Filme do Dia: O Homem Não é um Pássaro (1965), Dusan Makavejev
O
Homem Não é um Pássaro (Covek nije Tica,
Iuguslávia, 1965). Direção e Rot. Original: Dusan Makavejev. Fotografia:
Aleksandar Petkovic. Música: Petar Bergamo. Montagem: Ljubica Nesic. Dir. de
arte: Dragoljub Ivkov & Milenko Jeremic. Com: Milena Dravic, Janez Vhrovec,
Eva Ras, Stole Arandjelovic, Boris Dvornik, Dusan Antonijevic, Mirjana
Blascovic, Mirko Todorovic.
O engenheiro de obras Jan Rudinski (Arandjelovic) chega para
trabalhar num enorme canteiro de obras de uma gigantesca indústria de minério,
passando a morar no pobre e sujo bairro, sendo inquilino da família da bela e
jovem Rajka (Dravic), uma cabeleireira, com quem se envolve afetivamente.
Quando Jan recebe o auge de seu reconhecimento profissional, sendo premiado
diante de todos os operários, Rajka se entrega aos apelos do jovem motorista de
caminhão (Dvornki), que freqüenta o seu salão.
Esse belo e algo disperso filme anterior a celebridade
internacional de Makavejev parece conter boa dose da crítica social (mais que a
presente no realizador tcheco contemporâneo posteriormente também alçado à fama
internacional, Milos Forman, em filmes como Os Amores de uma Loira) e de referências a uma sexualidade
transbordante que é associada aos novos cinemas do Leste Europeu. O teor de
crítica social, para além de sua ambientação em um bairro sujo e miserável, que
não parece demonstrar tão grande avanço dessas em relação a situação anterior
da guerra mundial (ao contrário do que apresenta o discurso de uma guia que
apresenta a um grupo de escolares o universo da indústria, numa clara ausência
de sincronia entre o discurso e as
imagens) como retrato das mas condições das classes populares é explicitado
sobretudo no momento em que uma das personagens associa o número de hipnotismo
que causa sensação no bairro ao domínio duplo sofrido pelas mulheres, das
autoridades e de uma enraizada misoginia. Porém, já se encontra contido no
próprio título, que vai contra justamente a situação de submissão ao
hipnotizador que faz com que as pessoas imitem ridiculamente pássaros. A
crítica ao machismo é, no entanto, mais forte que ao sistema político, muito
provavelmente em temor à censura, e torna-se um espelhamento da outra. Os
exemplos ao longo do filme são muitos, como o da submissão de uma mulher ao seu
marido cruel e alcoólatra, num subenredo que não chega a ser bem desenvolvido
ou ter uma relação mais orgânica com o filme como um todo e mesmo o da
protagonista que, portadora de uma permissividade bem mais ampla, tampouco
deixa de sofrer agressões dos pais, quando esses descobrem que está se
relacionando com o inquilino. Em um dos momentos que parece antecipar o estilo
mais ousado de seus documentários posteriores (Inocência Desprotegida, W.R.– Os Segredos do Organismo), ouve-se uma narração off que tece loas às novas condições da classe trabalhadora que se
chocam com o brutal esforço que o trabalhador empreende. Porém, o que se
tornaria um efeito radical, a utilização de uma narração tipicamente documental
em um filme de ficção, sem explicitação sobre qual a origem da mesma acaba ao
final da seqüência sendo revelada como a do guia que orienta os escolares, como
já referido. Inicia com um plano em câmera baixa já desconcertante do que
aparenta ser um homem usando um enorme chapéu e que, na verdade, descobrir-se-á
ser uma antecipação da conferência do hipnotizador. É interessante o quanto o
protagonista, mesmo não sendo ridicularizado, tampouco se aproxima de
compartilhar da premissa libertária do filme. Nesse sentido, pode-se pensar que
à metáfora do título cabe um duplo sentido, completamente assimétrico, já que
ao mesmo tempo que representa o já referido ato de sumbissão ao hipnotizador,
igualmente serve como rude admoestação do protagonista a um jovem e sonhador
subordinado seu que faz do instrumento de trabalho um balanço. Aqui, ser como
um pássaro significa liberdade e um ato de confronto anárquico à submissão do
trabalho/sistema. O título, portanto, sob essa perspectiva, vem justamente
afirmar que não há liberdade na sociedade iuguslava contemporânea. A então bela e jovem Dravic, com longeva
carreira no cinema iuguslavo e, posteriormente, sérvio, ainda atuando, mais de
40 anos após esse filme, possui cerca de 150 filmes em seu currículo. Avala Film. 81 minutos.
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