Filme do Dia: Casa de Bambu (1955), Samuel Fuller

A Casa de Bambu (House of Bamboo, EUA, 1955). Direção: Samuel Füller. Rot. Original: Harry Klainer & Samuel Füller. Fotografia: Joseph MacDonald. Música: Leigh Harline. Montagem: James B. Clark. Dir. de arte: Addison Hehr & Lyle R. Wheeler. Cenografia: Stuart A. Reiss & Walter M. Scott. Figurines: Charles Le Maire. Com: Robert Stack, Robert Ryan, Shirley Yamaguchi, Cameron Mitchell, Brad Dexter, Sessue Hayakawa, Biff Elliot, Sandro Giglio.
Eddie Kenner (Stack) é um sargento do exército americano que se infiltra no grupo criminoso de Sandy Dawson (Ryan), responsável pela morte do marido de Mariko (Yamaguchi). Mariko envolve-se com Eddie e ambos passam a residir na mansão de Dawson. Após participar de uma operação bem sucedida com a quadrilha, Eddie faz com que Mariko entregue a um policial a estratégia para o próximo golpe do grupo. Os criminosos descobrem antecipadamente, e Dawson mata outro membro da gangue, Griff (Mitchell), que havia sido afastado das atividades por seu temperamento truculento após ser deixado em segundo plano com a chegada de Kenner. Sendor alertado sobre o verdadeiro informante, Dawson planeja uma nova ação visando que Kenner seja morto pela polícia japonesa.
Fazendo uso do habitual technicolor extravagantemente belo do período e da tela larga ao contrário da maior parte das produções mais modestas e em p&b do realizador, esse filme, tido como a primeira ficção norte-americana a ser filmada em locações no Japão, antecipa algo das obscuras tramas onde a paranoia persecutória e complôs políticos ou organizações secretas viriam a se tornar o cerne de produções como as de Frankenheimer (Sob o Domínio do Mal, O Segundo Rosto) nos anos 1960 e de Pakula (A Última Testemunha), na década seguinte. Aliás, é justamente quando as cartas não estão exatamente postas e o mistério impera que o filme se torna mais interessante. A partir de então, percebe-se que as atividades do grupo criminoso se enquadram menos nos complôs megalomaníacos de Frankenheimer ou Pakula e se aproximam mais do thriller criminal e mesmo noir, ainda que partindo de um estilo visual completamente diverso. Porém, mesmo quando o espectador se sente mais confortável em seguir convenções mais facilmente identificáveis, Fuller consegue impregnar seu filme com certa atitude relativamente blasée e sem o mesmo alarde de um Hitchcock, embora a monumentalidade da forma que é filmado a habitual tensão entre uma situação dramática e o frouxo relaxamento, diversão e inocência do entorno seja visivelmente inspirada nos filmes dele (e, como em Pacto de Sangue, filmado em um parque de diversões). Bem mais discreta igualmente é a participação da trilha sonora. Provavelmente deve ter servido de inspiração maior para Pakula do que o próprio Hitchcock. Füller parece drenar o que há de excessivo na interpretação dos atores de Hitchcock para um magistral trabalho de câmera que mesmo sendo virtuoso ao apresentar por vezes dois ou mais ambientes na mesma tomada, sempre é posto à serviço da ação. Ele não se exime em tirar partido do “colorido local”, mas o faz igualmente com relativa descrição, mesmo quando o herói vivido por Stack, sobe ao teto de um edifício onde artistas nipônicos se encontram devidamente fantasiados com suas extravagantes e coloridas roupas ou ainda deixe em segundo plano aspectos convenientemente interessantes de Tóquio que tão bem se adéquam à fotografia, profundidade de campo e movimentos de câmera do filme. O destaque no elenco fica para o contido e calculista vilão encarnado por Robert Ryan. Inicia com uma locução over que destaca o fato do filme ter sido rodado no Japão. Aliás, o frescor das imagens filmadas em locação, com os atores circulando pelas ruas de Tóquio, ao menos em comparação com as estratégias habituais empregadas por Hollywood, deve ter sido um dos fatores que chamou a atenção de Godard, que radicalizaria tal estratégia já a partir de seu filme de estréia, Acossado. Há um viés subliminar homo-erótico entre herói e vilão pretendido por Fuller que pode passar perfeitamente despercebido e, inclusive, servir como razoável justificativa para que Dawson não pretenda dar cabo de Eddie à sangue-frio ou por suas próprias mãos, como fizera com Griff. 20th Century Fox Film Corp. 102 minutos.

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