Filme do Dia: Adieu Philippine (1962), Jacques Rozier
Adieu Philippine
(França, 1962). Direção: Jacques Rozier. Rot. Original: Michele O’Glor &
Jacques Rozier. Fotografia: René Mathelin. Música: Jacques Denjean, Paul Mattei
& Maxime Sauri. Montagem: Monique Bonnot, Claude Durand & Marc Pavaux.
Com: Jean-Claude Aimini, Daniel Descamps, Stefania Sabatini, Yveline Céry,
Vittorio Caprioli, David Tonelli, Annie Markhan, André Tarroux.
Jovem
assistente técnico de TV, Michel (Aimini) se torna objeto do desejo de duas
amigas inseparáveis, Liliane (Céry) e Julianne (Sabatini), com quem passa a se
encontrar, individualmente ou em grupo. Elas sonham em ser atrizes e todo o
grupo trabalha para o flibusteiro Pachala (Caprioli), que os convida para
produzir cinema quando, na verdade, pretende efetivar um comercial de
refrigeradores. Indignado com o tratamento que lhe é dispensado em seu
trabalho, após equivocamente surgir em meio a uma encenação ao vivo, sendo repreendido
por um de seus superiores, Michel decide abandonar tudo e partir de férias pela
Córsega. As garotas vão junto.
Observado, sobretudo
retrospectivamente, esse filme, mesmo que longe de ter sido um dos mais
lembrados da Nouvelle Vague, parece conjugar elementos que dizem respeito a
praticamente todos os seus realizadores mais influentes. Já em sua primeira
imagem, faz menção a ser o sexto ano da Guerra da Argélia, assunto-tabu então e
que havia motivado a censura de O Pequeno Soldado, de Godard. O frescor
da juventude, a sede de apresentar cenas de deambulação, presente sobretudo na
bela cena das duas garotas caminhando pelas ruas de Paris, sem qualquer
motivação dramática que as impulsione é evocativa tanto do Acossado de
Godard quanto de Cléo das 5 às 7 de Varda. E a apresentação do universo
das garotas e seu frisson sobre um
rapaz evocativo do curta de Godard Charlotte et Véronique, ou Tous
les Garçons s’appelent Patrick (o protagonista jovem e a sombra de do alistamento de
guerra, por sua vez, tornar-se-á um tema recorrente nos melhores filmes de
Jacques Demy - sobretudo em O Segredo Íntimo de Lola). Já o uso
histriônico do corpo, como no momento da dança entre uma das garotas e um homem
mais velho, acentuada pela aceleração da imagem, é evocativa do humor
despretensioso e charmoso de Truffaut. A expressividade do uso da música em
determinadas sequencias não chega a ser um comentário irônico que pontua a
trilha de Acossado ou um sublime observado de forma passivamente cínica
em Entre Amigas de Chabrol, mas
possui talvez pontos em comum com ambos. Também não se pode esquecer a
utilização agressiva em relação ao “cinema do papai” da geração que lhes
antecedeu, seja homenageando os flmes dos colegas em vários casos, seja como
aqui identificando o personagem mais grotesco, não por acaso de uma geração
mais velha, com o cartaz de Volúpia do Poder (1958), protagonizado por
Jean Gabin, ator icônico desse cinema a ser defenestrado. E por fim, e não menos importante,
encontra-se o fato de trabalhar maciçamente com atores não profissionais ou
semi-profissionais em sua maioria – o próprio Aimini nunca mais será visto
outra vez em um filme – tal como se tornará habitual no cinema de Eric Rohmer.
Existem igualmente idiossincrasias em seu cinema, como o fato de se voltar para
um universo de personagens de espectro social mais modesto que o habitual nos
filmes do movimento – se é verdade que Entre Amigas também compartilha
de algo do tipo, encontra-se longe de ser o paradigma que se tornará
estabelecido posteriormente pelo cinema de Chabrol. Dito isso, não há como
negar que o filme não sustenta o mesmo fôlego da metade ao final, mais errante
e talvez menos interessante em sua representação das férias do trio e seus
joguetes amorosos. E, mesmo contemplando várias facetas dessa nova modernidade,
que inclui até mesmo os bastidores da TV, há ao mesmo tempo um senso de
casualidade e superficialidade que o acompanha mais intenso que as primeiras
aproximações, inclusive posteriores, do universo do audiovisual por
realizadores do ciclo, como O Desprezo de Godard, que sela o pathos
para algo diverso, agridoce, na longa cena de despedida final, ressignificando, de
certa forma, todos os momentos efêmeros e nada particularmente excepcionais que
haviam sido observados. Filme de estreia de um realizador não muito prolífico,
e que somente voltaria a um longa para o cinema anos após. Rome Paris
Films/EIA/Alpha Prod./Unitec. 106 minutos.
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