Filme do Dia: Os Vivos e os Mortos (1987), John Huston
Os Vivos e os Mortos (The Dead, Reino Unido/Irlanda/EUA, 1987). Direção: John Huston. Rot. Adaptado: Tony Huston, baseado no conto The Dubliners, de James Joyce. Fotografia: Fred Murphy. Música: Alex North. Montagem: Roberto Silvi. Dir. de arte: Stephen B. Grimes & J. Dennis Washington. Cenografia: Josie MacAvin. Figurinos: Dorothy Jeakins. Com: Anjelica Huston, Donal McCan, Dan O’Herlihy, Donal Donnelly, Helena Carroll, Cathleen Delany, Ingrid Craigie, Rachael Dowling, Kate O’Toole.
Grupo de amigos e parentes próximos vai jantar e se divertir na noite de natal na casa de duas velhas solteiras, as Tias Kate (Carroll) e Julia (Delany), que vivem com uma sobrinha, Mary Jane (Craigie). Dentre os convidados se encontram o alcóolatra Freddy Malins (Donnelly) e sua velha mãe (Kean), e o casal Gretta e Gabriel Conroy (Huston e McCan). Após danças, cantos e recitações, e do jantar, os convidados se despedem. Gabriel percebe que Gretta se emociona com uma canção cantada na ocasião. Ao chegarem em casa, ela lhe confidencia que quem a cantava fora um jovem que a amara e que se deixara morrer por ela quando tinha 17 anos. Gabriel pensa que mesmo a amando Gretta nunca conhecera demonstração semelhante de amor e que a levava, assim como muitos que encontra nessa noite, era uma mera existência e não uma verdadeira vida.
Esse, que é o filme-testamento de Huston, é tocante pela delicadeza com que aborda temas profundos como o amor e a morte sem soar pretensioso ou empostado. Esse equilíbrio em grande parte se deve a um excelente trabalho de elenco, senso de ritmo narrativo, sua fotografia de tons predominantemente azuis e cenografia, que transforma uma rua dublinense numa verdadeira peça cenográfica de estúdio. Mais ainda que tudo isso, ou como elemento diferenciador, faz menções específicas a uma cultura e época que, mesmo não possuindo certamente a mesma relevância ou compreensão para aqueles que não a compartilharam, traz uma dimensão humana que transcende o mero formalismo ou virtuosidade. Ao final se detém no que praticamente são dois monólogos: o do implacável peso da memória representado pela dolorosa lembrança de Gretta e o monólogo interior que representa a epifania de Gabriel, após se dar conta que jamais terá o mesmo impacto sobre sua esposa do jovem falecido na flor da idade. Nesse último, assim como em boa parte do filme, Huston deixa o tocante texto de Joyce se tornar protagonista, sendo mais importante que as próprias imagens que o ilustram. Sua elegância e discreta melancolia se tornam um digno canto de cisne para um realizador desigual mas dotado de um arguto olhar para seus personagens que aqui, mais que nunca, supera qualquer efeito vinculado a sua trama. Do filme também se destacam o seu tributo a Irlanda de seus ancestrais e que viveu boa parte de sua vida e a presença dos filhos Anjelica, como protagonista e Tony, como autor da adaptação. Channel 4/Delta Film/Liffey Films/Vreston Pictures/Zenith Ent. 83 minutos.
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