Filme do Dia: Eugenia Grandet (1947), Mario Soldati

 




Eugenia Grandet (Itália, 1947). Direção: Mario Soldati. Rot. Adaptado: Aldo De Benedetti & Mario Soldati, baseado na obra de Honoré de Balzac. Fotografia: Václav Vích. Música: Renzo Rossellini & Roman Vlad. Montagem: Eraldo Da Roma. Dir. de arte: Maurice Colasson & Gastonoe Medin. Figurinos: Gino Sensani. Com: Alida Valli, Gualtiero Tumiati, Giorgio De Lullo, Giuditta Rissone, Maria Bode, Giuseppe Varni, Pina Gallini, Lando Sguazzini, Linda Gennari.

Século XIX. Eugenia Grandet (Valli) é uma bela jovem submissa ao ganancioso pai (Tumiati).  Esse a presenteia anualmente com uma rara moeda. Ela leva uma vida aborrecida e estritamente vigiada pelo pai. Seu único esforço para se impor se dá quando se apaixona pelo primo Charles (De Lullo), que vê sua jovialidade momentaneamente conturbada com a morte do pai, que deixou dívidas vultosas. Charles tem planos de partir para as Índias, e Eugenia lhe doa a fortuna que possui, acumulada sob forma de moedas doadas pelo pai ao longo dos anos. Charles parte. No aniversário seguinte de Eugenia, o pai fica sabendo de tudo e passa a trancar Eugenia em seu quarto. Ela só volta a poder andar pela casa na iminência da morte de sua mãe (Rissone). O pai, vítima de um derrame, passa um tempo semi-inválido, mas morre pouco tempo depois. O que parecia um sonho se concretiza. Charles, que nunca havia dado notícia nos vários anos que permanecera fora, estabelecendo-se como comerciante de sucesso, visita Eugenia. Porém, ele lhe alerta sobre os planos de se casar com a Marquesa D’Aubrion (Gennari), não porque nutra nenhum sentimento por ela, como deixa claro, mas porque observa o casamento como um importante elemento social, que poderá lhe impulsionar sua carreira de diplomata.

Que não se espere variações muito grandes na obra de Soldati (Piccolo Mondo Antico, Malombra), ao menos no que se refere ao período em questão. Seus filmes sempre são bem cuidadas adaptações de obras literárias, em que os valores de produção e a direção de atores, geralmente escalados por sua eficácia na representação de tipos, alguns deles sem sequer a variação do ator (caso de  Tumiati, que também vive um ranzinza intransigente em Malombra). Do mesmo modo, suas atrizes parecem se espelhar no modelo das divas hollywoodianas, caso da Garbo de Isa Miranda ou de uma Alida Valli que vive uma versão mais domesticada e serena do papel mais célebre de Vivien Leigh. Dito isso, esse filme, mesmo que reproduzindo uma lógica de auto-sacríficio feminino de forma bem mais típica do que Malombra, cuja esperta protagonista nada possui de vítima, acaba sendo bem mais eficiente do que o referido filme anterior do realizador. O aspecto mecânico e superficial com que tudo é observado no outro, aqui se converte numa tocante representação das expectativas e sentimentos do mundo feminino completamente castradas pela repetição na figura do amante, do mesmo senso de oportunismo que já marcara a figura paterna, sendo a transformação do sensível e espirituoso jovem num amoral dândi calculista, uma nada sutil ironia para com o próprio idealismo dos amores que vencem todos os obstáculos sociais, ainda quando pela morte, que fora a marca do romantismo.  Tampouco o filme precisa do forte pictorismo do uso de cenários naturais ao fundo, sendo sua opção aberta pela maciça filmagem em estúdio e cenários estilizados, reforça ainda mais o asfixiante mundo no qual se movimentam seus personagens. É interesssante perceber o quão há de especular nas expectativas demonstradas da janela que dá acesso a um banco no qual a criada observa um encontro romântico entre Eugenia e Charles, depois a própria Eugenia observa sua criada com o futuro marido e, por fim, a criada observa o reencontro de Eugenia e Charles anos após. A seqüência final ressalta que a fidelidade a seu amor romântico levou Eugenia a solidão, fazendo ela parte da cerimônia que sagra o casamento de uma criada bem mais velha, feia e pobre que ela, enquanto numa igreja suntuosa é sagrado o casamento oportunista de Charles.  Sua narrativa é entremeada por cartelas que demarcam a passagem do tempo. Excelsa Film para Minerva Film. 100 minutos.

 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Filme do Dia: Der Traum des Bildhauers (1907), Johann Schwarzer

Filme do Dia: El Despojo (1960), Antonio Reynoso

Filme do Dia: Quem é a Bruxa? (1949), Friz Freleng