Filme do Dia: Let There Be Light (1946), John Huston
Let
There Be Light (EUA, 1946). Direção: John Huston. Podridão. Original: John Houston
& Carlos Kaufman. Fotografia: Stanley Cortez, John Doran, Lloyd Fromm, Joe
Jackman & Jorge Smith. Música: Dimitri Tiomkin.
A suntuosidade de seu estilo visual,
marcado por elegantes e fluidos movimentos de câmera muito dificilmente entra
em acordo com o que uma cartela inicial afirma sobre nada ser encenado nesse documentário
sobre vítimas de traumas psicológicos da Segunda Guerra Mundial que, segundo o
próprio Huston, jamais teria exibição pública. Muito menos ainda quando
apresenta “flagrantes” dos incômodos sonhos noturnos que acompanham os soldados
internos no hospital. As sessões de
verdadeiros interrogatórios diante de ao menos duas câmeras (pois é utilizado
um sistema de plano-contraplano) que se sucedem com os soldados certamente não
parecerão um primor em termos de abordagem do universo sensível dos mesmos – um
soldado negro chora, levanta-se e diz que não se encontra em condições de falar
e depois retorna, outro demonstra seu incômodo através dos próprios movimentos
da face – e talvez sugiram uma aproximação, por vezes, com a técnica utilizada
em Shoah para as entrevistas, ainda
que sem o recurso de retornar ao local de onde ocorreram os fatos traumáticos.
Muitos gaguejam quando tentam recordar situações. O tom da imagem é
predominantemente esbranquiçado. O que o documentário, em última instância,
parece sugerir é que seus soldados não foram abandonados à própria sorte após o
retorno, tal como se encontra ilustrado na bateria de exames médicos físicos e
mentais realizados, incluindo tecnologias voltadas para a questão da apreensão
da qualidade do sono. Outros exames são
de cunho mais simbólico-subjetivo, como os psicotestes efetuados com imagens
para os pacientes descreverem o que representam as mesmas. O que o filme
involuntariamente acaba sendo, igualmente, é um flagrante in loco de experiências com drogas, como surge num paciente que o
narrador havia afirmado possuir um tipo de histeria que o impedia de andar,
embora sem possuir qualquer sequela física que o justificasse. Sobre a droga em questão é informado que ela
auxiliará no tratamento da hipnose, com o médico indagando o que ocorrera com
ele no dia em que ele começou a sentir os referidos sintomas. Não satisfeito em apresentar todo o processo
de sugestionamento do psiquiatra ao paciente dopado, o médico ainda faz com que
ele comece a andar, para comprovar que não existe nada demais com suas pernas,
mesmo que o narrador se apresse a emendar que “isso não quer dizer que sua
neurose esteja curada” pois requer tempo, evitando criar expectativas para
“curas milagrosas”. Posteriormente veremos o mesmo médico numa sessão de
hipnotismo com um paciente que perdeu toda sua memória e não sabe sequer como
se chama. O médico então consegue extrair detalhes da batalha de Okinawa
vivenciados pelo paciente. Doutro
paciente, que mal consegue pronunciar uma palavra, após aplicada uma droga,
espanta-se por estar conseguindo novamente falar. O médico sempre a procura do
“trauma” que provocou a situação do paciente, de forma quase tão esquemática
quanto as ficções contemporâneas (como Quando
Fala o Coração ou Um Amor em Cada Vida). Há uma sessão
devotada a terapia ocupacional, em que alguns pintam, enquanto outros, segundo
o próprio narrador, sentem-se melhor realizando trabalhos mecânicos e outros
que envolvem minúcias, como peças minúsculas de um protótipo minúsculo de um
carro. Segue-se uma sessão de terapia de
grupo, onde observamos alguns dos rostos já conhecidos de cenas anteriores,
como o soldado negro que chorara diante da câmera e o soldado que não conseguia
andar. Ao final, quando apresenta os pacientes quando chegaram e no momento em que
o filme deixa de acompanha-los, fica evidenciado de forma quase grotescamente
simplória suas melhoras. Contraposição
que também é enfatizada pela trilha musical, com música triunfante (não por
acaso a cargo de um dos mais célebres compositores para cinema de ficção) ornando
a situação atual de jogo de beisebol e melancólica e soturna para o passado.
Narrado pelo pai do cineasta, Walter Huston. National Film Registry em 2010. U.S. Army Pictorial Services. 58
minutos.
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