Filme do Dia: O Homem Invisível (2020), Leigh Whannell
O Homem Invisível
(The Invisble Man, EUA/Canadá/Austrália, 2020). Direção: Leigh Whannell.
Rot. Adaptado: Leigh Whannell,a partir do romance de H.G. Wells. Fotografia:
Stefan Duscio. Música: Benjamin Wallfisch. Montagem: Andy Canny. Dir. de arte: Alex Holmes. Cenografia: Katie
Sharrock. Figurinos: Emily Seresin. Com:
Elisabeth Moss, Aldis Hodge, Storm Reid, Harriet Dyer, Michael Dorman, Oliver Jackson-Cohen,
Benedict Hardie, Renée Lim, Brian Meegan.
Cecilia
(Moss) consegue driblar quase todo o fortíssimo aparato de segurança da mansão
do marido abusivo, Adrian (Jackson-Cohen) e fugir de casa. Ela se refugia na
casa do melhor amigo, James (Hodges), que possui uma filha adolescente, Sydney
(Reid). Traumatizada com a experiência, Cecilia mal consegue ter coragem de por
os pés fora da casa do amigo. Aos poucos, no entanto, a normalidade parece
retornar, e sua irmã, Emily (Dyer) traz a notícia do suicídio de Adrian. E,
pouco depois, ela recebe um convite para comparecer ao escritório do irmão de
Adrian, Tom (Dorman), que cuida da polpuda herança do irmão, que deixou 5
milhões de dólares para Cecilia. Logo, no entanto, Cecilia perceberá que Adrian
continua a perturba-la, isolando-a de todo o seu círculo de amizades, fazendo
com que Sidney pense que Cecilia a agrediu e Emily crê que Cecilia mandou o
e-mail. Após um crime tido como tendo sido praticado por ela, Cecilia é levada
a uma prisão para presos perigosos. Quando já se encontra desacreditada por
todos, é visitada por Tom, com uma proposta indecente, a mando de seu irmão. Lá
sabe que se encontra grávida e Adrian ajuda a livrá-la da prisão, promovendo um
verdadeiro massacre. Cecilia decide ir a
casa em que morara com Adrian, descobrindo o segredo de sua invisibilidade e seu
próximo alvo: Sydney. Desesperada ela conta tudo a James.
Essa
atualização da história de Wells (embora não seja citado nos créditos), cuja
versão cinematográfica mais lembrada é a dirigida por James Whale, nos idos da
década de 1930, procura se adequar o mais que pode às sensibilidades
contemporâneas. Assim, o vilão é um homem branco abusivo, de espancar e
torturar psicologicamente sua mulher. O melhor amigo da esposa é negro.
Inverte-se, inclusive, a clássica toada da casa branca ameaçada por índios ou
negros, cuja tradição remonta ao primeiro filme de Griffith (As Aventuras de
Dollie, no caso quem pratica a desestabilização da família branca burguesa
sendo um cigano), passando por referências do cinema clássico (Rastros de Ódio). Aqui é uma família “burguesa” negra – embora se trate de um
policial, a sua casa seria, no mínimo, uma cópia aproximada da classe média
norte-americana, até para provocar algum nível de identificação com duas
plateias de poder aquisitivo e inserção cultural em geral bastante distintos –
que se vê ameaçada. E, como se espera, existe um primeiro momento, mais próximo
do filme de suspense, em que a câmera da conta, secundarizada pela montagem e a
interpretação de Moss, na tradição que vai de Sangue de Pantera e passa
por Tubarão, seguida por um segundo momento mais tipicamente do filme de
ação, com tiros, mortes, batidas de carro e uma versão do personagem de Wells
mais próximo, imageticamente, de O Exterminador do Futuro. Embora ambos
os momentos sejam extensivamente clichês, é desnecessário dizer que o filme se
sai de longe melhor em sua primeira metade do que naquele em que a insegura
Cecilia se transforma numa nova versão da Ripley de Sigourney Weaver. No
limite, pode-se afirmar que seu modo de agir se adequa ao “modo suspense” ou ao
“modo ação”. Em meio a sensação de déjà vú, não deixa de haver momentos
surpreendentes, em termos de mortes – sendo que, inversamente à realidade, a
carne negra é não apenas a menos vitimada, como parece imune à própria morte,
tal como um personagem de animação da Warner. Mesmo que a interpretação de Moss
esteja longe de ser algo excepcional, torna-se muitos degraus acima do restante
do elenco, sobretudo os irmãos . Em ao menos uma cena, a que Cecilia vai
acordar Sydney (óbvia referência a capital da Austrália, onde essa produção foi
filmada em boa parte) e ficamos com a câmera mostrando a cozinha vazia por um
bom momento, parecemos nos deparar com um cacoete modernista bastante utilizado
na década de 1960 (nos filmes de Bressane, por exemplo), sendo que aqui, claro,
possui um objetivo dramático mais antenado com a trama, a de provocar suspense
e da iminência de algo trágico a ocorrer.
Blumhouse
Prod./Goalpost Pictures/Screen Australia/Australian Government/The New South
Wales para Universal Pictures. 124 minutos.
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