Filme do Dia: Terra Espanhola (1937), Joris Ivens
Terra Espanhola (The Spanish Earth, EUA, 1937). Direção: Joris Ivens. Rot. Original:
Joris Ivens, a partir do argumento de Lilian Hellman & Archibald Macleish.
Fotografia: John Fernhout & Joris Ivens. Montagem: Helen van Dogen.
Esse comovente documentário de
propaganda republicana, produzido no auge do fervor que a Guerra Civil
Espanhola produziu entre os intelectuais de todo o mundo, foi produzido por um
punhado destes e contou com a colaboração de outros tantos. Porém, o que é mais
comovente é menos o esforço dos mesmos que o fato de Ivens ter ido ao cenário
da batalha e, sob risco de perder a própria vida, flagrar uma Espanha
semi-devastada e com a morte sendo observada como fato cotidiano, quase sempre
provinda dos céus, através dos bombardeios das forças franquistas. O filme ter
sofrido um intenso trabalho de edição ( menos cuidadoso com relação ao áudio, o
que em parte pode ser explicado tanto por suas condições de produção e em parte
por conta da sonorização de documentários ser algo realmente precário na maior
parte das produções então, à exceção de produções grandiosas como O Triunfo da Vontade) fica patente na
forma em que orquestra sua primeira sexta parte sem sequer fazer qualquer
menção à guerra. Observada em seu cotidiano, uma vila de republicanos é
apresentada em todo o seu esforço comunitário. Marcante, nesse momento, é a
forma como Ivens compõe sofisticados planos a partir de motivos triviais, como
a varredura das ruas efetuada pelas mulheres, explorando magnificamente a
profundidade de campo – uma mulher reproduz a imagem da mulher mais próxima da
câmera efetivando a mesma atividade – na mais bela imagem de todo o
documentário. Esse cuidado não o abandona nem nos momentos mais tensos Que não
se espere nenhuma visão panoramicamente didática sobre o conflito, pois não se
trata do caso. E nem do objetivo. Mesmo
com a presença constante de mapas situando o avanço das tropas revolucionárias
e suas estratégias. Sua narração, tanto em termos de montagem – que acentua o
cotidiano da vila para somente apresentar homens do exército republicano e os
efeitos na vida civil dos bombardeios – como de locução (a cargo originalmente
de Orson Welles, mas posteriormente efetuadas pelo próprio Hemingway, autor do
texto, e na versão francesa por Jean Renoir) reflete a tentativa de asfixia de
uma nova forma de sociedade que atemoriza as forças políticas conservadoras da
Europa. As imagens expressam muito mais
do que o discurso de Hemingway, no entanto, e por vários momentos felizmente
são elas que imperam sem qualquer comentário adicional. Como todo libelo
apresenta apenas aspectos positivos das forças revolucionárias, assim como de
uma sociedade civil vitimizada e para que a guerra não diz nada, como é o caso
do transeunte madrilenho morto quando ia ao trabalho, ao qual o filme se detém
por um trecho relativamente longo. Retratos da morte nos rostos com as
expressões mais diferenciadas são evocativas de um quadro tão sombrio quanto o
pintado por Picasso em seu célebre quadro. A determinado momento um caminhão
parece apresentar um estranho e desconhecido instrumento bélico de alcance
extraordinário. Logo se fica sabendo se tratar de um amplificador de
transmissões radiofônicas e sua equiparação com um artefato de guerra é uma
evidente compreensão de se tratar, a seu modo, de uma arma que, como todas as
mídias contemporâneas, encontram-se cada vez mais atentas para a propaganda
política. Noutro em dois cadáveres de crianças flagrados, um deles parece
sustentar a pose do punho erguido que representa a luta anti-fascista mesmo
depois de morto. Aliás, adolescentes são apresentados sendo treinados por um
dos soldados que o filme tenta infrutiferamente transformar numa versão mais novelesca e próxima de se
transformar num “personagem” diferenciado dos demais e com status de
protagonista. Contemporary Historians
Inc. 52 minutos.
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