Filme do Dia: Pele de Asno (1970), Jacques Demy
Pele de Asno (Peau
d’Âne, França, 1970). Direção: Jacques Demy. Rot. Adaptado: Jacques Demy,
baseado no conto de Paul Perrault. Fotografia: Ghislain Cloquet. Música: Michel
Legrand. Montagem: Anne-Marie Cotret. Dir. de arte: Jacques Dugied. Com:
Catherine Deneauve, Jean Marais, Jacques Perrin, Micheline Presle, Delphine Seyrig, Fernand Ledeux, Henri Cremiéux, Sacha Pitoeff.
Num reino encantado, o Rei (Marais)
vive em paz idílica com sua amada esposa (Deneuve), sendo sua paz abençoada por
um asno que defeca jóias. Porém, um belo dia toda essa harmonia é comprometida
pela doença e falecimento da rainha, que promete que o Rei somente deverá se
casar com outra mulher ainda mais bela que ela. A única mulher à altura da
Rainha, é a própria filha de ambos, a Princesa (Deneauve). Mesmo apaixonada
pelo pai, a Princesa não cede a seus pedidos por conselho de uma Fada (Presle).
Após inúmeros vestidos luxuosos como garantia de que casará com o Rei, a
Princesa pede a pele do asno mágico, fugindo para a floresta. Lá será objeto da
paixão de um Príncipe (Perrin), que desiste de toda sua vida mundana,
preocupando seus pais, por amor a pobre garota agora conhecida como Pele de
Asno. O Príncipe pede que ela lhe sirva um bolo e encontra um anel dentro do
mesmo. Afirma que se casará somente com a garota que possuir o dedo tão fino a
ponto de se adequar ao anel. Após todas as donzelas terem tentado, Pele de
Asno, revelando sua verdadeira identidade, une-se ao Príncipe, recebendo em
suas bodas o Rei, recém-casado com a Fada conselheira de Pele de Asno.
Mesmo fazendo uso de alguns dos
elementos que o tornaram célebre em produções como Os Guarda-Chuvas do Amor (1964) e Duas Garotas Românticas (1967) como a sutil ironia diante do
universo fantástico e romântico que descreve, as canções quase faladas de
Legrand (que compõem a totalidade dos diálogos de Os Guarda-Chuvas do Amor),o resultado final está longe de ser tão
inspirado quanto o primeiro. Falta vitalidade e as sutis referências ao
universo psicodélico contemporâneo à produção, como a insinuação do uso de
maconha por parte do jovem casal principesco e a utilização de cores
extravagantes, que também podem ser associadas ao universo onírico dos contos
de fadas, assim como o uso da câmera lenta em sequências que traem algo de
lisérgico, mesmo afastando-se positivamente dos excessos de outra fantasia com
a qual esta produção pode ser comparada, Lua
Negra (1975), de Louis Malle, tampouco possui a mesma inspiração dos
melhores momentos de Demy. Ou seja, o grande talento do cineasta se encontra
justamente quando soube construir um universo onírico a partir da mais banal
realidade cotidiana, como em Os
Guarda-Chuvas do Amor, ou mesmo quando se deteve em dramas de viés mais
realista, como O Segredo Íntimo de Lola
(1969). Aqui, tal talento se dilui no próprio universo fantástico que já é
comum aos contos de fadas, distanciando-se igualmente do talento inspirador de
Jean Cocteau, a quem certamente Demy pretende homenagear seja buscando fazer
seu próprio A Bela e a Fera (1946) ou
incorporando ao elenco o ator predileto de Cocteau, Marais, ou ainda na
utilização de um helicóptero que traz o Rei e sua nova esposa na seqüência
final. Essas referências apenas ressaltam a distância do talento com que
recursos plásticos cinematográficos, belos em sua própria singeleza, tais como
a câmera lenta ou a inventividade da inserção de objetos modernos em tramas
clássicas ganhou na obra de Cocteau, em filmes como A Bela e a Fera ou Orfeu
(1950). Do mesmo modo, o genuíno interesse do realizador por seus personagens
aqui parece dar lugar apenas a um auto-consciente pastiche. Marianne
Productions S.A/Parc Film. 100 minutos.
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