Filme do Dia: O Corpo Ardente (1966), Walter Hugo Khouri
O Corpo Ardente
(Brasil, 1966). Direção e Rot. Original: Walter Hugo Khouri. Fotografia: Rudolf
Icsey. Música: Rogério Duprat. Montagem: Mauro Alice. Dir. de arte: Pierino
Massenzi. Com: Barbara Laage, Mario
Benvenutti, Wilfred Khouri, Pedro Paulo Hetheyer, Sérgio Hingst, Marisa
Woodward, David Cardoso, Lilian Lemmertz.
Márcia
(Laage), mulher da elite, que vive uma aborrecida vida de festas, decide passar
uns dias na casa de campo da família, com o filho (Khouri). Quando por lá se
encontra, um fazendeiro (Hingst) surge procurando por um cavalo que é sua
propriedade, fugido de sua fazenda.
O habitual
tom de tédio existencial que acompanha
os personagens do realizador, e que já havia ganho alguma notoriedade
internacional com Noite Vazia, aqui
aumenta à media que aumenta em igual medida uma pretensão maior de
experimentações com relação a uma narrativa moderna e entrecortada. O resultado
final, no entanto, soa um tanto canhestro como a maior parte das obras do
realizador, por conta da disparidade entre o pretendido, a por si só hercúlea
tarefa de trabalhar no cinema com elementos vinculados a expressão da
subjetividade dos personagens, e o conseguido; e, no caso particular em questão, em grande medida por conta de uma direção de
atores que procura aplicar a protagonista uma renitente máscara de tédio
existencial do início ao final do filme, à guisa talvez de radicalizar o que em
Antonioni, por exemplo, ocorre de forma mais sutil e sem abdicar de situações
mais naturalistas. Existem ecos da literatura de Clarice Lispector (um
assistente de Khouri realizaria pouco depois o curta pouco conhecido Perto de um Coração Selvagem) e um livro
dela é observado na mesa do protagonista de seu filme seguinte, As Amorosas, talvez o melhor da
carreira do cineasta. Nesse sentido, parece se aplicar a contenção de gestos em
um meio social burguês e refinado que os
preza como regra, em contraposição ao corpo ardente que, para além de uma
metáfora vulgar para uma sexualidade em chamas, surge na boca de duas
personagens femininas, a protagonista e a amante do marido vivida por Lemmertz,
representando uma sensibilidade algo “aprisionada”, que não consegue ser
expressa em termos racionais ou dialógicos – os diálogos são poucos. O filme,
portanto, procura representar tal dimensão em termos formais e também na apresentação de objetos de cena –
como no momento final, que uma Márcia, hipnotizada pela imagem desse cavalo
selvagem, dotado de uma “liberdade” algo impossível para o humano em sua comunhão
com a natureza, acaricia um adereço
semelhante a uma crina, em soluções por vezes demasiado explícitas –
quando se compara, por exemplo, a relação fetichizada com os objetos que
acompanha e os objetos que lhe interessa em O Eclipse (1961), de Antonioni, sua protagonista. A determinada sequencia que a câmera
acompanha Márcia pelas ruas da cidade, é possível observá-la, como seu operador,
refletidos nas colunas. Estreias de Lemmertz – que se tornara uma atriz-fetiche
na carreira do realizador – e Dina Sfat no cinema. Columbia Pictures Corp./Cia.
Cinematográfica Vera Cruz/Kamera Filmes para Columbia Pictures. 85 minutos.
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