Dicionário Histórico de Cinema Sul-Americano#105:Realizadores Exilados Chilenos

 


REALIZADORES CHILENOS NO EXÍLIO. Desde setembro de 1973, quando o General Augusto Pinochet liderou um golpe militar contra o presidente marxista eleito Salvador Allende, assassinando- no processo, o Chile vivenciou um reinado de terror, durante o qual mil e duzentas pessoas foram assassinadas, incluindo a atriz de 25 anos Carmen Bueno e o cinegrafista de 27  Jorge Müller; mais de 25 mil pessoas foram presas; e outras 200 mil partiram para o exílio. Quase todas as figuras de destaque do cinena chileno à época, incluindo Pedro Chaskel, Helvio Soto e Rául Ruiz, estiveram entre os que abandonaram a sua terra natal, enquanto Miguel Littín e Patricio Guzman terminaram seus filmes no exílio. Todas estas figuras, e algumas outras poucas que desenvolveram carreira no estrangeiro, como Valéria Sarmiento e Gustavo Justiniano, retornaram ao Chile após 1990, quando eleições democráticas ocorreram, e alguns destes retornaram para viver no país. Porém, muitos dos realizadores exilados escolheram por não retornar, mesmo podendo se relacionar com sua terra em seus filmes. 

Em 1987 Zuzana Pick escreveu um artigo sobre "dez anos de exílio (1973-83)", no qual listou numerosos realizadores chilenos, alguns dos quais trabalhavam na Alemanha - Álvaro Ramírez, Gaston Ancelovici, Orlando Lübbert e António Skármeta - um casal na Suécia, Claudio Sapiain e Luiz Roberto Vera, e exemplos isolados em outros países: Pablo de la Barra, na Venezuela, Leonardo de la Barra na Bélgica, Angelina Vásquez na Finlândia, Reinaldo Zambrano na Suíça, e Sebastián Alarcón na Rússia. A França foi um popular refúgio. Ruiz e Sarmiento passaram a maior parte de seu tempo em Paris, enquanto o que Pick chama de terceira geração de exilados chilenos se inicia: aqueles que se encontravam ou "marginalmente envolvidos no cinema antes de 1973" ou que estudaram em escolas de cinema estrangeiras - Justiniano, Patricio Paniagua, e o videoartista Jorge Lübbert. Com suas instituições cinematográficas bancadas pelo estado, Cuba foi uma escolha óbvia para realizadores exilados de esquerda. Guzmán e Littín foram inicialmente para lá, e Chaskel permaneceu muito tempo após findar a montagem de La Batalla de Chile (1974-79) para Guzmán.

O Canadá aceitou numerosos refugiados políticos do Chile, incluindo realizadores. Leutén Rojas dirigiu I Remember, Too, como forma de tentar refletir sobre o passado violento enquanto negociavam à integração a uma nova sociedade. Como em outros países, onde recursos e equipamentos se tornaram disponíveis aos realizadores exilados, o National Film Board of Canada (NFB), baseado em Montreal, foi particularmente receptivo. Il n'y a pas d'oubli (There is no Oblivion, 1975) foi um longa em episódios dirigido por três exilados chilenos, Jorge Fajardo ("Steel Blues", em inglês, sobre os esforços de um homem para conseguir emprego), Rodrigo Gonzalez ("J'explique Certain Choses", em espanhol, sobre um grupos de emigrados chilenos) e Marilú Mallet ("Lentement") sobre os problemas que uma jovem, Lucia, se depara, ao tentar se integrar. Marilú continuou prolífica realizadora e frequentemente encontrou apoio do NFB/OFB, algumas vezes para obras reflexivas sobre o passado chileno, tais como La Cueca Sola (o nome de uma dança chilena, 2003), um documentário multiplamente premiado que mescla a vida de cinco chilenas, "heroínas da democracia", com a história chilena. Muitos dos filmes são também bastante pessoais, incluindo talvez o seu melhor, Journal Inachevé (1982), um ensaio cinematográfico autobiográfico que combina documentário e ficção, para apresentar o dilema de uma imigrante chilena (ela própria), tentando assegurar sua individualidade, em um ambiente onde as experiências culturais e políticas não são compartilhadas pelos outros. Mallet sempre fez com que seus filmes sejam tanto diaspórico-chilenos quanto feministas. 

Patricio Henríquez foi um diretor de tv chileno que se instalou em Montreal após o golpe de estado de 1973. Ele também realizou filmes sob o guarda-chuva da NFB/OFB, incluindo The Dark Side of the White Lady (2006), longa documental sobre um navio chileno que era utilizado para detenção e tortura de dissidentes após o golpe, e Under the Hood, a Voyage into the World of Torture (2008), laureado com o Prêmio Jutra da academia da indústria cinematográfica quebequense. De 1980 a 1993, trabalhou para a Rádio-Quebec, dirigindo dúzias de programas para a revista de notícias televisiva Nord-Sud. Após fundar sua própria companhia produtora, Macumba International (com Robert Cordelier e Raymond Provencher), dirigiu dois importantes documentários em co-produção com o Chile, 11 de Septiembre de 1973: El Ultimo Combate de Salvador Allende (1998), que ganhou uma dúzia de prêmios internacionais, e Imageries de una Dictatur (1999), que venceu seus primeiros prêmios nos festivais internacionais de Biarritz e Bombaim, e lhe assegurou seu primeiro Jutra.

Há hoje uma ainda mais jovem geração de realizadores exilados chilenos que não eram sequer nascidos quando Pinochet tomou o poder, mas reivindicam o passado coletivo. Dentre estes se encontra o residente em Montreal Eduardo Menz, cujo curta Las Mujeres de Pinochet (2007), venceu o prêmio La Rendez-Vous du Cinema Québécois, em 2008. E é ainda mais fácil para os chilenos realizar filmes ou programas de televisão que lidam com os dias sombrios do passado de seu país vivendo fora da América do Sul, e realizadores exilados chilenos continuam a realizar um número significativo de obras poderosamente críticas. 

Texto: Rist, Peter H. Historical Dictionary of South American Cinema. Plymouth: Rowman & Littlefield, 2014, pp. 152-53.

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