The Film Handbook#114: Erich von Stroheim

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Erich von Stroheim
Nascimento: 22/09/1885, Viena, Áustria
Morte: 12/05/1957, Paris, França
Carreira (como diretor): 1918-1933

Mesmo apesar do pouco que sobreviveu dos filmes de Erich Oswald Stroheim hoje existir na forma que ele originalmente pretendeu, ainda se torna imediatamente evidente que ele foi um dos melhores diretores da era muda. Uma perfeccionista obsessivo cujas extravagâncias repetidamente o levaram a entrar em conflito com os produtores, ele foi uma figura crucial tanto no desenvolvimento do naturalismo cinematográfico quanto um moralista soberbamente cínico, cuja insistência na sordidez da luxúria, avareza e hipocrisia (sobretudo entre os ricos desocupados) pode também ter contribuído para o fim de sua carreira como realizador.

A despeito de suas pretensões posteriores de ter sido proveniente de um meio aristocrático e militar, Stroheim nasceu numa família de comerciantes judeus de classe média em Viena. Emigrando para a América por volta dos 20 anos, ele passaria por uma diversidade de pequenos empregos antes de começar a atuar em pontas nos filmes em 1914. Dentro de pouco tempo, estabelecer-se-ia como um ator e consultor militar para Griffith e John Emerson, trabalhando em O Nascimento da Nação e Intolerância, dentre outros filmes; por volta de 1917, sua postura rígida, riso sardônico e agressiva virilidade lhe proporcionaram diversos papéis como oficial prussiano e lhe impingiram uma reputação do "homem que você ama odiar". De fato, em 1918, em sua estreia como diretor, Maridos Cegos/Blind Husbands, ele interpretou um tenente austríaco, cuja tentativa de sedução da solitária esposa de um turista americano é descrita de forma incomumente sofisticada e detalhadamente erótica. The Devil's Passkey - hoje perdido - aparentemente foi uma variação igualmente bem sucedida no tema do triângulo amoroso; Esposas Ingênuas/Foolish Wives>1, no entanto, foi a primeira obra-prima madura de Stroheim.O filme foca em um impiedosamente manipulativo russo cujos modos nobres e ares de riqueza servem como faixada tanto para suas atividades de falsificação quanto seus insaciáveis, e possivelmente perversos, desejos sexuais; o filme foi uma ácida comédia de costumes cujos impulsos morais e profundidade psicológica derivam da engenhosa e até então sem precedentes observação precisa dos gestos; ao mesmo tempo, essa intimidade conquistava uma dimensão épica e universal através de uma recriação exata e fetichista de cassinos, hotéis e cafés de Monte Carlo, a acusação das maldades individuais abraçando, portanto, uma sociedade inteira de alto padrão de vida. Tão custosa foi sua paixão pelo verossímil, no entanto, que o produtor Irving Thalberg ordenou que o filme fosse remontado. Nem faria o diretor melhor com Carrossel/Merry-Go-Round, do qual seria substituído no meio das filmagens; nesse ponto ele abandonou a Universal por Goldwyn.

Ao contrário de sua obra anterior, Ouro e Maldição/Greed>2 foi uma história distintamente americana, um épico surpreendente de dez horas adaptado do romance McTeague, de Frank Norris; mas apesar de Stroheim ter abandonado os locais de diversão europeus pelas ruas de San Francisco, seu olho para a minúcia, por apresentar detalhes e pela lassitude moral foi tão profundo quanto antes, com o dinheiro novamente sendo tido como a raiz de todos os males. Filmado em locações (inculindo uma devastadoramente irônica e sombria cena final no Vale da Morte, no qual dois antigos amigos que se tornaram rivais mortais desde a vitória na loteria morrem algemados um ao outro no escaldante deserto) o filme foi um triunfo de atuações incomumente sutis, composições estranhas (uma cerimônia de um casamento malfadado é atravessado pela passagem de um funeral ao fundo) e humor negro. Infelizmente,  no entanto, durante a produção do filme a companhia Goldwyn se tornaria MGM, cujo novo executivo (novamente Thalberg) reduziu os 42 rolos de Stroheim a 10. Ainda assim, permanece uma obra-prima.

