The Film Handbook#161: Carlos Saura
Carlos Saura
Nascimento: 04/01/1932, Huesca, Aragão, Espanha
Carreira (como diretor): 1956-
É talvez irônico que Carlos Saura, o mais famoso diretor espanhol dos anos recentes, tenha se movido dos retratos alegóricos pós-Guerra Civil Espanhola, realizados durante o regime censório de Franco, para filmes menos políticos, desde o advento da democracia. A despeito de sua relativa ausência de comprometimento social, no entanto, sua obra posterior continua ainda imbuída com um distinto senso de tradição hispânica.
Após estudar cinema, seguindo a realização do documentário Cuenca, Saura realiza sua estreia em longa-metragem com o rigoroso estudo realista da delinquência forjada pela pobreza, Los Golfos, utilizando atores não profissionais e culpando, por implicação, a natureza acanhada e repressora da Espanha contemporânea. Em A Caça/La Caza>1, examina as divisões morais de um país ainda assombrado pela experiência da Guerra Civil, através das personagens de três ex-soldados franquistas que brigam durante um dia de tiros em um vale deserto fotografado em sua luz clara. Hipocrisia, violência e neuroses sexuais surgem de tempos em tempos, assim como os frutos da repressão política, moral e religiosa: em Peppermint Frappé um médico, rejeitado pela mulher de seus sonhos, transforma, de forma fetichista, sua assistente no duplo dela, antes de assassinar a primeira; em O Jardim das Delícias/El Jardin de las Delicias, a família de um homem de negócios franquista no passado (tornado mudo após um acidente de carro) rememoram cenas de sua vida com o objetivo de fazê-lo lembrar do número de sua conta em um banco suíço; e, em Ana e os Lobos/Ana y Los Lobos, uma governante inglesa torna-se presa dos três filhos de uma dominadora família matriarcal, sendo os jovens homens representantes simbólicos da agressão militar, violência sexual e Igreja. O passado se torna pesado de fato sobre os personagens de Saura, com tramas misturando passado e presente, fantasia e realidade, de efeito intrigante. Mais memorável de todas, a heroína de oito anos de Cría Cuervos>2, recusa a acreditar que sua mãe e seu pai adúltero se encontram mortos; para além de ser um delicado estudo sobre a confusão da infância, o filme é uma assombrosa tese sobre o modo do passado afetar o futuro.
Após a morte de Franco, em 1975, Saura alternou filmes sobre problemas sociais e políticos com filmes de arte mais pessoalmente inspirados. Elisa, Vida Minha/Elisa, Vida Mia, a respeito da visita de uma filha a seu pai, que está escrevendo suas memórias a partir do ponto de vista dela; Olhos Vendados/Los Ojos Vendados lida com terrorismo e tortura e Depressa, Depressa/Deprisa, Deprisa>3, seguia as ações anárquicas e apolíticas de quatro delinquentes condenados. Com a ausência da censura franquista Saura podia apresentar sua visão desencantada da Espanha contemporânea mais diretamente: Depressa, Depressa chama a atenção através de sua narrativa de ritmo linear, suas interpretações naturalisticamente não sentimentais e um retrato de estilo quase documental da vida moderna suburbana. Ao mesmo tempo, Mamãe Faz 100 anos/Mama Cumple Cien Años, uma comédia no qual uma festa de aniversário simboliza as mudanças recentes na nova Espanha, evidenciam uma tendência continuada a alegorização.
A obra recente mais memorável de Saura tem sido em colaboração com o dançarino flamenco e coreógrafo Antonio Gades: adaptado de uma peça de Lorca, o balé Bodas de Sangue/Bodas de Sangre>4 (um ensaio elegantemente filmado) foi uma celebração da tradição ritual da arte; bem menos satisfatória, uma versão flamenca de Carmen embaralhava a distinção entre interpretação e vida real, enquanto Amor Bruxo/El Amor Brujo, musicado por De Falla, foi repleto de vida mas superficial. Tendo conquistado um público internacional, no entanto, Saura foi capaz de filmar uma narrativa épica da busca do conquistador Lope de Aguirre pela lendária terra sul-americana de El Dorado.
Apesar de Saura parecer ter perdido seu afiado senso político, é sempre improvável que seja capaz de realizar filmes que não digam respeito a problemática história da Espanha: a Guerra Civil e a ditadura de Franco tiveram um efeito duradouro sobre seu povo e suas memórias. Tal é sua perícia também, que em termos de interpretação e invenção visual, ele permanece na vanguarda dos diretores europeus.
Cronologia
Um devoto de Buñuel, Saura pode ser comparado com diretores espanhóis como Luis Berlianga, Victor Erice e Jaime Chávarri, os últimos dois tais como Saura, tem trabalhado com o produtor Elías Querejeta. Muitos dos filmes de Saura foram feitos em colaboração com sua companheira por longo tempo, a atriz Geraldine Chaplin.
Leituras Futuras
Out of the Past: Spanish Cinema After Franco (Londres, 1986), de John Hopewell.
Destaques
1. A Caça, Espanha, 1965 c/Alfredo Mayo, Ismael Merlo, Jose Maria Prada
2. Cría Cuervos, Espanha, 1975 c/Geraldine Chaplin, Ana Torrent
3. Depressa, Depressa, Espanha, 1980 c/Berta Socuellamos, Jose Antonio Valdelomar
4. Bodas de Sangue, Espanha, 1981 c/Antonio Gades, Cristina Hoyos
Texto: Andrew, Geoff. The Film Handbook. Londres: Longman, 1989, pp. 254-5.
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