Filme do Dia: Elegia de Osaka (1936), Kenji Mizoguchi

 



Elegia de Osaka (Naniwa Ereji, Japão, 1936). Direção: Kenji Mizoguchi.  Rot. Adaptado: Tadashi Fujiwara, Kenzi Mizoguchi & Yoshikata Yoda, baseado no conto Mieko, de Saburo Okada. Fotografia: Minoru Miki. Montagem: Tatsuko Sakane. Com: Isuzu Yamada, Seeichi Takegawa, Chiyoko Okura, Shinpachiro Asaka, Benkei Shinagoya, Yoko Umemura, Kensaku Hara, Shizuko Takizawa, Eitarô Shindô.

Ayako (Yamada), após sair da casa da família, continua sendo secretária e recebe propostas de seu chefe, Asai (Shiganoya) de se tornar sua amante, com direito a um apartamento seu e não mais precisar trabalhar. Ayako aceita, mas sobretudo visando pagar o furto cometido pelo pai. Ayako também ajuda o irmão, Hiroshi (Asaki), enviando ao pai o dinheiro necessário para que ele consiga se graduar na universidade. O pai, no entanto, fica com o dinheiro. Ela engana o Sr. Fujino (Shindô), recebendo dele a quantia com o qual, na verdade, pretende se casar com seu jovem namorado Nishimura. Este não a perdoa e chama a polícia. Ayako retorna à família porém, ao contrário da boa recepção que esperava, só encontra hostilidade, e vai embora outra vez.
Magnífico filme de Mizoguchi, no qual se sua apresentação profundamente irônica do chauvinismo masculino japonês é apresentado de modo quase didático e parece antecipar em décadas uma abordagem semelhante de Fassbinder, no plano visual apresenta estratégias que antecipam as de Cidadão Kane, como a do uso de figuras em primeiríssimo plano tão focadas quanto as que se encontram ao fundo, como no célebre plano da cabine da telefonista. Fundamental para seu sucesso é o fato de Ayako, ainda mais que sua contemporânea Stella Dallas, está longe de ser uma figura de vitimização. Mesmo que a dimensão auto-sacrificial, como no filme de Vidor e como no melodrama em geral se encontre presente, ela é efetivada por alguém que sabe também se utilizar dos recursos que encontra à mão, inclusive evidentemente da atração que exerce sobre os homens, transformando-se da tímida e apagada secretária do início em alguém com mais fibra que qualquer um dos homens que a rodeiam. Mesmo que Mizoguchi apresente um ritmo bastante distinto do classicismo americano, com planos que chegam a dois minutos, apresentando por vezes um potencial de exteriorização da reflexividade de seus personagens antecipadora do cinema moderno, tampouco deixa de existir cacoetes mais próximos deste, como o óbvio plano de detalhe que apresenta a canalhice do pai, ao confiscar o dinheiro enviado pela filha. Curiosamente, são quando estes elementos estilísticos mais associados ao cinema clássico norte-americano se apresentam de modo mais explícito, como no exemplo acima, que o filme menos se torna interessante, achatando a figura do pai a uma dimensão única. E é quando o cineasta mais investe em saídas outras, de forte carga pictórica – como os planos filmados do exterior de janelas, ressaltando ainda mais a semelhança do quadro cinematográfico com o da pintura,  ou ainda em soturnas locações industriais, que o filme mais cresce. Sua saída, ao final, igualmente rejeita o tom de derrota ou a alegria por procuração (como novamente Stella Dallas) que as heroínas do melodrama habitualmente estão fadadas. Após uma aparente disposição a se jogar nas águas do rio, Ayako termina com uma determinação triunfante de quem se sabe possuidora de valor e sem necessitar do auxílio exterior (e do sentimentalismo agregado a esse) da prostituta vivida por Masina em Noites de Cabíria (1957), de Fellini. Existem versões mais completas, com até 90 minutos de metragem, talvez daí provavelmente advindo a sensação de uma narrativa um tanto truncada. Daiichi Eiga. 71 minutos.

Postado originalmente em 24/01/2015

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