Filme do Dia: Cría Cuervos (1975), Carlos Saura

 



Cría Cuervos (Espanha, 1975) Direção e Rot. Original: Carlos Saura. Fotografia:Teo Escamilla.  Música: Federico Mompou & José Luis Perales. Montagem: Pablo G. del Arno. Dir. de arte: Rafael Palmero. Figurinos: Maiki Marin. Com: Ana Torrent, Geraldine Chaplin, Mónica Randall, Florinda Chico, Conchita Pérez, Mayte Sanchez, Héctor Alterio, Josefina Díaz.

Ana (Torrent) vive com a irmã mais velha, Irene (Pérez) e mais nova Maite (Sanchez) com uma tia, Paulina (Randall), que as aborrece, a avó (Díaz) que não consegue mais falar, e a empregada Rosa (Chico), numa mansão. O universo de Ana precocemente se depara com várias mortes. A da mãe (Chaplin), de uma doença letal. A do pai (Alterio), encontrado morto por ela, após ter esse encontrado uma amante, Amelia (Miller). E também seu pequeno porquinho da índia de estimação. Constantemente assoberbada por pesadelos com a mãe, Ana se lembra que a mãe uma vez dissera ser bicarbonato um poderoso veneno. Por piedade, oferece um pouco a avó, que afirma que gostaria de morrer.

A partir da perspectiva infantil, Saura atinge um olhar para o militarismo espanhol nos anos da ditadura (período de sua melhor obra, das quais esse é um dos melhores representantes). E o trabalho de Torrent (que já havia realizado antes O Espírito da Colméia, com 3 anos menos), excepcional, consegue traduzir como poucas atrizes infantis, seu testemunho do universo doméstico – a maior parte das ações correntes ocorre aparentemente em período de férias escolares, o que justifica essa abordagem intra-muros. Dentre os momentos mais expressivos se encontra a brincadeira entre as três irmãs, em que as duas mais velhas fazem uma pantomima do pai autoritário, com bigode desenhado e quepe militar e tudo, e da mãe vitimizada, sendo Maite a empregada. E um, certamente, antológico, em que as três crianças dançam ao som de Por Que Te Vás?, canção juvenil que também é ouvida em dois outros momentos do filme e se torna emblemático de Ana, incluindo sua melancolia. A morte do pai militar de Ana pode ser associada a então recente morte do ditador Franco. A introjeção de uma cultura autoritária e mórbida pelas crianças, sobretudo Ana, parece já antecipar os reflexos ditatoriais sobre as gerações futuras. De fato, tais reflexos também possuem como voz a própria Ana vinte anos mais velha, vivida pela mesma Chaplin que vivenciara sua mãe. Destaque para o momento em que a câmera passeia algo errática por uma visão aérea das cercanias da mansão onde a trama se desenvolve, incluindo a própria. E igualmente para a impressionantemente bela e soturna fotografia, bem distante de qualquer padrão conhecido habitual. Elias Querejeta Producciones Cinematográficas S.L. 110 minutos.

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