz piada), Lambeau apela para Maguire (Williams), antigo colega de classe. Inicialmente já entrando em conflito com Maguire, ao descobrir que o problema deste se encontra com sua mulher - ele irá descobrir posteriormente que ela morreu – finda por respeitá-lo já que ele é o único que consegue rebater suas ironias e descobrir seu ponto fraco: se utilizar de sua genialidade como arma de defesa, embora não possua uma vivência da cultura a que se refere (Maguire exemplifica que ele pode saber tudo sobre Michelangelo, mas nunca teve o prazer de apreciar o cheiro que emana da Capela Sistina como ele), além de ser emocionalmente imaturo (nunca foi capaz de vivenciar o amor intenso,  para além do sexo, como foi o caso de Maguire com sua mulher). Intimidado, Hunting repensa sua relação com Skyla (a quem constantemente mente sobre sua origem social e sobre o fato de ser órfão), porém as pressões tanto de Lambeau para que arranje logo um emprego que lhe dê um retorno financeiro e o afaste da amizade do grupo de Chuckie quanto da própria Skyla que reivindica um retorno do afeto que investiu nele fazem com que volte a se aproximar cada vez mais de Chuckie e abandone propostas de emprego e Skyla. Após surpreender uma discussão acirrada entre Lambeau e Maguire, onde o último pede que dê mais tempo ao tratamento e pare com as pressões, Hunting consegue seu momento de catarse emocional, onde chora fragilizado nos ombros de Maguire e revela as torturas que sofrera do pai adotivo e nos orfanatos. Após se encontrar recuperado e, por outra via, ter conseguido fazer com que Maguire continue sua vida, tentando uma nova relação, Hunting abandona Boston sem fazer ainda contato para emprego, para encontrar-se com Skyla.   

    Gus Van Sant pretendeu demonstrar que era capaz de realizar um filme acadêmico tradicional que atraísse bilheteria e fosse indicado ao Oscar e, ao mesmo tempo, deixar claro que não abandonou de todo seu “universo” (temas sobre desajustados, a cena de estrada que fecha o filme, idealismo semi-beatnik), e o resultado foi decepcionante, já que tanto o enredo sentimental e indulgente como a melosa trilha-sonora (não as canções, que são uma das poucas coisas boas do filme) ficam a anos-luz do distanciamento maior que conseguira nos superiores Garotos de Programa e, principalmente, Drugstore Cowboy. O filme não convence, seja pelo exagero em se frisar a genialidade de um jovem que ao longo de todo o filme não abre um livro sequer, seguindo a linha romântica de grande apelo popular do gênio problemático que teve nos últimos tempos como exemplos, entre outros, Rain Man e Shine, como pela postura sentimental em excesso do jovem Hunting, para quem conviveu com a realidade pesada dos orfanatos, de um pai adotivo e de um grupo de amigos violento (grupo este que ele identifica como substituto para a família) desde cedo. Também decepciona pelos habituais clichês melodramáticos como o que contrapõe o idealismo iluminado e humano de Maguire ao racionalismo frio e cruel de Lambeau, vivido por Skarsgaard, mais um ator europeu a trocar produções de relevância artística como Zero Kelvin e Ondas do Destino pelo cinema americano médio em filmes como este e Amistad. A superação do “trauma” enquanto equivalente subjetivo dos objetivos exteriores a serem conquistados pelo herói nada fica a dever aos dramas “psicanalíticos” do pós-guerra.  A ridícula tradução do título original sequer possui coerência, já que no final tudo indica que se o gênio já não se encontra completamente domado (recusou a oferta de emprego, porém viaja de encontro a amada na Califórnia, com toda uma expectativa de ajustamento social) se encontra em vias de. Miramax. 126 minutos. 

Postado originalmente em 01/01/2016

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