Filme do Dia: Vida de Menina (2003), Helena Solberg
Vida de Menina (Brasil, 2003).
Direção: Helena Solberg. Rot. Adaptado: Elena Soarez & Helena Solberg,
baseado no romance Minha Vida de Menina,
de Helena Morley. Fotografia: Pedro Farkas. Música: Wagner Tiso. Montagem:
Diana Vasconcellos. Dir. de arte: Beto Mainieri. Figurinos: Marjorie Gueller.
Com: Ludmilla Dayer, Daniela Escobar, Dalton Vigh, Maria Sá, Camilo Beviláqua,
Lígia Cortez, Leonor Gottlieb, Benjamin Abras.
Diamantina, final do século XIX.
Helena (Dayer) escreve em um caderno
tudo o que observa na provinciana sociedade de Diamantina. Sobre o sofrimento
da mãe (Escobar), empobrecida e sacrificada à vida do trabalho, por conta da
obsessão do marido (Vigh) em tentar extrair riqueza da exploração de minérios
que não mais existem. A avó, doce mas de forte personalidade, que ajuda a
família. A descoberta da morte, através de uma escrava recém-casada, vítima de crime
passional. A descoberta do desejo, com a chegada de um primo do Rio. O
adoecimento e morte da avó. A partida da família de Diamantina.
É na chave da delicadeza que Solberg
impõe a sua biografia histórica em seu primeiro longa ficcional (ela realizou o
belo documentário Carmen Miranda: Banana
is My Business). Como em seu filme anterior, sua predileção por retratos
femininos que se destacam de sua época salta aos olhos. Mas aqui, menos ainda
que naquele, não se pretende apresentar tal dimensão vanguardista perante os
valores “tacanhos” da sociedade, de modo vitimizado ou glorificante tão comum a
certa produção de laivos politicamente corretos. O filme nos impõe a identificação
com sua jovem protagonista, ainda mais do que pelos recursos habituais de
identificação e recorrente intermediação do processo de escrita de seus
diários, do que pela licença poética expressiva com que a jovem atriz modula
seu gestual, sobretudo facial, em termos contemporâneos, em contraposição a
personagens que parecem por demais reprodutores de tipos da época : a avó doce
e compreensiva; a mãe sofrida e cujo universo se resume à própria casa; o
primo-pretendente “dândi” e um pouco feminino. Helena parece flutuar acima de
todos, constrangendo o padre com perguntas irrespondíveis, como por que Deus
não desejara que todos os homens fossem ricos ao invés de pobres, fazendo com
que a mãe reflita sobre a forma amarga e repreensiva com que a admoesta, buscando romper com o ciclo de reprodução do
sofrimento inconscientemente perpretado por esta ou que o pai finalmente tome
consciência do erro continuado que é insistir em explorar riquezas não mais
existentes, além de participar das brincadeiras e tradições associadas
exclusivamente à cultura africana. Mesmo que sua postura que enfatiza a crônica
de pequenas e banais ações do cotidiano sob a ótica infantil possa por vezes
parecer um tanto excessivamente singela e déjà
vu, é de fato o trunfo do filme, fazendo ressaltar o único momento de fato
efetivamente dramático, o da perda da avó. O romance de Morley já havia tido
uma adaptação bastante distinta, feita por David Neves em 1969, quando a autora
ainda se encontrava viva. Raccord
Produções/Radiante Filmes para Riofilme. 101 minutos.
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