O Dicionário Biográfico de Cinema#74: Melanie Griffith


 Melanie Griffith, n. Nova York, 1957

Essa atriz tem uma compreensão melhor do que está fazendo que seus admiradores? Casou-se duas vezes com Don Johnson (a primeira delas ainda adolescente); tem tido problemas recorrentes com bebida e drogas - para não dizer nada de homens e com seu próprio peso. A volatilidade aqui parece muito próxima da confusão. Talvez a garotinha tenha sido traumatizada quando Alfred Hitchcock lhe deu um caixão de brinquedo com uma boneca de sua mãe dentro dele. Ou talvez a piada tenha sido uma ideia de Melanie.

Filha da atriz de Hitchcock, Tippi Hedren (The Birds/Os Pássaros e Marnie, realizados quando Melanie tinha cinco e seis anos respectivamente) e do agente imobiliário Peter Griffith. Hedren se casou novamente, com Noel Marshall, treinador de animais selvagens: um resultado disso foi Roar (81, Marshall), filme desastroso que levou muitos anos para ser realizado e que apresentou uma família e seus devoradores de gente.

Griffith foi fascinante em sua estreia nas telas, Night Moves [Um Lance no Escuro] (75, Penn), como uma criança encorpada fazendo companhia aos adultos, confusa com a incompatibilidade de sua carnalidade, jeito tímido e voz infantil. Esse dilema nunca foi resolvido de todo. 

Esteve em Smile (75, Michael Ritchie); The Drowning Pool [A Piscina Mortal] (76, Stuart Rosenberg); One on One (77, Lamont Johnson); e Joyride (77, Joseph Ruben). Houve um intervalo de quatro anos antes do início de sua carreira "adulta", primeiro assombrosa, e parecendo assombrada como Holly Body em Body Double [Dublê de Corpo] (84, Brian De Palma), e em Fear City [Cidade do Medo] (84, Abel Ferrara).

Nada sugeria a profundidade de Something Wild [Totalmente Selvagem] (86, Jonathan Demme), onde vai do furacão Brookseano de Lulu à ferida e provinciana Audrey com facilidade absoluta: essas duas metades de uma criatura apresentaram Griffith como uma atriz, mas também ilustraram o talento de Demme. Nada desde então esteve no mesmo nível: Cherry 2000 (88, Steve DeJarnatt) ficou nas prateleiras, e provavelmente foi lançado por conta de Totalmente Selvagem; The Milagro Beanfield War [Rebelião em Milagro] (88, Robert Redford), foi uma festa para convidados; Stormy Monday [Dia Fatal] (88, Mike Figgs) estava muito atento em fazer Newcastle parecer com Gotham; foi uma trabalhadora plena em Working Girl [Uma Secretária de Futuro] (88, Mike Nichols), ainda inexplicavelmente como Rubens em sua roupa íntima, observada de soslaio por Nichols até o limite do incômodo. In the Spirit [Agitando os Espíritos] (90, Sandra Seacat) foi uma excentricidade; em Pacific Heights [Morando com o Perigo] (90, John Schlesinger) ela nem sempre parece consigo mesma; foi alegremente divertida no arcaico Shining Through [Uma Luz na Escuridão] (91, David Seltzer).

Trabalhou na TV no conto de Hemingway "Hills Like White Elephants" em Women and Men: Stories of Seduction [Homens & Mulheres - Histórias de Sedução] (90, Tony Richardson). Foi uma das figuras proeminentes em Bonfire of the Vanities [A Fogueira das Vaidades] (90, De Palma), que pode ter sido mantida em uma reformulação sensata. Com Don Johnson realizou o menor e inofensivo Paradise [Paraíso] (91, Mary Agnes Donoghue). Mas A Stranger Among Us [Uma Estranha Entre Nós] (92, Sidney Lumet) é uma tal loucura que mais parece um drama kitsch que um projeto que sobreviveu uma programação diária de trabalho. Esteve novamente com Johnson em uma nova versão de Born Yersterday [O Renascer de uma Mulher] (93, Luis Mandoki), confiantemente uma meia batida nos ritmos mudos de Billie Dawn.

E até...a despeito da perda de Don Johnson, e talvez por ter ganho Antonio Banderas, Melanie segue adiante.Quem sabe que reelaborações podem ter ocorrido? Nas telas, tornou-se mais bem divertida sem perder uma gota de sensualidade. Passou a se tornar uma instituição (e uma na qual me apoiaria): Milk Money [As Aparência Enganam] (94, Richard Benjamin); tendo um momento sublime em Nobody's Fool [O Indomável] (94, Robert Benton); na TV em Buffalo Girls [Buffalo Girls - As Últimas Pistoleiras] (95, Rod Hardy); Now and Then [Agora e Sempre] (96, Lesli Link Glatter); com Banderas em Two Much [Quero Dizer que te Amo] (95, Fernando Trueba); muito tocante em Mulholland Falls [O Preço da Traição] (96, Lee Tamahori); como Charlotte Haze em Lolita (97, Adrian Lyne); brilhante em Another Day in Paradise [Kid e os Profissionais] (98, Larry Clark); muito sexy em Celebrity [Celebridades] (98, Woody Allen); uma exuberante Marion Davie em RKO 281 (99, Benjamin Ross); absorvendo a diversão em Crazy in Alabama [Loucos do Alabama] (99, Banderas); Cecil B. Demented [Cecil Bem Demente] (00, John Waters). Esteve em Forever Lulu [Eternamente Lulu] (00, John Kaye); Tart [Inocência Perdida] (01, Christina Wayne); Tempo [Tempo - Uma Questão de Sobrevivência] (03, Eric Styles); como a última esposa de Frank Sinatra em The Night We Called It a Day (03, Paul Goldman); Shade [Shade - Nos Bastidores do Jogo] (03, Damian Neiman); Heartless (05, Robert Markowitz).

Ela sucumbiu à televisão, e  foi sempre uma beleza das telas grandes. Tentou séries que não caíram no gosto do público. Esteve em centros de rehabilitação e teve câncer de pele. Porém, também teve que admitir a idade, apostando cada golpe na maturidade. Fez alguma TV, incluindo um episódio de Hot in Cleveland [No Calor de Cleveland] (11), e numa série que duraria uma vida, American Housewife, que nunca foi ao ar (*). Então, vamos repetir o mantra: Um Lance no Escuro, Totalmente Selvagem, Uma Secretária de Futuro, O Indomável...

Texto: Thomson, David. The Biographical Dictionary of Film. Nova York: Alfred A. Knopf, 2014, pp. 1106-8. 

(*) N. do E.: Iria ao ar dois anos após essa publicação (2016), mas a atriz não faz parte do elenco

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