Filme do Dia: Quando Fala o Coração (1945), Alfred Hitchcock
Quando Fala o Coração (Spellbound, EUA, 1945). Direção: Alfred
Hitchcock. Rot. Adaptado: Ben Hecht & Angus MacPhail, a partir da sugestão
do romance The House of the Edwardes,
de Francis Beeding. Fotografia: George Barnes. Música: Miklós Rózsa. Montagem:
Hal C. Kern. Dir. de arte:
James Basevi. Com: Ingrid Bergman, Gregory Peck, Michael Chekhov, Leo G.
Carroll, Rhonda Fleming, John Emery, Norman Lloyd, Bill Goodwin.
O hospital
psiquiátrico em que trabalha a Dra. Petersen (Bergman) terá seu diretor-geral,
Dr. Murchison (Carroll), substituído pelo Dr. Edwardes (Peck). Quando esse
chega, surpreende a todos por sua juventude e fortes transtornos de
comportamento. Petersen e ele se apaixonam à primeira vista. Ela descobre que
ele não é Edwardes e ele confessa que acredita ter matado Edwardes. Com a ajuda
de seu mentor, Dr. Brulov (Chekhov), o casal se refugia em Rochester, enquanto
passam a ser procurados pela polícia. Petersen e Brulov se esmeram em recuperar
o trauma que afetou a personalidade do homem que não sabe quem é, e
conseguem-no após muito esforço e paciência. Ele se chama John Ballantyne e
estava se tratando com Edwardes. Resta saber quem é o assassino de Edwardes.
Mesmo sendo o
sortilégio de boa parte dos filmes de conteúdo psicológico de então, Selznick –
de forma muito marcadamente característica – introduz letreiros que traduzem o
modo mecânico com que a psicanálise foi apropriada por Hollywood para angariar
tanto prestígio cultural quanto justificativas narrativas em que o final feliz,
como aqui, encontra-se associado menos a resolução de um conflito exterior que interior – o trauma.
Evidentemente, que tudo é filtrado para os interesses mais imediatos e
habitualmente esses não vão além de crime e sexualidade, quando não os dois
juntos. E estereótipos de gênero assomam rapidamente, com a Dra. Petersen de
Bergman sendo retratada como uma mulher reprimida e frígida que tem suas
estruturas abaladas com a chegada do colega John, quase levando para a cama o
livro e não seu autor, que notoriamente a tenta com a luz acesa observada pela
réstia da porta e a leva, literalmente, a abrir portas do seu inconsciente –
extravagante e óbvia metáfora bem ao gosto de seu produtor Selznick. De
aparência frágil e mais jovem que Bergman, sendo, na verdade, apenas um ano
mais jovem que a atriz, Peck ainda era um iniciante como ator, tendo
participado de apenas 3 produções, ao contrário de uma carreira que já vinha
desde a década anterior da atriz. A célebre sequência do sonho, idealizada por
Salvador Dalí surge, em termos de contexto narrativo, muito mais comportada e
codificada que a da abertura de um filme um pouco posterior de Ingmar Bergman (Música na Noite), com a marca
registrada dos objetos como que derretidos do artista. Destaque para o ator
russo Michael Chekhov, sobrinho do célebre escritor Tchecov, que vive o
carismático e freudiano (não faltam sequer o cachimbo, a carapinha branca,
barba e os óculos de aro) Dr. Brulov e que infelizmente deve ter ficado
restrito a papéis similarmente restritos a caracterizações do tipo (por essa
seria indicado ao Oscar de coadjuvante) e curiosamente foi professor de arte
dramática para ambos os astros principais do filme e até mesmo pode-se
imaginar, sem grande esforço, que a Petersen que Brulov tanto elogia como sua
melhor assistente teria sido a Bergman como melhor estudante. Destaque
igualmente para o uso da câmera subjetiva de forma pouco usual, seja para
flagrar a proximidade dos rostos no primeiro beijo do casal principal, seja
para provocar o suspense no momento em que a Dra. Petersen tem uma arma
apontada contra si, que subitamente se volta contra seu próprio portador. Selznick International Pictures/Vanguard
Films para United Artists. 111 minutos.
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