Filme do Dia: A Morte Passou por Perto (1955), Stanley Kubrick

 




A Morte Passou por Perto (Killer's Kiss, EUA, 1955). Direção: Stanley Kubrick. Rot. Original: Howard Sackler, sobre o argumento de Kubrick. Fotografia: Stanley Kubrick. Música: Gerald Fried. Montagem: Stanley Kubrick. Com: Jamie Smith, Irene Kane, Frank Silvera, Jerry Jarret, Mike Dana, Felice Orlandi, Ruth Sobotka.

Davy Gordon (Smith) é um boxeador que teve um passado de reconhecimento, mas que agora sofre derrotas consecutivas. Seu atual desafio se comprova como mais uma nova derrota. Sua vizinha, Gloria Price (Kane), é dançarina de um clube de má reputação e amante do proprietário do mesmo, o possessivo mafioso Vincent Rapallo (Silvera). Ambos assistem a luta e Rapallo se diverte com a derrota de Davy. Na mesma noite, Price sofre violência de Rapallo em seu apartamento, já que ele se encontra indignado com a recusa da garota em continuar o relacionamento. Gloria grita e Davy aparece, passando a noite com ela. No dia seguinte, na mesa do café, Gloria conta a trágica história de sua família: o pai se encontrava próximo da morte, o que motiva o casamento da irmã, Iris (Sobotka) com um homem bem sucedido; quando o pai morre, Gloria – que sempre fora enciumada com a maior proximidade entre pai e irmã – insinua que a irmã nunca gostara verdadeiramente dele e essa suicida-se pouco depois. Davy convida Gloria para viajarem para Seattle, convite que os tios fizeram logo após a derrota do boxe. Ambos procuram seus respectivos empregos para cobrarem o que lhes é devido. No caso de Gloria, enquanto ela volta a negociar com Rapallo, que nada lhe queria entregar, o agente de Davy, Albert (Jarret), é assassinado pelos homens de Rapallo. A polícia procura Davy em seu apartamento, tendo-o como principal suspeito da morte do agente e ele percebe tudo do quarto de Gloria. Procurando por Rapallo, Davy acaba descobrindo que Gloria se encontra aprisionada em um prédio abandonado. Ele tenta libertar Gloria, mas torna-se vítima de Rapallo e seus capangas. Consegue uma oportunidade de fugir e após uma perseguição, luta e mata Rapallo em um depósito de uma fábrica de manequins. Pronto para embarcar no trem que o levara a Seattle, Davy se maldiz por ter inclusive matado um homem por um amor efêmero que durara apenas dois dias. No último momento, no entanto, Gloria o encontra.

Esse que talvez seja um dos melhores filmes de Kubrick é também um dos mais subestimados. Cada plano é um prazer para os olhos e o filme foi condenado por muitos como excessivamente estilizado. Porém para além da magistral fotografia (do próprio Kubrick, em um tour de force que também se estende a montagem e ao argumento), da utilização virtuosa do flashback dentro do flashback, soberbas locações (nunca provavelmente Nova York foi explorada de forma tão expressiva) e a milimétrica precisão de cada ângulo e plano, assim como da soberba trilha incidental, o filme também respira um saudável diferencial da produção noir corrente: mesmo distante do sentimentalismo, ele não apela para o cinismo como motor para tramas mirabolantes em que, de uma hora para outra, a heroína passa à vilã ou reviravoltas fantásticas no enredo. Kubrick dispensa os personagens em excesso e o estilo habitualmente barroco usual do gênero e envereda por uma atmosfera cool, evocativa de produções francesas de pouco depois como Ascensor para o Cadafalso e Acossado. Paralelos também são possíveis, principalmente no período em que a trama de suspense ainda não começa a ser a predominante, com o universo de Ida Lupino, como a sincera atenção para com os seus sofridos personagens, em um mundo igualmente desglamourizado e renitente para as facilidades do cinismo. Com essa recusa ao fantástico e a muitos dos clichês do gênero, ganha-se  tanto em termos de realismo como de originalidade. Um exemplo é a soberba seqüência em que o casal compartilha o café da manhã que, apesar de como tudo mais no filme ser grandemente planejado, não deixa de possuir um certo tom casual. Esse exercício de concisão – mesmo que a seqüência em que Gloria explique a Davy sobre a irmã, ilustrada pela atuação da mesma treinando no palco seja excessivamente longa - ainda seria mais moderno e desconcertante se no final Davy tivesse embarcado sozinho. Minotaur Productions/ United Artists. 67 minutos.

 

 

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