Como a provar a si próprio de que era capaz de honrar compromissos, Stroheim permaneceu na MGM para realizar o extravagante, porém inócuo romance da Ruritânia A Viúva Alegre/The Merry Widow. Então, para Marcha Nupcial/The Wedding March>3 ele mais uma vez voltou a suntuosa extravagância visual, sua história em duas partes, de um príncipe habsburgo tentado a se afastar da noiva com o qual oficialmente irá casar e se aproximar de uma inocente e bela plebeia, ambientado em uma Viena imaculadamente recriada, inspirada nas próprias memórias de juventude de Stroheim. A sátira grotesca ganhou novamente proeminência na descrição desagradável dos fúteis e avaros membros da casa real; ao mesmo tempo um lado lírico, e mesmo romântico do pessimismo moral de Stroheim se manifestou ele próprio nas cenas de amor ambientadas em iluminados pomares de macieiras brilhando em flores, ainda mais efetivos por serem contrapostos com as escandalosamente hedonísticas cenas do bordel. Uma vez mais, a paixão de Stroheim pela acuidade histórica da arquitetura, figurinos e cenários provou ser sua ruína; a segunda e completamente sombria segunda parte foi mutilada e ganhou lançamento restrito. Igualmente em Minha Rainha/Queen Kelly>4,  o romance ainda mais condenado entre uma garota de convento e o vadio amante de uma enciumada rainha, as sequencias descrevendo a sórdida heroína e seu casamento forçado (sobre o leito de morte de sua tia alcoviteira) com um devasso, aleijado e velho alcoólatra foram julgadas tão repulsivas pela estrela e produtora do filme, Gloria Swanson, que Stroheim foi demitido após sua finalização, e um final mais convencional o substituiu. Ainda assim, a concepção original de Stroheim é ainda evidente no erotismo sutil da corte dos amantes, no equilíbrio entre intimidade e tom épico e, destacadamente, na cena em que a rainha, louca de raiva, corre por entre os corredores elegantes do palácio chicoteando sua jovem rival.

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Morte no Vale da Morte: o resultado inevitável da ganância (Greed) humana, como imaginada por Stroheim para o que pretendia ser um épico de dez horas

A carreira de Stroheim como diretor estava quase acabada: seu primeiro filme sonoro, Aô, Belezas/Walking on Broadway foi grandemente refilmado por outras mãos e nunca lançado. A partir de então ele contribuiu ocasionalmente em roteiros (de forma mais memorável, talvez, em A Boneca do Diabo/The Devil Doll de Browning), porém na maior parte das vezes se restringiu ao trabalho de ator: seus melhores papéis sendo  o tipicamente autoritário diretor de cinema em A Esquadrilha Perdida/The Lost Squadron, como comandante do campo de prisioneiros alemães em A Grande Ilusão/La Grand Illusion de Renoir, como Rommel em Cinco Covas no Egito/Five Graves to Cairo de Wilder e como Max, o mordomo, antigo marido e diretor de Swanson em Crepúsculo dos Deuses/Sunset Boulevard, que de forma bastante ambivalente inclui um trecho de Minha Rainha.

A combinação de naturalismo e melodrama de Stroheim, para não mencionar o seu estilo de câmera estática e montagem, contribuíram para o progresso e a linguagem da técnica cinematográficas. Mais importante, seus aspectos menos salutares tanto da psiquê individual quando da sociedade em geral certificam que seus filmes conservam duradoura sofisticação e modernidade.

Cronologia
O realismo e a complexidade moral de Stroheim constituem considerável avanço em relação à sensibilidade puritana do século XIX de Griffith. Em suas pretensões a um erotismo e humor europeus pode ser agrupado com Lubitsch e Von Sternberg, enquanto sua influência no futuro do cinema foi imensa.

Leituras Futuras
Stronheim (Londres, 1967), de Joel Finler. Stroheim: A Pictorial Record of His Nine Films (Nova York, 1975), de Herman G.Weinberg. The Complete Greed (1972) e The Complete Weddiing March (1974) proporcionam reconstruções fotográficas de sua obra hoje irremediavelmente perdida.

Destaques
1. Esposas Ingênuas, EUA, 1921 c/ Stroheim, Maude George, Mae Busch

2. Ouro e Maldição, EUA, 1923 c/Gibson Gowland, Zasu Pitts, Jean Hearsholt

3.Marcha Nupcial, EUA, 1926-28, c/Stroheim, Fay Wray, Maude George

4. Minha Rainha, EUA, 1928 c/Gloria Swanson, Walter Byron, Seena Owen

Texto: Andrew, Geoff. The Film Handbook. Londres: Longman, 1989, pp. 300-2.

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