Filme do Dia: La Signora di Tutti (1934), Max Ophüls
La Signora di Tutti (Itália, 1934).
Direção: Max Ophüls. Rot. Adaptado: Curt Alexander, Max Ophüls & Hans Wilhelm,
baseado no romance de Salvatore Gotta. Fotografia: Ubaldo Arata. Música:
Daniele Amfitheatrof. Montagem: Ferdinando Maria Poggioli. Dir. de arte:
Giuseppe Capponi. Figurinos: Sandro Radice. Com: Isa Miranda, Memo Benassi,
Tatyana Pavlova, Friedrich Benfer, Franco Coop, Lamberto Picasso, Nelly
Corradi, Mario Ferrari.
A jovem Gabriella Murge, mais
conhecida como Gaby (Miranda), é expulsa da escola, após um professor, casado,
ter declarado que não poderia viver sem ela e ter se suicidado. Ela desperta a
paixão do aristocrata Roberto Nanni (Benfer), e cai nas graças de sua enferma
mãe, Alma (Pavlova). Porém, nada faz para ressistir aos avanços do pai de Nanni
e esposo de Alma, Leonardo (Benassi), que se apaixona perdidamente por ela
desde o primeiro momento em que a vê. Numa noite em que ele a seduz no jardim,
Alma, inquieta com a ausência de resposta de Gaby, que se deitava no quarto ao
lado, cai da escadaria com sua cadeira de rodas e morre. Unida a Leonardo desde
então, viajam por vários cantos do mundo, mas o retorno à mansão da tragédia,
suscita uma piora nos nervos já abalados de Gaby. E Leonardo, cada vez
dispensando maior tempo a cuidar dela e menos aos negócios, é defenestrado da
empresa, no mesmo momento em que recebe uma ligação de Gaby, que o abandona
para não mais interferir em seu trabalho. Leonardo é preso por ter utilizado
dinheiro da companhia para comprar outra residência e morar com Gaby. Essa se
muda para a França e lá inicia uma carreira de sucesso como atriz. Lançada com
sucesso uma biografia que deixa de fora praticamente toda a trajetória real de
Gaby, incluindo seu envolvimento com Leonardo, pois segundo seu agente (Coop) o
público não se interessa pela realidade, antes pela fantasia. Leonardo, decrépito
após os anos de prisão, vai até o local onde ocorre o lançamento e é atropelado
fatalmente, chamando a atenção da imprensa para o passado de Gaby. Porém, um
belo dia seu agente a encontra desfalecida em seu camarim. A leva para o hospital,
mas os esforços são em vão.
É surpreendente não apenas o completo
domínio do estilo cinematográfico, mesclando a volatilidade da câmera em
planos-seqüência longevos com cortes extremamente rápidos, o fora de foco com o
extremo primeiro plano, além da magnífica direção de atores, num fluxo de tirar
o folêgo por sua dinâmica, incapaz de ser sequer esboçado pelos mais talentosos
realizadores italianos contemporâneos que lidavam com material aproximado, tal
como Mario Camerini (Gli Uomini, Che
Mascalzoni!) e mesmo por outros realizadores à nível internacional. Ophüls
inicia com um prólogo que apresenta de forma sincrética toda a predadora
máquina comercial que gira em torno de uma estrela e o irônico resultado de
tante pressão, a tentativa de suicídio da mesma, que provoca o motivo para que
toda a narrativa seja detonada – as reminiscências de Gaby provocadas pelo gás
anestésico que lhe aplicam no hospital para onde é levada. Dentre os achados
visuais se encontra a bela contraposição de planos em movimento que alterna os
pontos de vista de Gaby e Leonardo, ele em um carro, ela num barco ou ainda a
originalidade das sobreimpressões de imagens que surgem e desaparecem em ritmo
distinto do convencionalmene demarcado pelas leis do cinema clássico. Para além
de tudo isso, o filme ainda empreende uma narrativa alucinada em seu ritmo de
modo bem mais interessante que tentativas efetuadas no final do século XX e
idos do seguinte, que apelam para a estética pós-moderna para revisitar o
universo do entretenimento (Velvet
Goldmine, Não Estou Lá). Os
mecanismos impiedosos que separam a fabricação de um mito e sua real
personalidade são enfatizadas de modo ambiguamente cínico, no qual Gaby ao
mesmo tempo provoca uma sucessão de desastres na vida dos homens por quem lança
sua atração, mas acaba igualmente tragada pela mesma teia, conseguindo ir além
tanto da clássica visão da estrela decaída de Crepúsculo dos Deuses (1950), de Billy Wilder, quanto da verdadeira
apresentação da face de sua protagonista no último momento, como a Lola (1981), de Fassbinder. Antecipa,
por sua vez, em décadas, a cisão entre personalidade social e íntima, cisão
essa explicitada num único momento, quando o que existe de efetivamente
perverso na aparente candura de Gaby se deixa observar- ela rindo do desespero
de todos para salvar Alma dos destroços de sua cadeira de rodas – em muitas das
heroínas de Chabrol. Boa parte do sucesso do filme se deve sem dúvida a
interpretação inspirada de Isa Miranda. Para efeitos comparativos, basta se perceber
o quão canhestra é tanto em termos de estilo assim como completa ausência de
ironia e auto-consciência do próprio gênero melodramático vem a ser outra
adaptação do mesmo autor, La Donna della
Montagna (1944), de Renao Castellani. Novella Film para Societá Anonima
Steffano Pittaluga. 97 minutos.
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