Filme do Dia: Marionettes (1934), Yakov Protazanov
Marionettes (Marionetki, União Soviética, 1934). Direção: Yakov Protazanov &
Porfiri Prodobed. Rot. Original: Yakov Protazanov & Vladimir Shvejtser. Fotografia:
Pyotr Yermolov. Música: Leonid Polovinkin. Dir. de arte: Sergei Kozlovski &
Moisei Levin. Com: Anatoli Ktorov, Nikolai Radin, Valentina Tokarskaya,
Konstantin Zubov, Sergey Martinson,
Mikhail Klimov, Sergey Tikhonravov, Leonid Leonidov, Igor Arkadin.
Com um parlamento
em crise derivada da crise econômica, e o temor da influência marxista da União
Soviética, Buferia resolve apostar no resgate da Monarquia, na figura de seu
avoado e fútil aristocrata, Do (Ktorov), repleto de dívidas até então e morando
no exílio. Quando se desloca de avião de volta à terra natal, Do passa mal e acidentalmente
cai pela janela da avião em um lago. Seu valete, Sol (Martinson) é quem é tido
como o príncipe e ungido ao trono. Quando esse chega a corte, a confusão se encontra
posta.
A construção da
narrativa e sua manipulação (aqui nitidamente ideológica) é a todo momento
evocada com a história não apenas tecendo paralelos com a arte dos títeres,
como também sendo convencionada
literalmente ser a representação de tal peça a partir de um narrador interno,
que vem a ser o mestre de cerimônias do espetáculo de bonecos, e que também tem
o direito de interrompê-la bruscamente, como de fato o faz. O que vale também
com números musicais, no estilo de revista, mas com letras ironicamente
políticas e até mesmo não faltam
referência à geometria humana que o contemporâneo norte-americano Busby Berkeley explorava em seus números musicais. Se poucos momentos podem ser tidos
como espontaneamente cômicos, há uma visível engenhosidade no modo como
Protazanov arregimenta representações dos blocos ideológicos do momento e
quando da crise parlamentar de sua ficcional Buferia chega ao auge, observamos
o discurso de cada uma das facções políticas, inclusive a socialista. O filme
faz uso de eventos políticos recentes, como a quebra da bolsa de Wall Street e
a ascensão do nazi-fascismo sem fazer referência direta a nenhum dos partidos e
movimentos políticos aqui satirizados. Não falta igualmente uma oportunista
igreja que se associa rapidamente com as lideranças fascistas para buscar a
solução no retorno à Monarquia. A solução
visual buscada na constante troça que é feita da elite religiosa inclui uma
representação completamente galhofa do que a seu modo – sério-dramático – já
havia sido vítima da crítica de um Eisenstein (Outubro). Aqui todos os objetos ritualísticos são segurados da
forma mais tosca e menos imponente possível, pelo rei que igualmente se torna
líder religioso máximo, servindo como possível leitura jocosa da cena referida
no próprio clássico de Eisenstein igualmente. Algo como se Oscarito ou Totó
houvessem se apoderado da representação de Pedro I ou de Vitório Emanuel
respectivamente. Em sua aberta encenação que, tal como os vanguardistas da
década anterior, não oculta sua elaboração discursiva, os personagens são
representados pelas notas musicais – sendo que o Fa, fica com o fascista. Não
falta a ferina misoginia habitual do realizador nos comentários de mulheres
completamente cegas pelo poder, sonhando com o apatetado valete-barbeiro –
aliás não seria nada impossível que Chaplin tenha tomado conhecimento dessa
produção e retrabalhado alguns de seus elementos em seu próprio comentário
político posterior, O Grande Ditador.
Felizmente Protazanov foge da grandiloquência ocasional desse último e se não
consegue elaborar um fecho convincente ou ideologicamente pertinente para sua
produção, isso não necessariamente é algo negativo, até mesmo porque somos
induzidos a nos identificarmos, até certo pont, com o personagem do monarca que teve seu trono
usurpado por um valete e somos poupados da pieguice humanista abstrata. Em seu
fecho, a fala final do narrador é repleta novamente de brilhante
espirituosidade, pois se ao mesmo tempo que assume que a escala de notas do
qual são compostos principais, tais como as representações aqui postas, é a
mais simples possível, sua mistura pode gerar obras – tanto musicais quanto
cinematográficas – mais complexas, o que bem poderia servir como um comentário
sobre a impossibilidade de fazê-lo em um meio artístico cada vez mais
estritamente vigiado. Mezhrabpomfilm. 88 minutos.
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