Filme do Dia: Angústia (1946), John Brahm


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Angústia (The Locket, EUA, 1946). Direção: John Brahm. Rot. Original: Sheridan Gibney & Norma Barzman. Fotografia: Nicholas Musuraca. Música: Roy Webb. Montagem: J.R. Whittredge. Cenografia: Harley Miller & Darrell Silvera. Com: Laraine Day, Brian Aherne, Robert Mitchum, Gene Raymond, Sharyn Moffett, Ricardo Cortez, Henry Stephenson, Katherine Emmery, Fay Helm, David Thursby.
No dia de seu casamento com Nancy (Day), John Willis (Raymond) recebe a inesperada visita de um homem que não conhece, Dr. Blair (Aherne), que lhe conta que sua mulher possui distúrbios de personalidade. Blair conta que após casar com Nancy recebeu a visita do pintor Norman Clyde (Mitchum). Clyde lhe conta que Nancy o havia contado do trauma que vivenciara na infância (Moffett), quando roubou o colar que lhe havia sido dado por sua melhor amiga, filha da dona da rica residência na qual sua mãe trabalhava como governanta. Os bons contatos que Nancy possui faz com que ela apresente Clyde para o casal  Bonner (Cortez e Helm). Um pouco enciumado pela proximidade de Bonner com a esposa, Clyde a busca para logo ouvir um estampido de arma proveniente do quarto e Nancy saindo do mesmo. Ela pede proteção a ele e quem é condenado pela morte de Bonner é um inocente, Dexter (Thursby), que a criada viu segurando a arma ao lado do cadáver. Clyde pretende que o Dr. Blair lhe auxilie para inocentar Dexter, mas nada consegue fazer, sendo o mesmo executado. Clyde se suicida a seguir. Blair se muda com a esposa para a Inglaterra. Lá, em meio a guerra, conhecem um homem que possui uma rica coleção de joias e que convida Nancy para conhecê-las. No mesmo dia que visitam, um precioso relicário some da coleção. Blair duvida da esposa, porém quando a vê despejar o que possui na bolsa se sente com remorsos. Ao voltar do trabalho a casa em que moravam foi bombardeada. Entre os objetos que encontra está o relicário. Ele mostra a Nancy quando essa se aproxima. Em estado de choque, Blair é internado em um hospital psiquiátrico. Sua narrativa não consegue convencer Willis, porém a caixa de música que cai quando Nancy se encontra preparada para casar desencadeia uma forte reação traumática e ela perde o controle emocional, sendo encaminhada para tratamento.
Brahm, um dos mestre do cinema gótico do período (Concerto Macabro) faz uso de vários elementos habituais ao gênero, como o surrado e datado mote do trauma de origem psicanalítica que motiva o comportamento da heroína – ainda que aqui o retorno a elementos evocativos do trauma surja menos como habitual enquanto elemento de “cura” do mesmo (tal como em O Sétimo Véu, Quando Fala o Coração e Um Amor em Cada Vida) que do desencadeamento da psicose até então acobertada pelo comportamento compulsivo. Se a dependência do recorte do trauma psicanalítico e suas motivações por demais explícitas podem soar datadas, a complexa estrutura narrativa em que flashbacks são construídos dentro de flashbacks ao cubo – a determinado ponto se chega a três camadas de narrativas no interior de narrativas- mantém o interesse. Embora os dramas góticos tendam a assumir o ponto de vista mais próximo de sua protagonista feminina, não se trata do caso em questão aqui, que envereda por uma abordagem mais tipicamente masculina da tentativa sucessiva de desmascaramento da falsa máscara da virtude feminina, algo mais próximo do noir, refletindo, até certo ponto, a paranoia masculina diante de uma nova imagem de mulher, aqui apenas aparentemente dócil e ajustada. Curiosamente, no entanto, e ao contrário do habitual no noir, não se chega exatamente a presenciar essa face da maldade tal como essa é habitualmente encenada nos melodramas, ganhando voz nem que em um momento específico, pois aqui nunca a protagonista parece de fato consciente de toda a maldade que provocara, mesmo agindo com aparente frio cinismo e razão (enquanto mecanismo de defesa para se sentir protegida e amada?) já que não se tem acesso aos seus pensamentos; nunca ficamos tão próximos assim dela para o percebê-lo, no máximo agindo com extrema dissimulação como quando enlaça Clyde diante de seu novo marido ou ainda tascando um rápido beijo na boca de Bonner  como cumprimento diante do próprio marido e da esposa dele – aliás o fato dela ter levado Bonner para conhecer e se interessar e divulgar a obra de Clyde sugere um possível relacionamento entre ambos que antecede ao próximo casamento, sugestão essa maximizada ainda mais pela lesão que deixara a esposa desse numa cadeira de rodas. Os sentimentos que apresenta, por exemplo, ao chorar quando sai do apartamento de Clyde podem ser mais facilmente percebidos como mera dissimulação o que não impede que uma outra leitura se sobreponha a essa e que, de fato, ela possa temer aqui perder a sensação de ser amada, da qual aparentemente nunca parece ter a segurança absoluta de. Dito isso, o filme não vai além de interpretações medianas e um senso estilístico-formal tampouco aprimorado quando se compara às obras-primas do noir (como Laura, por exemplo) ou mesmo do gótico (Retrato de Jennie). RKO Radio Pictures. 85 minutos.


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