Filme do Dia: Não Quero Apenas Que Vocês Me Amem (1993), Hans Günther-Pflaum
Não Quero Apenas Que Vocês Me Amem (Ich Will Nicht Nur, Dass Ihr Mich Liebt, Alemanha, 1993). Direção e
Rot. Original: Hans Günther-Pflaum. Fotografia: Manfred Buckle & Werner
Kurz. Montagem: Ingrid Wolff.
Documentário que à parte algumas soluções infelizes – como o
pavoroso final carpideiro sob a lápide
do cineasta e ao som de música lírica – procura investigar algo do gigantesco
legado de Rainer Werner Fassbinder ao longa de sua relativamente curta carreira
– 1969 a 1982. É dividido em tópicos, que geralmente remetem a alguma frase dos
entrevistados. Entre esses se encontram o cineasta Volker Schlöndorff, os
atores Hanna Schygulla, Kurt Raab, Ingrid Caven (que chegou a ser casada com
Fassbinder), Harry Baer (que escreveu uma biografia sobre o cineasta) e Andréa
Ferréol, os fotógrafos Michael Ballhaus, Diether Lohmann e Xaver Schwarzenberger e a montadora Juliane
Lorenz. Entre os depoimentos mais marcantes estão o de sua mãe, a atriz
bissexta Lilo Pempeit, que conta algumas histórias sobre a infância do
cineasta, como o dia em que saíra para buscar sal e fora encontrado pela avó
numa igreja, onde afirmara enfaticamente não ter encontrado Deus como a avó lhe
havia contado. Ou nas imagens de arquivo do debilitado Kurt Raab (falecido em
1988) , que na sua breve fala afirma que mesmo vítima da AIDS, para ele foi um
grande orgulho sua colaboração em 31 dos filmes produzidos pelo cineasta.
Quando indagados sobre a rapidez do método de trabalho do cineasta pode se ter
uma idéia do dinamismo dele em termos de produção, já que Schygulla afirma que
provavelmente ocorria pela falta de perfeccionismo que lhe fazia, muitas vezes,
fazer uso de uma única tomada por plano, enquanto o fotógrafo Ballhaus afirma
que tal prática era mais uma estratégia para motivar a concentração e o envolvimento
maior de todos. Por sua vez, é lembrado que Effi Briest desmente qualquer concepção nesse sentido, dado o
preciosismo visual do filme. Outro depoimento ressalta o raro senso de intuição
de Fassbinder, que preferia nem conhecer o local de filmagem antes da própria,
pois muito do que imaginaria só seria organizado no próprio set de filmagem. Schlondorff dá a
deixa para que se pense a possibilidade do surgimento do cineasta dentro de seu
contexto histórico, que permitia a realização de três ou mais filmes num ano
(alguém afirma que ele dizia que se Godard fazia três ele poderia fazer quatro
por ano) por conta de uma estrutura bem mais permeável aos iniciantes e menos
burocratizada e faz um exercício de
imaginação sobre como seria o ritmo de sua produção nos dias em que o
documentário foi produzido, afirmando que provavelmente ele reduziria seu ritmo
e até provavelmente abandonaria o cinema e se dirigiria para o teatro. O que
Schlondorff esquece é que no final da vida, Fassbinder já tinha uma orientação
de produção bem diversa dos primórdios, tanto em termos de diminuição do ritmo
de produção quanto de maior proximidade com o mercado. Ao ilustrar o depoimento
do próprio Fassbinder afirmando seu gosto pelas narrativas com Num Ano de Treze Luas, o uso da fotografia estourada nos últimos
filmes do cineastas por uma paixão comum do cineasta e do fotógrafo por Von Sternberg ou a imobilidade da câmera como reflexo da paralisia dos próprios
personagens em O Machão, o filme
passa a discutir propriamente a estética do cineasta para além do folclore
biográfico e de seu inusitado método de produção. Nesse sentido caminham
igualmente a análise da sofisticação do uso de cores e enquadramentos em Effi Briest, dos movimentos de câmera
em Roleta Chinesa ou na explicitação do
uso da música como contraponto à imagem pelo próprio Peer Raben, que assinou
praticamente todas as trilhas do cineasta, mas que não deixa de frisar que
Fassbinder já fizera uso de tal recurso no curta que dirigiu antes de conhecer
Raben. Aliás, é enfatizado em mais de um depoimento a estratégia de
convencimento que Fassbinder articulava para que seus colaboradores agissem
como profissionais – fazendo com que o próprio Raben passasse a escrever
trilhas para o cinema, que Schlondorff e sua mãe se transformassem em atores.
Sobre sua relação com a morte, ilustrada por cenas de alguns de seus filmes,
Hanna Schygulla dá o depoimento mais bem humorado, ao lembrar que uma vez o
cineasta lhe afirmara que ela e Caven iriam se encontrar muitas vezes já
velhinhas e com as mãos trêmulas para falar sobre ele, enquanto ele próprio morreria cedo. Este continua
sendo o único filme dirigido pelo historiador e crítico Pflaum. 96 minutos.
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